dez

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DEZ

A única coisa é que agora tenho de ser mesmo uma empregada doméstica.

Na manhã seguinte ponho o relógio para despertar cedo e chego à cozinha antes das sete, com avental. O jardim está enevoado e não há sons, a não ser dois pássaros tagarelando no gramado. Sinto como se fosse a única pessoa acordada no mundo. 

O mais silenciosamente que posso limpo a lavadora de pratos e guardo tudo nos armários. Ajeito as cadeiras sob a mesa. Faço café. Depois olho as brilhantes bancadas de granito ao redor.

Meu domínio.

Não parece meu domínio. Parece a cozinha apavorante de outra pessoa.

Então... o que faço agora? Sinto-me toda pinicando, só de estar ali. Deveria estar ocupada. Meu olhar pousa num antigo exemplar da Economist na prateleira de revistas perto da mesa e folheio-a. Folheio e começo a ler uma interessante matéria sobre controles monetários internacionais, bebericando o café.

Então, ao ouvir um som vindo do andar de cima, guardo-a rapidamente de novo. Empregadas não costumam ler artigos sobre controle monetário internacional. Eu deveria estar fazendo alguma coisa, geléia, por exemplo.

Só que já há um armário cheio de geléia. E, de qualquer modo, não sei fazer.

O que mais? O que mais empregadas fazem o dia inteiro? Enquanto examino a cozinha de novo ela me parece perfeitamente limpa. Poderia preparar o café-da-manhã, ocorre-me. Mas só quando souber o que eles querem.

Então, de repente, lembro da manhã da véspera. Ingrid me preparou uma xícara de chá.

Talvez hoje eu devesse fazer uma xícara de chá para ela! Talvez os dois estejam esperando lá em cima, batendo com os dedos impacientemente, dizendo "Onde está a porcaria do chá?"

Rapidamente fervo a água e faço um bule de chá. Ponho numa bandeja com xícaras e pires e, depois de pensar um momento, acrescento uns dois biscoitos. Depois vou para cima, sigo pelo corredor silencioso até o quarto de Ingrid e George... e paro diante da porta.

E agora?

E se eles estiverem dormindo e eu os acordar?

Vou bater baixinho, decido. É. Uma batida curta, discreta, de empregada.

Levanto a mão para bater - mas a bandeja é pesada demais para ficar numa das mãos e há um tilintar alarmante quando o negócio todo começa a se inclinar de lado. Horrorizada, agarro-a antes que o bule escorregue para fora. Suando, ponho tudo no chão, levanto a mão e bato bem baixinho, depois pego a bandeja de novo.

Não há resposta. O que faço agora?

Hesitando, bato de novo.

- George! Para com isso! - A voz de Ingrid se filtra levemente pela porta.

Ah, meu Deus. Por que eles não escutam?

Estou toda quente. Esta bandeja é pesada para cacete. Não posso ficar a manhã inteira do lado de fora do quarto deles, com o chá. Será que devo me retirar?

Já vou me virar e sair de fininho. Então a determinação me domina. Não. Não seja tão molenga. Fiz o chá e vou servir. Ou pelo menos vou oferecer. Eles podem muito bem me dispensar.

Seguro a bandeja com força e bato com o canto dela na porta. Eles têm de ouvir isso.

Depois de um instante a voz de Ingrid se eleva.

- Entre!

Sinto um jorro de alívio. Tudo bem. Eles estão me esperando. Eu sabia que estariam. De algum modo viro a maçaneta enquanto equilibro a bandeja apoiada na porta. Empurro-a e entro no quarto.

Regina Mills, executiva do lar - SwanQuennOnde histórias criam vida. Descubra agora