Capítulo IV

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- Íris? Íris? Eu sei que é muito para lidar, ainda mais depois de um acidente. – Diz a minha mãe segurando no meu ombro.

- Não, não, não...- Continuo sem acreditar- Isto é uma das partidas dele. Só pode ser. O meu pai é forte. Ele nunca podia morrer, quer dizer, pelo menos não agora. – Olho para a porta do quarto ainda com esperança de ele entrar e gritar que é uma partida.

- Filha... - Começa a minha mãe.

- Não me toques. Quero ficar sozinha. Não quero ninguém aqui. – Digo a gritar, assustando todos os presentes no quarto.

- Se calhar é melhor darmos-lhe um tempo para ela dirigir esta situação toda. – Diz a enfermeira que nem reparei que tinha entrado.

Quando saem todos essa mesma enfermeira permanece e agora dirigindo-se só para mim: - Eu sei pelo que estás a passar. Também era muito nova quando a minha mãe morreu de cancro. Mas consegui passar por isso tornando-me enfermeira, para poder ajudar e suportar pessoas que passaram e passam por situações iguais.

- Então devo-me tornar mecânica para poder superar a morte do meu pai. Muito obrigada pelo conselho, mas não. Agora, se pudesse, pode sair do quarto, preciso de estar sozinha. – Não estou com paciência para a pena dela e dos outros todos.

- Compreendo porque me estás a tratar assim, eu também já passei por essa fase negra, e não ajudam em nada afastar aqueles que se importam contigo. – Diz antes de sair e mandar um olhar triste na minha direção. Estou farta que tenham pena de mim, não sou criança nenhuma. Desde que a minha mãe me abandonou todos os meus vizinhos e colegas da escola me olham de um jeito diferente de todos os outros. Fofocam, riem, mesmo quando não pensam que não reparo, reparo.

Preciso de sair deste hospital, talvez eles não tenham dito a verdade e o meu pai esteja são e salvo em casa. Meto um pé no chão e depois o outro e tento me levantar apoiada na cama, embora ainda me custe consigo me por de pé, ignorando a dor insuportável nas costas. Pego numas roupas que a minha mão me trouxe, esquecendo o facto de que ainda não pensei bem no regresso da minha mãe, também não tenho tempo para isso, em breve estarei em casa e se o meu pai não estiver lá então parto para outra cidade, ou país se for preciso. Acho que tenho dinheiro suficiente para um bilhete de autocarro até à fronteira. Mas primeiro tenho de me preocupar em sair daqui.

Abro a porta e olho para os dois lados para me certificar de que não vem nenhum médico. Vejo que o caminho está livre e sigo a seta que diz saída de emergência, para não dar tanto nas vistas. Empurro a porta e sigo por um corredor comprido até ouvir uns...gritos? É então que vejo uma porta entreaberta de uma arrecadação e dentro estão a enfermeira com que falei há pouco sentada numa mesa com a cabeça inclinada para trás e a sua mão está na cabeça de um homem, talvez um médico, com a cara entre as suas pernas. OH MEU DEUUS! Corro o mais rápido possível para longe daquela imagem, que por mais que abane a cabeça não sai da minha mente. Estava tão distraída que nem reparo que já cheguei à porta que pode-me levar à liberada...está trancada. Olho para os lados à procura de algo para destruir a fechadura e encontro um extintor.

-Vai ter de servir.

Pego no extintor e bato na fechadura, não funciona. Tento mais vezes e à quinta tentativa finalmente consigo partir a fechadura. Empurro a porta e agora sim liberdade. Corro para a estação de autocarro mais próxima e espero. Depois do que parece mais de 15 minutos um táxi aparece e entro. Táxis deixam-me desconfortável, porque vais sozinha num carro com um desconhecido qualquer e nem sabes se ele é mesmo um taxista ou um traficante de pessoas. Mas felizmente chego sã e salva a minha casa. Parece que tudo escureceu embora seja dia, é como se uma alma tivesse sido tirada à casa. As trepadeiras na parede parecem mais secas e a relva do jardim da frente cresceu, é como se a natureza persentisse que algo de mau aconteceu. Entro pela casa dentro com esperança de encontrar o meu pai, mas nada. Procuro no quarto, na casa de banho, no sótão, na garagem e até no frigorífico, sei que é estupido, mas o meu pai cabe perfeitamente nele. É nesse momento que me cai a ficha. Aquela cozinha onde o meu pai fazia os seus melhores cozinhados e a sala de estar onde tínhamos as nossas batalhas de uno. Caio de joelhos e encolho-me no chão. Abraço os meus joelhos e balanço de um lado para o outro, relembrado todos os momentos bons e maus que tive com ele.

- A culpa é toda minha – digo repetidamente entre lágrimas, agarrando os meus cabelos e puxando-os para me distrair da dor de perda que estou a sentir.

Pego no telefone fixo, não tinha reparado no quanto termia até o pegar. Tento concentrar me nos números e não nas minhas mãos trémulas, e ligo aquela pessoa que sempre me apoiou em tudo.

- Lourenço? – Sai mais como um sussurro.

- Íris? Não devias estar no hospital? Ia agora mesmo visitar-te. – Diz com preocupação na voz.

- Por favor não digas a ninguém – Digo entre soluços – Eu preciso de ti. Eu não estou a aguentar isto, é demais para mim. Eu tenho aqui algum dinheiro para comprar um bilhete para outro sítio. Eu não consigo ficar aqui nem mais um minuto. Sinto-o em todo lado.

-Hey calma. Inspira e expira lembras-te. – Não é a primeira vez que me dá ataques de pânico, maior parte eram quando falavam da minha mãe. Mas um dia o loureço encontrou-me a chorar atrás da escola e ajudou-me. Tenho o melhor namorado. – Onde estás?

- Em minha casa.

- Vou já para aí.

-Hey Lourenço! Amo-te!

-Também te amo – diz antes de desligar a chamada.

Vou para o meu quarto e pego numa mochila de viagem que encontro debaixo da cama. Abro armário, tiro uma t-shirt, umas calças e um casaco de desporto e visto-os. Tiro mais algumas roupas práticas e íntimas e enfio dentro da mochila, sem ter o cuidado de as dobrar antes, estou com demasiada pressa. Olho para o relógio que marca 17h26, o Lourenço deve estar a chegar. Pego nos meus fones e num Nokia antigo que já tem uns bons dez anos, mas que espero que funcione, pois acho que não vou ter o meu telemóvel tão cedo. Pego numa fotografia minha e do meu pai no dia em que o meu avô me ensinou a surfar. Que bons momentos, a sensação das ondas na minha pele, o vento no meu cabelo encaracolado. Talvez quando estiver fora de Paris consiga arranjar um lugar junto à praia para poder surfar todos os dias depois de acordar. Talvez até arranje um trabalho como instrutora de surf.

Adiciono o relógio de prata que o meu pai me deu no meu aniversário e junto á minha confusão de roupas na mochila, e fecho-a e ponho no ombro. Antes de sair do quarto olho uma última vez.

Vou à cozinha e meto numa lancheira alguma comida, bolachas, pão, fiambre, queijo e algumas panquecas do último pequeno-almoço que estavam no frigorífico. Deve ser mantimento suficiente até chegar ao meu destino.

Preciso sair desta casa só me faz pensar mais "nele", ainda não acredito.

Quando saio vejo um Jeep a entrar no caminho que vai dar à garagem de minha casa. Quem será? Que eu me lembre o Lourenço ainda não tem carta de condução de carro. Mas pode ter pedido ao irmão mais velho dele.

-Íris? - Esta não parece nada a voz do Lourenço. É mais feminina parece a voz da minha...

-Mãe?

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