Capítulo Único

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E ela encontrou conforto no lugar mais estranho: nos braços daquele que se dizia frio e cruel, que se dizia odiar a todos e não ser misericordioso, que se dizia não amar ninguém.

Mas claro que tudo aquilo sobre ele não era a verdade, nunca foi.

Ele podia enganar quem quisesse, era bom nisso. Não se importava que as pessoas pensassem coisas hediondas sobre ele, ou que dissessem o que for; não se importava. Aprendeu a não se importar.

Mas com ela era diferente. Ele se importava se ela o achava interessante, ou achava bonito ou se ia gostar do perfume dele. Se perguntava se ao menos ela sabia quem ele era e não o julgava apenas pelos mitos e pelo que os outros deuses diziam a seu respeito.

Sim, ele se apaixonou.

E, ah! Há quanto tempo ele não sentia aquilo. As famosas borboletas no estômago e o frio na barriga, o coração bater acelerado e as mãos suarem, tentar falar mas acabar gaguejando, a respiração descompassada...

Fazia mesmo muito tempo que ele não sentia aquilo (e era uma sensação boa, até), mas não era para ser assim, não era para ele se sentir bem, porque, oras! Ele era o deus dos mortos! O deus frio e calculista! Não era para ele se sentir feliz daquele jeito! Não era para ele sorrir feito um bobo ao pensar nela, não era para ele corar ao olhar para as flores que a lembravam, não era para ele ver ela em tudo o que fazia!

Se sentia confuso e irritado consigo mesmo. Como pode se apaixonar de novo? Como pode ser tão fraco, de novo?

Porque ele achava que amar era uma fraqueza, e até certo ponto podia ser mas, tinha seu lado bom também e este ele estava prestes a conhecer.

Já ela, a questão era outra. Achava o amor lindo e encantador; a coisa mais bela que já criaram. Porém achava que ele era incapaz de sentir esse sentimento; achava que ele era incapaz de senti qualquer sentimento. Como seria possível um cara como ele, amar? Nunca demonstrou um pingo de felicidade seja ela qual for, porque amaria alguém?

Tá que ele tem filhos e esses filho, tem mães, mas ele não as amou, né? Foram apenas momentos. Amor? Claro que não!

Era isso o que ela pensava, era isso que todos pensavam. Pois ela adotou os pensamentos dos outros ao invés de criar os seus próprios, e não via problema nenhum nisso; aliás, nem pensava nisso, digo, se o que o povo dizia era verdade ou não.

Mas depois daquele dia, depois daquele "maldito" dia, em que encarou pela primeira vez aqueles olhos negros como ônix, que a encaravam com nervosismo, milhões de pensamentos confusos inundaram sua mente.

Por que ele está me ajudando? Por que não me matou ainda? O que ele quer? Por que me olha assim, como se tivesse medo de mim? Ele está nervoso? Ou eu estou confundindo as coisas? Por que eu não consigo respirar direito? Por que estou suando? Parece que vou ter um infarto! Por que não estou com medo? Mas que olhos lindos. Que boca linda também. Ele tem covinhas! Adoro homens com barba. Será que meu pai vai se importar se eu sumir um tempinho com ele? Ah, o que importa, né?! Espera... o que?

Porque claro que você não acreditou que quando Perséfone foi raptada, aquela tinha sido a primeira vez que eles tinham se visto, né? Aquilo era só uma fachada criada por Zeus para "manter as aparências" pois, óbvio que ele não aceitaria que sua filhinha querida estivesse se envolvendo com Hades e que ele não poderia fazer nada contra aquilo. Imaginem o que os outros deuses iam pensar! Claro que não! Ele não podia permitir aquilo! E muito menos deixar que os outros pensem que Hades e Perséfone se casaram por amor! Nunca! Então criou o mito, para apaziguar a situação (dele).

E Hades e Perséfone? Bem, eles casaram (depois de muita história e enrolação (da parte dela, só pra constar)) e pouco se importaram com o mito que Zeus criou (que Afrodite ficou muito "P" da vida, inclusive, ao saber que Zeus estragou a linda história de amor dela). 

Mas, eles estavam felizes e todo o resto era ínfimo perto daquilo.

Hades & PerséfoneOnde histórias criam vida. Descubra agora