SHAWN

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- Você pode voltar a ver? - eis o motivo pelo qual eu nunca disse nada a ela: a falsa esperança de um mundo cheio de cores.

- Bom, teoricamente, sim...

Ouvi o seu abrir e fechar de lábios. Ela estava eufórica mas tentava se conter.

- Existe um mas? É claro que existe! Sempre existe um mas... - desânimo.

- As chances de dar certo a essa altura do campeonato são poucas.

- Mas existem... não é?! - senti seu corpo virar em meus braços, provavelmente ela me encarava com expectativa agora.

- Menores que 15%, eu acho.

Novamente ela se deitou e pegou minha mão brincando com meus dedos. Parecia estar perdida em pensamentos.

Após um profundo suspiro o silêncio entre nós foi quebrado.

- Você nunca me contou como perdeu a visão.

- Como não? Você vive me dizendo coisas que descobriu sobre "cegos repentinos". - ri ao imaginar o quão idiota ela estava me achando agora.

- Você é um chato! Sabe muito bem que eu pesquisei por muito tempo sobre cegueira repentina porque eu deduzi que você houvesse ficado cego do dia pra noite mas... sempre tive medo de te aborrecer com essa pergunta.

Bobagem. Camila é a única pessoa que nunca me fez sentir desconfortável por ser cego. Quer dizer, óbvio que Aaliyah também não mas ela não contam já que passei minha vida toda ao lado dela e, desde que ela nasceu, eu sou assim.

- Pode perguntar o que quiser, você nunca me aborrece!

- Então você pode me contar sua história?!

- Quando eu tinha dez anos comecei a sentir muita dor de cabeça. Principalmente na escola já que eu sempre fui alto e sentei no fundo da sala. Acontece que, depois de um tempo, essas dores de cabeça começaram a ser acompanhadas de visão embaçada. E eu não contei nada disso para os meus pais. Eu acho que tinha medo de ir ao médico e ele me dar uma injeção, não sei ao certo o que eu pensava. Só sei que era coisa de criança.

- Nem das dores de cabeça você falou a sua mãe?

- Não! É claro que eu falei. Mas eu tinha o histórico de "menino fujão" - ouvi sua risada e a acompanhei. - Eu tinha uma leve tendência de mentir dores de cabeça na escola pra poder ir pra casa.

- Meu Deus. - gargalhou. - Espero que nossos filhos não tenham esse seu péssimo hábito.

- Nós vamos ter mais de um filho?

- Não desvie a sua atenção! Eu quero saber a sua história.

- Ok, ok - soltei um leve riso. - Por causa desse meu péssimo hábito, mamãe achava que essas dores eram invenções minhas pra me livrar da aula de matemática. Por isso eu só ia até a enfermaria e tomava um remédio ruim que eles me davam.

- Mas a sua dor passava?

- Por um tempo sim. Mas depois de um tempo passou só a piorar até que eu tive um primeiro apagão.

Paixão às Cegas.Onde histórias criam vida. Descubra agora