Capítulo 63

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Galiza — Verão, Julho de 836 d.C.

O pântano era frio e úmido uma vez que os raios de sol tinham dificuldade para vencer as espessas ramagens dos salgueiros, bordos e outras espécies de árvores, raízes expostas saíam da lama elevando-se para buscar ar, o cheiro de coisas podres permeava tudo. Uma bruma cinza subia da água parada, enquanto a tarde avançava.

Juan caminhava há horas de forma cautelosa, havia o sério risco de ficarem presos no lodo que chegava a altura do joelho, invadindo por dentro a bota enregelando os pés.

Ao menos haviam despistado seus perseguidores, pensou puxando Jamila pela mão, tentando ignorar sua pele quente e macia.

A noite parecia próxima, as árvores com suas ramagens espessas e a bruma que se elevava até às alturas escondia o sol.

— Juan – ele ouviu a voz suave de Jamila e sentiu seu coração sangrando pelas velhas chagas que nunca cicatrizaram — Estou cansada.

Ele se virou para encará-la, a roupa molhada dela grudava no corpo marcando suas curvas o que aqueceu seu espírito, incitando seus pensamentos. Deus me livre do pecado rezou silenciosamente.

Sem responder, a pegou no colo, seus rostos ficaram próximos e ele sentiu seu hálito fresco, um alívio para o odor forte do pântano.

— Não podemos parar – murmurou desviando o olhar daqueles olhos verdes que tanto amava.

Ela concordou balançando a cabeça e Juan continuou andando, esforçando-se para vencer a sucção das águas fétidas.

Caminhou concentrado, tentando não prestar atenção aos braços em volta de seu pescoço, a cabeça pousada em seu peito, sentindo-a subir e descer com a respiração.

Mas suas forças começaram a falhar, cada músculo de seu corpo gritava de agonia e ele perdeu as esperanças quando a luz do sol desapareceu no horizonte deixando-os no crepúsculo que antecede a noite.

— Jamila, me perdoe, falhei em protegê-la – murmurou caindo de joelhos sobre um tronco podre acima da água, depositando-a na parte mais alta e seca.

— Não, você conseguiu, olhe – disse ela apontando para frente onde uma luz indicava uma fogueira acesa, em meio à bruma.

Com esforço sobre-humano ele ergueu-se a pegando no colo novamente, então caminhou em direção à luz.

Para Jamila aquele momento também a fazia sofrer. Estar tão perto dele e ao mesmo tão longe era um sentimento que a partia por dentro. Desejava dizer que nunca deixara de amá-lo, que não passara um dia sequer sem pensar nele, que as recordações de seus momentos juntos a fizeram sobreviver durante todos aqueles anos.

Finalmente chegaram a uma pequena clareira seca, em uma elevação do terreno, com o início da noite. Alguns dólmens41, antigos túmulos feitos de pedras espalhavam-se pelo local. No centro, havia uma fogueira acesa ao lado de uma choça feita de juntos, galhos e barro. Em cima das chamas, pendurado por duas forquilhas, um caldeirão de ferro exalava um aroma delicioso de ensopado de peixe.

— Olá! Há alguém aqui? – perguntou Juan colocando Jamila no chão e segurando com força o cabo de sua espada, pronto para desembainhá-la.

— Quem me chama? – perguntou uma idosa saindo da choça, seus cabelos eram totalmente brancos e seus olhos negros. A pele era encarquilhada, indicando a longevidade da mulher.

Ela saiu se apoiando em um cajado torcido.

— Minha senhora, peço abrigo por esta noite, apenas para que possamos descansar – pediu Juan de forma respeitosa, fazendo uma ligeira mesura.

A GUERREIRA INDOMÁVELOnde histórias criam vida. Descubra agora