2 - Preconceito e Arrogância

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Jane Austen... Jane Austen... Onde eu começaria essa história? — foram as primeiras palavras no caderno, enquanto escrevia sentado na calçada da frente da escola, sob a sombra de uma árvore com folhas fedidas, de onde caíam mandruvás durante o verão (Felizmente era inverno). Era estranho. Sempre tinha palavras de menos para falar e demais para pensar, mesmo assim encontrei uma enorme dificuldade em encontrar as melhores e transcrever para aquelas páginas amareladas. Definitivamente, imaginar que estava conversando com uma mulher que viveu no século dezenove enquanto deixava minha imaginação fluir em palavras não ajudava muito... Ainda era uma pessoa, mesmo que não estivesse literalmente comigo, estava, no plano das ideias. Do começo, talvez.

— Uau, você é mesmo um gênio — ele disse às minhas costas. A voz era gralhada e extremamente comum. Não precisei me virar para ter a imagem dele na minha mente: alto, olhos escuros, cabelo longo extremamente sedoso e pele amarelada. Eu o detestava... E ainda assim era melhor amigo. — Uma história que começa do começo, genial, Machado de Assis — ele zombou, sentando-se do meu lado na calçada e esticando as pernas sobre o asfalto, como se ignorasse o fato de que um carro poderia passar ali a qualquer instante e arrancar elas fora.

— Não enche — respondi em seguida, fechando o caderno bruscamente e o socando na bolsa de qualquer jeito. Finalmente pude encarar Jan pela primeira vez... Ele definitivamente continuava cabeludo, cacheado, com a pele perfeita e com rosto muito bonito. É irritante ter um amigo que parece um ator de comédia romântica quando você não parece nem sequer um monstro de um filme de terror de baixo orçamento, não é?

A expressão no rosto dele transbordava ansiedade, mas também bons tons de receio e medo, como se estivesse planejando algo escondido. Suspiro. Lá vem.

— Que foi agora? — questiono logo, jogando a mochila nas costas, me levantando da calçada e caminhando pela rua da escola, indo na direção da minha casa. Jan vem atrás, quase saltitando de tanta animação, enquanto fofocava sobre as "imperdíveis" novidades das redondezas da vizinhança, que se limitavam a: novos moradores que chegaram no dia anterior, uma garota, um garoto e duas senhoras. Lembro de ele ter mencionado "bonita" umas mil vezes, o que deixou a conversa maçante e eu acabei me abstraindo, encarando o chão e matutando constantemente sobre o que devia fazer para começar o tão bendito diário...

— Então é por isso que você vai comigo — e essa foi a última coisa que ouvi antes de brandir as chaves de casa nos dedos, com a porta à minha frente e a brisa levando meus cabelos. Encarei Jan sobre os ombros, com um olhar entediado e impassível, sorri de maneira zombatória e respondi.

— Definitivamente não — já estávamos caminhando para dentro de casa, com ele insistindo constantemente, argumentando de mil e uma formas diferentes, quando demos de cara com Lídia, que parecia totalmente entediada enquanto rabiscava croquis de vestidos no livro de química, sentada na sala de estar, absorta em seus pensamentos, com um ar irritado e desgostoso. A televisão chiava com o ruído da interferência, que na verdade era o ruído da antena que era (E ainda é) péssima.

— Vai, por favor, só quebra essa pra mim, mano — Jan insistiu, com um olhar de cachorrinho sem dono. Lídia revirou os olhos e se afastou um pouco do sofá para que eu e ele pudéssemos nos sentar.

— E porque você precisa tanto que eu vá, Jan? — suspirei, tirando a mochila dos ombros e jogando os pés sobre a mesinha de centro. Jan suspirou, olhou ao redor e buscou as melhores palavras.

— Bem, porque sua mãe trabalha lá... E, bem, não ia parecer que a gente ta indo por pura curiosidade de ver o pessoal novo — ele respondeu pensativo. Lídia e eu compartilhamos o mesmo olhar de desprezo para ele.

Orgulho, Preconceito e ArrogânciaOnde histórias criam vida. Descubra agora