Capítulo Único

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Eu o vi.

Mesmo através da chuva torrencial, eu o vi correr pela mata. Pulava habilidosamente entre os troncos, desviava de shurikens e kunais lançadas, movimentando-se com aquela perícia que era só dele. Girou no ar ao desviar de um ataque, simultaneamente lançando projéteis na direção dos inimigos e, de onde eu estava, correndo perto da copa das árvores, vi a marca sinuosa da ANBU em seu braço.

Ele avançou, ganhando distância dos inimigos, mas estava ficando cansado. Após um ataque surpresa e uma fuga desastrosa, todos os outros membros do pelotão já tinham sido assassinados. Como sempre, ele era o único que restava.

É claro, não é, Kakashi?

Um prodígio da Folha não morreria em uma estúpida missão de reconhecimento em Amegakure. Ainda que tudo desse errado, ainda que os perigos fossem muito maiores do que o previsto e que Konoha o tivesse enviado para o covil do diabo, você, com sua genialidade, seria capaz de contornar quaisquer desvantagens... não é?

Você seria capaz de sair vivo mais uma vez, enquanto todos ao redor perecem.

... porém, a situação se tornava cada vez mais desfavorável. Seus pés resvalaram no limo do tronco úmido e uma lâmina pegou de raspão, fazendo sangue rubro escorrer do corte no braço, diluindo-se na pele molhada. E eu acelerei, acompanhando você mais de perto, incapaz de desviar meu olho da ação.

Os ninjas que o seguiam - e eram muitos, por sinal - o alcançaram. Diferente de você, estavam dispostos e descansados, felizes diante da possibilidade de assassinar um espião de Konoha. Eles o emboscaram e uma luta corpo a corpo começou. Em qualquer outra situação, não seriam páreo, mas, naquele momento, eles o sobrepujavam. Eu podia sentir sua fadiga, mesmo parado a metros de distância.

Acompanhei quando golpearam violentamente: um soco na boca do estômago, um chute na panturrilha, um golpe em cheio no rosto. Era um combate desequilibrado e, mesmo sob as máscaras, eu sabia que aqueles vermes de Amegakure sorriam. Eu vi seu corpo cambalear para o lado, o colete do uniforme ser rasgado por outro golpe de raspão de uma kunai. Um chute violento na lombar e você, meu antigo companheiro de time, foi ao chão.

Percebi que eu, involuntariamente, afundava os dedos com força na madeira do tronco velho onde me apoiava.

Eu deveria deixá-lo morrer, Kakashi.

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A cera escorria lentamente pela vela branca quando ouvi gemidos roucos.

Olhando por cima do ombro, observei-o enquanto se movia lentamente na penumbra, erguendo o rosto com dificuldade. As sombras se moviam pelas paredes de pedra com a chama que tremia. Ainda de olhos estreitos de dor e cansaço, ele apoiou a cabeça na parede atrás, agonizando baixinho. Não havia mais sangue, pois eu o havia limpado, apenas hematomas e algumas feridas.

Caminhei e me ajoelhei diante dele.

Kakashi piscou com dificuldade algumas vezes e vi que se esforçava para focar. O olho do sharingan - meu olho - ainda estava fechado. Mantê-lo ativo era uma tarefa dispendiosa, sobretudo para alguém que não havia nascido com os poderes dos Uchiha como eu. Daquele modo, apenas um olho negro me fitava, e mesmo com toda aquela dor, ele o arregalou ao se dar conta do que via:

— ... Obito?

Permaneci parado, mas notei que ele tremia e suava levemente.

— Há quanto tempo, Kakashi.

Ele se lançou para a frente num ato desesperado, mas as cordas que o prendiam à parede o seguraram. Parou com um solavanco, chacoalhando todo o corpo e continuou a me encarar, estupefato. Os nós apertavam seus punhos atrás das costas e o mantinham seguramente controlado.

Fantasma (ObiKaka)Onde histórias criam vida. Descubra agora