Capítulo 58

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Oviedo — Primavera, Junho de 836 d.C.

Padre Paulus via os filhos de Juan e Jamila todos os dias, era um consolo pela falta de notícias de jovem, e uma alegria por ver que as crianças haviam levado felicidade para os dias do velho Duque, o qual era sempre visto na companhia dos netos, embora para todos que perguntassem ele afirmava que eram crianças órfãs que ele adotara.

Ao questioná-lo, Dom Iglesias respondera que era melhor, pois assim as crianças não seriam discriminadas por terem origem árabe. O sacerdote não concordara, mas o Duque fora inflexível e o proibira de contar algo.

A carta que Yusuf entregara o atormentava diariamente, mas Juan não voltara para Luco de Ástures, as notícias que tivera dele por meio de comerciantes e mensagens do Bispo de Oviedo, uma vez que Dom Iglesias ainda não fora até a capital, informavam que o jovem se apresentara no exército real e fora enviado para a fronteira liderando um esquadrão de cavalaria.

O sacerdote cogitou enviar um mensageiro, mas não quis arriscar, não sabia quando Juan retornaria para Oviedo nem onde ele estava, por isso resolveu aguardar até que uma oportunidade surgisse. E ela apareceu quando o Duque avisou que partiriam rumo à corte real.

O rei Afonso convocara seus conselheiros e Dom Iglesias estava recuperado da peste e da perda do primeiro neto, por isso decidira atender à convocação.

Viajaram sem levar as crianças que ficaram sob os cuidados de duas aias e do castelão, avisados de que se algo acontecesse com elas, pagariam com a própria vida.

Chegaram a Oviedo em tempo recorde, pois o Duque tinha pressa de voltar para casa.

Os conselheiros se reuniram em uma sala localizada no alto de uma torre. O aposento era austero, apenas uma mesa retangular e cadeiras compunham a mobília. Assim que o rei adentrou e ocupou seu lugar na cabeceira todos se sentaram.

O Duque de Oviedo, que estivera comandando a cavalaria real na fronteira e que voltara dias antes, tomou a palavra.

— Vossa majestade nos convocou para deliberar um assunto urgente. Mahmud, o líder rebelde que se comprometeu em proteger a fronteira, recebendo do reino o castelo de Santa Cristina nos traiu – começou.

Um murmúrio indignado foi ouvido, mas o Duque de Oviedo fez um sinal pedindo silêncio e continuou.

— Estive pessoalmente na fronteira, aldeias e vilarejos cristão foram saqueados por árabes. A região era relativamente tranquila, sem tropas relevantes, por isso desconfiamos que o responsável seja Mahmud.

— Há alguma outra prova? – perguntou Dom Iglesias.

— Sim – respondeu Dom Rodrigo colocando um pergaminho em cima da mesa.

Padre Paulus espichou o pescoço com curiosidade enquanto Dom Iglesias sentado ao lado direito do rei o pegou e leu com atenção.

— Isso é traição! – rosnou o Duque.

— Sim, meu amigo, esse pergaminho foi conseguido por um espião nosso no interior do castelo, é a oferta de perdão do Emir de Córdova, em troca Mahmud deverá auxiliá-lo a atacar nossa fronteira noroeste – explicou enquanto Dom Iglesias passava o pergaminho para um conselheiro ao seu lado — Acreditamos que haja tropas do Emir próximas a fronteira se preparando para auxiliar o traidor.

— O que devemos fazer? – falou o rei pela primeira vez.

A discussão se arrastou por duas horas até que chegaram a uma decisão, o castelo deveria ser tomado e Mahmud colocado sob ferros e encaminhado para Oviedo onde seria executado por traição.

Ao fim da reunião, Dom Iglesias foi chamado para uma conversa privada com o rei, enquanto padre Paulus o aguardava, no salão agora vazio.

Após uma hora o Duque retornou.

— Padre, tenho uma missão para você – começou.

— Às suas ordens, senhor Duque – respondeu o sacerdote.

— O rei me incumbiu de providenciar a escolta da irmã de Mahmud, ela o impressionou quando esteve na corte. Quero que você leve uma mensagem para Juan, ele se encontra na companhia do Duque de Oviedo, na cidade de Lugo.

— Quando parto? – perguntou ainda surpreso.

— Amanhã cedo, o rei já providenciou uma escolta.

— O que devo dizer para seu filho? – perguntou encarando o Duque e percebendo uma rusga de irritação.

— Diga para ele que o rei ordena que caso a irmã de Mahmud seja encontrada, deverá escoltada ilesa até a corte – respondeu.

— Como desejar, Dom Iglesias – concordou o sacerdote.

Antes do alvorecer o sacerdote trotava na companhia de uma escolta sentindo a pele queimar com o pergaminho que trazia por baixo das vestes e que Yusuf lhe entregara meses antes.

Agora teria a chance de conversar com Juan e lhe contar que seus filhos se encontravam em Luco de Ástures.

A GUERREIRA INDOMÁVELOnde histórias criam vida. Descubra agora