08 | pegando fôlego

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Mais alguns dias se passaram naquela caixa de concreto. Um cara tinha sido esfaqueado durante o recreio, o que deveria ser apenas um desentendimento entre presidiários comuns, mas por dentro eu temia que fosse uma luta de gangues rivais. Fui logo até a cela de Changkyun, de repente preocupado com a sua reação perante o caso, preocupado que de alguma forma ele fosse prejudicado por isso. Não queria vê-lo perder o controle da situação.

ㅡ Changkyun, o que você está pensando em fazer? ㅡ Me agarrei a grade, o vendo segurar o bilhete que repassei do nono pavilhão --- tenho servido de pombo correio frequentemente, inclusive. A única coisa que se espalhava mais rápido do que tuberculose nas galerias... Era fofoca.

ㅡ Aqui tem muita palavra. Não sei ler. ㅡ O vi franzir a sobrancelha de maneira fofa, tentando decifrar aqueles códigos. Percebi também todos os X que tinha riscado na última parede, talvez seja a única letra que conheça.

ㅡ Tsc. Você é o cara mais procurado da Coréia, com mais de 30 anos de pena pra cumprir... E não sabe ler. ㅡ Acabei sorrindo por ironia do destino. ㅡ Não sei o que é mais surpreendente, você ser poderoso nessas condições ou a polícia ser seu brinquedinho com essas condições.

ㅡ Você é um tanto corajoso de falar essas coisas bem em frente de mim. ㅡ Ele chegou perto da grade também e de repente estávamos cara a cara.

ㅡ Eu não tenho medo de você. Mesmo que se travássemos um combate e você me espancasse até a morte. Eu não costumo abaixar a minha cabeça pra qualquer um, Changkyun.

Eu realmente estou perdendo meu prestígio? ㅡ Ele riu e tirou o olhar de mim. ㅡ Você pode se gabar por esse mérito depois, estou abaixando minha cabeça pra você. ㅡ Entregou-me de volta o pedaço de papel esperando que eu o lesse.

ㅡ Você está confiando demais em mim. Pensei que tivesse medo de ser traído ou coisa assim.

ㅡ Sim, eu tenho medo, mas... Eu tenho que usar as únicas chances que tenho pra te provar que gosto de você. ㅡ Minhas bochechas começaram a esquentar e meu coração a bater acelerado. ㅡ Você acha que eu sou incapaz de sentir algo assim, porque sou líder de gangue, assaltante, assassino, traficante... E eu sei... Eu sei que não daríamos certo justamente por causa disso. Mas eu não importo, Joo. Eu contrario a realidade e vou em frente, mesmo sabendo que não vai dar. Eu me sinto mais confortável só por tentar te alcançar.

Engoli a seco ao ouvir aquelas palavras, saindo da sua boca com tanta veêmencia, ardência, paixão. Meus pés haviam paralizado, senti algo forte naquele momento domando meus nervos, mas o melhor de tudo era que... No fundo dos olhos dele... Havia sinceridade. Sinceridade que sequer pingou nas pupilas de Kihyun quando viera me visitar.

ㅡ Hey, acabe logo com essa limpeza! Afinal, veio limpar ou botar o papo em dia? ㅡ O agente me assustou com a voz potente.

ㅡ Me desculpa! Já estou terminando. ㅡ Saí da grade alheia e me ocupei com o esfregão mais uma vez. ㅡ Te conto depois. ㅡ Me referia ao conteúdo do bilhete, ele concordou com a cabeça e voltou a sentar na cadeirinha que tinha, o único luxo que lhe era permitido.

( ... )

Ajoelhei-me em cima das minhas havaianas quando de volta a minha cela, mantendo minhas mãos juntas em forma de oração. Minhyuk e Hyungwon estavam concentrados na atividade, então, por respeito, achei que deveria fazer o mesmo. Os murmúrios que vinha do de cabelo cumprido me dava ainda mais raiva por estar ali dentro, mas naquele instante, tentei me aproximar dEle mais uma vez. Talvez o que me faltava era um pouco de fé para que a turbulência passasse rápido.

ㅡ ... Você deveria me dizer o que fazer. Você deveria me proteger de todo mal, mas olha em que situação eu estou. Eu realmente tenho dúvidas se seu amor não é seletivo. Eu não sei o que eu fiz para merecer estar aqui ou se isso vai me servir de lição de moral, Deus, eu só queria saber ... Por que, por que eu? ㅡ Murmurei também, tentando falar o mais baixo possível. ㅡ Mas no momento é a única coisa que posso fazer. Te pedir. Não quero pedir por mim. Peço por Changkyun. Ele com certeza tem mais cruzes nas costas, merece um julgamento cauteloso e justo. Eu senti que lá no fundo, ele é apenas um homem, trapaceando de volta contra a vida, que o trapaçeou primeiro. Mostre a ele o que fazer. Eu acho que ele precisa de você mais do que eu.

ㅡ Joo... ㅡ Minhyuk chamou atenção. Meus dedos estavam retorcendo em cima dos meus joelhos e uma cachoeira de lágrimas descia pelo meu rosto, sem que eu tivesse percebido. ㅡ Vai ficar tudo bem... Deus está no comando de tudo. Se você deixar ser invadido por sua graça, o tempo vai passar mais rápido. ㅡ Os dois se irromperam e me abraçaram. Depois do conselho daquele cara tentando me assediar, eu guardei todas as lágrimas do mundo dentro de mim, mas acabaram por se libertarem naquele exato momento. Chorei pelo resto da madrugada, até tinha esquecido do porquê.

Depois de algum tempo, Hyungwon estendeu um caneco coletivo com suco em pó diluído. Era mais um dos luxos que tinham acesso, mesmo que na verdade, fosse bem miserável e nojento.

ㅡ Ah, não se preocupe. Não somos doentes ou imundos. ㅡ Ele disse, ao me ver hesitar de beber, olhando o líquido sem força de vontade.

ㅡ Você sabe que nem pra isso eu estou me importando mais. ㅡ Suspirei fundo e virei o líquido na boca, já que eu era o dono do último gole. ㅡ Não me importo com nada.

ㅡ Hey, não fique assim. Pelo menos, você tem a gente. Pode não ser a melhor coisa do mundo, mas... Você tem a gente. Comparado a Changkyun, nós somos praticamente inexistentes. A ralé da ralé. ㅡ Hyungwon acabou fazendo um sorriso me brotar. ㅡ Depois que eu entrei aqui que eu percebi, não sirvo pra ser bandido. Fui preso porque fui burro.

Eles começaram a conversar sobre como foram parar naquele lugar onde sonhos são oprimidos. O pastor foi pego em flagrante tentando furtar um carro, graças à câmeras de segurança. Enquanto a conversa desenrolava, lembrei do bilhete para Changkyun, o abri lentamente lendo o que havia escrito.

"Um SVT vai chegar na Unidade, estamos em perigo".

RODEO | MONSTA XOnde histórias criam vida. Descubra agora