Decidi pegar carona com qualquer motorista que me tirasse de perto daquele lugar e daquelas pessoas, apostando para que eu não desse o azar de encontrar mais um pervertido no meu caminho; implorando pra que eu não precisasse resistir mais do que eu já tinha resistido àquele cara e a todas as substâncias que estavam em circulação no meu organismo.
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- Eu sabia que te encontraria aqui, garota previsível.
Olhei para o meu relógio de pulso: eram 3:47 da manhã.
- Como se você não fosse a única pessoa que conhece meu refúgio protetor, não é?
- Ei - Harry se aproxima - Me conta. O que rolou?
Com Harry aqui eu já sabia que tudo tinha saído do meu controle... como se em algum momento sequer eu estivesse com a mão no volante da minha vida e com a corda toda. Já havia perdido isso há um bom tempo. Sinceramente, quem me dera se isso fosse apenas um problema. Apenas um, clamando pra que eu resolvesse. Um problema repentino, carregando uma tristeza súbita que gera um pensamento cuja preocupação é comum. Mas não, era mais um problema. Mais um, em meio a tanto caos.
- Margot? - ele diz, me tirando dos devaneios costumeiros.
- Tá tudo bem. - respondo, pra não precisar entrar numa conversa séria. Pra não precisar pensar. Não precisava de mais isso agora.
- Olha, mesmo que, do nada, você tenha aprendido a mentir assustadoramente bem, não funcionaria comigo. Sou seu melhor amigo e sei que tem algo errado. Tem alguma merda aí pra sua família me ligar desesperada procurando por você e perguntando se eu sabia de algo.
- Assustadoramente? Depende dos olhos de quem vê. Um bom mentiroso, na minha concepção, deveria ser visto com admiração.
- Tá falando sério? - ele indaga.
- Não necessariamente uma admiração positiva. - me justifico para não parecer tão escrota... não que ele já não esteja acostumado.
- Não muda de assunto, Margot.
- É assustadoramente admirável alguém conseguir enganar outra pessoa perfeitamente bem.
- Não, não é! - Harry me contraria com uma certa elevação na voz. - Mentir não é legal. Quer dizer, depende do motivo...
- Ahá! - não pude ficar quieta.
- Mas na maioria das situações não é uma parada legal, Margot. E mentira tem perna curta. E destrói muita coisa.
- Você sim é uma pessoa admirável, Harry. - precisei admitir.
- Está sendo irônica? - ele me olhou com uma das sobrancelhas elevada esperando pela minha resposta, mas só obteve um sorriso malicioso. - Bom, por mais que saiba, ou não, que mentir não é maneiro, por mais que ache admirável positiva ou negativamente, não é nada assustadoramente admirável ser mentirosa com seu próprio melhor amigo.Às vezes eu sentia Harry mais sensível do que o habitual.
- Eu não mentiria pra você nem que fosse uma mentirosa com selo dourado. Você perderia muitas festas de aniversário, Harry. - ri.
- Não tem graça.
- Ah, tem... - rebati.E pairou-se O Silêncio. Aquele que grita: Ele está começando a ficar irritado com sua personalidade insuportável! E minha consciência, ao invés de estar ao meu lado do time, gritava, também, em apoio ao Silêncio: Pare imediatamente, sua idiota, a não ser que queira mais um problema pra resolver! Por fim, vencida pelos dois lados, tive que dizer:
- Eu não quero conversar sobre isso agora, Harry.
Ele me olhou com aqueles olhos verdes com mel, aquelas duas lindas cores mescladas que combinavam tanto com ele. Não entendi sua expressão. Então desviou a atenção de mim e projetou na grama abaixo de si, arrancando algumas. Seu pé balançava ansiosamente. Dei um soco de leve no seu antebraço e sorri para ele, mas dessa vez ele não me olhou. E então eu sabia o que estava por vir: o sermão. Não porque eu não quis contar, e sim pelo que eu fiz, mesmo que ele não faça ideia do quê.
- Você não nasceu na era sem tecnologia, pode pelo menos avisar onde vai ou onde está. - ele começou.
- Pra quê? Se meu alazão sempre sabe onde estou.
- Ele não sabe, ele deduz. - Harry muda o tom de voz e eu dou uma leve acordada pro que realmente está acontecendo. Foi uma sensação bizarra. - E, se tiver sorte, ele te acha. Margot, não dá pra você sumir por horas sem avisar nada pra ninguém. Sem dar notícia alguma. Você concentra várias pessoas preocupadas em um lugar só, e retira pessoas de suas obrigações pra te procurar.
- Eu não te pedi pra sair do seu trabalho e vir até mim. - respondi antes de pensar.
- Eu também não pensei na possibilidade de perder meu emprego por sair no meio do expediente pra te procurar. Por preocupação e medo do que possa ter acontecido contigo.
- Harry...
- Pelo menos tenha consideração a mim. E, por favor, para de fazer isso.Qual era a opção de resposta quando não se pode responder com ironia? Ou um sarcasmo sequer? Definitivamente não era momento para ser engraçada, muito menos tentar. Ele estava certo, e eu... sou orgulhosa o suficiente pra me manter calada a pedir míseras desculpas pelo que provoquei ele a fazer e pelo que eu disse há instantes atrás.
- Vamos, - ele levantou e me deu as mãos pra levantar também - vou te levar pra casa. E passa isso. - ele me entregou um pequeno frasco de perfume. Merda. Ele sabia. - Você não me conta, Margot, mas pelo cheiro que você tá exalando, com certeza estava em mais uma daquelas festas cheias de drogas ilícitas, bebidas e música estridente, alta o suficiente pra deixar qualquer um surdo.
- Eu precisava relaxar. - me justifiquei.
- Ir pra lá não é relaxamento.Eu ri. Não era possível que eu estava ouvindo aquilo.
- Você não vive o que eu vivo pra me dizer o que é ou não relaxamento. - respondi, e percebi que tinha falado alto demais, o que na minha cabeça tinha soado como uma frase normal, depois de cinco segundos percebi que meu cérebro processou e proferiu o contrário. Decidi me levantar por contra própria, o que definitivamente foi uma má ideia, porque naquele momento, além já não ter controle da minha vida, eu não tinha controle sobre meu próprio equilíbrio. Que patético. Quando Harry me ajudou a ficar em pé, senti todo o meu corpo abaixar a temperatura. Me senti gelada.
- Eu costumava saber... - Harry me responde.
Tudo ficou turvo e escuro. Fiquei encarando Harry pra conseguir discernir se eu o xingava ou tentava ficar em pé sem precisar continuar segurando os braços dele.
- Margot? - foi a última coisa que ouvi.
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𝚋𝚎𝚝𝚝𝚎𝚛 𝚝𝚘𝚐𝚎𝚝𝚑𝚎𝚛.
Romancemargot e harry são melhores amigos desde a infância. um sinônimo para essa amizade é cumplicidade. entretanto, pessoas mudam e ciclos se fecham, e, durante esse percurso, um deles encontra um dilema: ficar ou seguir só. uma única questão martela em...