A Cabana

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A Cabana

Quando o Xerife Morrison estourou a porta com uma pesada certeira entre o trinco e o meio da porta, as farpas da madeira estilhaçada voaram por todos os lados levantando uma poeira espessa que manchou o ambiente a dentro. O trinco de ferro quicou no chão entrando na sala e rolando para debaixo do sofá.

Ouve-se o bater das Asas.

As janelas entre abertas despistam o movimento dos Abutres.

            - Dolores, você está ai? – Gritou o policial, certo de que se estivesse, teria atendido a porta com as pesadas batidas proferidas a segundos atrás.

            O Homem alto e robusto suou frio, as gotas escorriam por sua pele surrada pelo sol, dando uma aparência Latina ao homem americano, seus cabelos grossos e acinzentados, mostravam-se empapuçados pelo suor. Morrison era nitidamente um homem forte devido toda sua vida militar, e antes mesmo disto, sua conturbada adolescência na roça, onde ajudava seus pais com a colheita e o rebanho. O Homem tinha marcado pelo peitoral semi aparente na grande brecha do colarinho, cicatrizes e marcas de bala adquiridas nos tempos que serviu as Forças Armadas. Morrison podia sim, ser chamado de Bárbaro texano. Um homem misterioso, forte e de um péssimo temperamento , cujo seu principal defeito era jamais levar um desaforo para casa, comportamento que o colocará em risco várias vezes.

            Não pensou duas vezes, sacou do coldre seu revolver calibre .38 e mirou na escuridão, tremendo devido a adrenalina, bufou e tossiu agitando os pelos do bigode volumoso, que ajudará preencher a barba negra e avantajada.

Ahhh Xerife Morrison.

O comandante da pequena cidade de Nova Esperança continuou se afundando cada vez mais no que parecia ser uma sala de estar mal arrumada, fatiando o ambiente em busca de algo ou alguém, seus olhos arregalaram. Morrison viu sangue espalhado por toda a sala arrastando-se para os fundos da cabana, o casebre construído de madeira rangia a cada passo dado, o estilo sulista e simples estava contido em cada centímetro assim como a umidade e o odor de carne podre.

            Como se fosse num filme de bang bang dos anos 80 um tapete sujo fazia o cortejo a entrada da pequena sala, uma mesinha de centro suportava uma garrafa de Whisky vagabundo, latas de cerveja vazias e um charuto ainda soltando fios de fumaça jazia deitado em um cinzeiro.

            Em frente, um sofá de couro surrado faz parte do cenário dando extensão a sala até a chegada de uma parede com um quadro trincado onde aparentemente um casal feliz sorri postados a muitos anos atrás, a foto em preto e branco, sugere a idade da fotografia.

             - Dolores, estou entrando... – A esperança de Morrison, é notavelmente ampla como a de um familiar acreditando que o cachorro não comeu seu chinelo.

            Um radinho chato e agudo descansa logo abaixo do quadro em uma cômoda também velha e podre, o rádio tocara "I'll Be Your Baby Tonight na voz de Bob Dylan.

            -  Mas que merda é esta? Tem alguém aí? – Morrison levou a mão esquerda a boca como se fosse vomitar. Uma tosse insuportável desperta lapsos em seu corpo, ele se curva e toma fôlego.

            - Que merda se passou aqui? – O Xerife continuara a se perguntar mesmo sabendo que ninguém lhe responderia.

            Sem pensar duas vezes continuou rumo ao corredor, predestinado a encontrar em um dos quartos, aquilo que fora procurar. Antes, deu uma olhada para a porta da sala ainda aberta com a marca de arrombamento perto da maçaneta, os raios de luz agora desenhavam a poeira no ar pesado dentro da cabana.            

            Localizada aproximadamente a 4 km de NewHope a cabana pertencia a Dolores Gray, uma imigrante do México muito conhecida nas redondezas. Dolores fora casada com Henry Gray, que morreu a 10 anos atrás. Notícias como esta correm como uma bala perdida pelas vielas e cafés de NewHope.

            Por um instante Morrison distancia-se do verdadeiro cenário recordando-se do quanto Dolores passou afundada cabana a dentro cercada pela depressão e tristeza. Henry faleceu misteriosamente sendo considerada apenas uma morte natural, meses depois cartas de Henry relatando fatos distorcidos da realidade, foram encontradas em seus itens pessoais, ninguém jamais suspeitou ou se interessou no que o velho dizia, até mesmo por que, já estaria morto de uma forma ou de outra, mas Dolores passou dias e noites tentando convencer a polícia de que algo errado havia na morte de seu marido. Sem sucesso na investida, Dolores afundou-se na cabana e deixara de aparecer havia semanas, não ia a feira, ao mercado ou em suas corriqueiras consultas ao Médico da cidade.

            Imediatamente, Morrison prontificou-se em atender um chamado de vizinhos nas mediações da residência de Dolores, por ser amigo pessoal da família deixou a curiosidade corrompe-lo, preocupado com o teor das ligações desviou a rota de seu carro de patrulha dirigindo-se a estrada rural rumo ao Novo México.

            Quando chegara a residência cruzou o campo de grama seco, movendo a porteira de madeira podre para a lateral, não fez questão de chamar reforços, acreditou que sua simples presença poderia colocar fim a qualquer problema encontrado lá. De imediato sentiu o cheiro insuportável. Ainda mais preocupado, rumou ao deck de madeira anexo a porta de entrada do casebre.

            Morrison tornou a olhar para dentro do quarto escuro já com as mãos envoltas ao nariz e boca, escutou o alto e pesado zumbido das varejeiras, muito comuns nesta época do ano devido ao intenso calor.

            O cheiro de podridão aumentara conforme os passos pesados rangiam a madeira do corredor, gotas de suor escorregavam pela testa do velho homem que já sentia pontadas na bexiga. A cada passo a porta entre aberta parecia cada vez mais tentadora, o homem já não sentira mais medo, e sim curiosidade, o ranger da madeira deu espaço a um som oco e úmido conforte o sangue afundara nos tacos semi podres.

            O voluptuoso pomo de adão do velho sobe e desce em um movimento automático enquanto sua garganta deseja aquele fôlego recém tomado. Mais passos úmidos e espaçados profanam uma sintonia fúnebre na madeira gasta. O homem está a quase um metro da porta e repara que pelo chão e parede, pedaços de unha estão cravados a madeira como sinal de resistência, fios de cabelos brancos e cinzas também aparentam estar grudados de alguma forma na porta úmida com os restos do sangue espalhado pelo corredor. Algo naquela cena não estava certo, pelos detalhes, um corpo aparentava ter sido arrastado do corredor para dentro do cômodo. Naquele momento, o Policial desejara que não tivesse sido Dolores.

            Morrison sentiu como se um arrepio estivesse a percorrer sua espinha, quando chegara ao batente da porta foi convidado a entrar, uma voz sussurrou em seu ouvido. Fazendo inclinar-se dentro do quarto escuro.

            - Entre! Venha ver o que preparei para você!  - Morrison se agarrou ao batente, porém foi empurrado para dentro, como se alguém realmente tivesse o feito. Disparou um tiro involuntário como reflexo do empurrão, Morrison não sabia que as chamas do Revolver, produziriam um clarão revelador.

            Uma catarse de sangue e odor espalhada pela cama e cômoda do quarto transformou as esperanças do Xerife em medo e horror, uma mistura de crime e devastação estava presente no quarto. Morrison olhou para todos os lados e não viu sequer algo que pudesse distinguir ou processar.

Sangue e miolos espalhados por todos os lados, pintavam cortinas e paredes com os restos mortais desprovenientes de vida de Dolores, o cheiro insuportável fez Morrison correr para fora do quarto e vomitar no corredor, o policial caiu de Joelho puxando o rádio da cintura.... Sem conseguir proferir as palavras com clareza, o rugido do homem de mais de 20 anos de experiência na polícia profanou:

            - Preciso de apoio, preciso de apoio. – Replicou Morrison apagando aos poucos, caindo forte com o rosto na madeira. Deitado no corredor, visualizou uma última vez a apoteótica situação no quarto, com os olhos serrando-se ele repara algo debaixo da cama, um pacote pardo amarrado com cordões, o homem tenta esticar o braço e dizer algo, mas acaba finalmente desmaiando.

             

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⏰ Última atualização: Feb 18, 2015 ⏰

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Ninho de Sangue - A Maldição da CidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora