𝟐𝟎 𝐝𝐞 𝐦𝐚𝐢𝐨 𝐝𝐞 𝟐𝟎𝟑𝟑

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Yuto havia perdido a conta de quanto tempo estava ali, amarrado a mesma cadeira e sentado na mesma posição desconfortável. Mal conseguia respirar direito. O pano grosso e escuro que cobria sua cabeça era o principal motivo da respiração descompassada e da taquicardia constante, não conseguia distinguir nada a sua volta, era tudo um borrão de sons abafados e agonia constante. Uma sensação que conhecia bem.

Depois das primeiras horas onde viram que o machucar não surtira efeito algum e o rapaz continuava a dar respostas evasivas e vazias mesmo quando seu sangue gotejava pelos lábios, desistiram logo e partiram para o método seguinte assim que notaram que ele não se dava bem com a escuridão, então o deixaram no escuro sem saber o que acontecia a sua volta.

Quando criança tudo o que sua irmã mais velha podia fazer para mantê-lo seguro dos acessos de raiva de seu pai era o prender no armário que eles tinham no porão. — O pai do jovem Yuto era bem mais duro com ele, principalmente quando bebia. — O garoto passava horas e horas no lugar escuro e quente, esperando que sua irmã viesse o buscar, temendo que quando aquela porta abrisse veria o homem alto com uma garrafa de vidro em mãos e ouvindo os gritos abafados dele vindo do andar de cima, estava sempre aguardando com a escuridão como sua única e terrível companheira. Passou a temer aqueles dias, os dias em que seu pai chegava em casa e Yuto tinha que passar as próximas horas tremendo em um apertado armário de ferramentas, aquela situação durou cinco anos, foi quando ele havia conseguido confrontar o pai e sair de casa, levando sua irmã junto de si. Akari havia se mudado de volta para o país natal deles por causa de uma oportunidade de emprego, não via o irmão a anos e a mãe deles nunca havia sido muito presente.

Só restaram Micha e Changgu do lado dele.

Depois de todos esses anos estava de volta àquela situação, como se ainda fosse o garotinho assustado se escondendo em um armário em que ele mal cabia.

Os soldados raramente faziam perguntas, eles já haviam feito todas, mas Yuto deixou de falar quando as primeiras horas passaram. Como poderia? Estava aterrorizado demais para isso, então apenas disseram para o deixar ali até que decidisse falar, porque não podiam entrega-lo em um estado muito grave para os médicos do Centro de reabilitação por uma ordem direta dos chefes para cortar gastos com esse tipo de suprimento, tinham a plena certeza de que o rosto daquele garoto não estava no melhor dos estados abaixo do pano que cobria todo o rosto.

O barulho da tranca fez com que ele se assustasse e estremecesse mais uma vez pela voz do guarda.

— Graças... Não aguento mais ficar aqui. — Yuto só conseguiu perceber que a voz do guarda soava cansada e carregada de desprezo. — Fique à vontade para tentar conseguir qualquer coisa dele, só não tira o capuz porque ele tem medinho do escuro.

E tão rápido quanto a porta se abriu, ela fechou, deixando o novo soldado com o prisioneiro que se preparava novamente para as mesmas perguntas e chantagens que já havia ouvido nas últimas horas. Contudo, o soldado apenas se aproximou sem dizer uma palavra sequer.

Yuto sentiu uma mão sobre sua cabeça, o toque tão leve que ele mal sentiu e sem aviso prévio o capuz foi tirado, revelando um preocupado Hwitaek, com o mesmo uniforme de todo soldado ali dentro. Ele deu um passo para traz assim que percebeu o quão ruim estava a situação de seu amigo: Um dos olhos estava roxo, o nariz sangrava e os lábios estavam cortados em várias partes marcados por sangue seco, vários hematomas cobriam o rosto em uma tonalidade que variava entre vermelho e roxo, alguns estavam quase pretos sobre a pele inchada.

— Yuto, eu sinto muito...

Ele não ouviu a voz baixa de seu amigo, estava processando o que acabara de acontecer, esperando ouvir a voz de sua irmã dizendo que o pior já havia passado e então o abraço quente dela o confortando, mas não recebeu nada disso. Ao invés, pôde sentir a mão de Hwitaek sobre seu ombro e só conseguiu pender pra frente, abaixando a cabeça e chorando como um garotinho, exatamente como aquele garotinho assustado que ele havia deixado para trás a tanto tempo, mas seu choro era aliviado, como se tivesse saído debaixo de uma pedra que o impedia de respirar.

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