A carta de Tieko-san

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  Eu não sou um burro de carga, mas não tenho a capacidade de ir contra a minha mãe.

  Isso é realmente vergonhoso. Consigo correr quase tão rápida quanto um raio, explodir cabaças só com o ar que se encontra nos meus pulmões e decapitar demônios, mas é só aquela mulher segurar um chinelo de madeira que já fico toda acanhada no meu canto.

  Sinceramente, a arma que deveria derrotar Muzan Kibutsuji devia ser o chinelo de madeira da mamãe, não uma nichirin. Aquela coisa é capaz de assustar muito mais do que a lâmina de uma espada, e não importa o quanto você corra, aquela desgraça vai te acertar. Seja humano, demônio ou Pilar, todos são derrotados pela chinelada da morte.

  Apenas contextualizando: algumas horas atrás, uns cinco vasos chegaram aqui em casa para compor a decoração do jardim. Todos são realmente bonitos, cheios de detalhes delicados, mas pesados como chumbo.

  Eu sinceramente não gostaria de parar o meu incrível hobby de procrastinar para carregar eles para lá e para cá por todo o jardim, mas como posso lutar contra minha mãe?

  Enfim, não posso reclamar com ninguém. Sou a única aqui em casa que é capaz de levantar um peso desses, e esse exercício todo até que serve como treinamento de força. Mas agradeço mentalmente por minha mestra não estar aqui, pois ela provavelmente iria rir da minha cara enquanto toma limonada dentro de casa ou algo do tipo.

  Apesar de não estar muito contente com a minha atual situação, Yukio parecia estar se divertindo bastante enquanto plantava e replantava todas as plantinhas que cuidava com tanto carinho por todo o jardim. E, mesmo se sujando inteiro de terra no processo, não parecia estar preocupado com isso.

  Acho simplesmente incrível como algumas pessoas cuidam de plantas e animais melhor do que tratam seres de sua própria espécie. Mas, sinceramente, não posso culpá-los por isso. Seres humanos podem ser bem... Meh.

  Erguendo o vaso com o detalhe de flores lilás pela décima e sei lá quanta vez, fui cambaleando com todo o peso que estava carregando até o ponto desejado por Yukio. Tomei o cuidado de não o derrubar em cima dos meus pés e o coloquei no chão sem me importar muito em ser delicada.

  Limpei o suor da minha testa com a costa da mão. Não estava exatamente cansada, o principal motivo de estar suada era o calor. Podia ser primavera, mas está quente como o verão. Me pergunto se irá refrescar de noite, pois costumo ter a mania de não conseguir dormir sem um cobertor (um pequeno hábito de infância na qual não consegui me livrar até os dias de hoje).

  Erguendo os olhos para o céu, percebi que este já estava sendo lentamente tingido de vermelho e laranja. Parecia que alguém havia ateado fogo na atmosfera. Seus tons quentes eram tão belos, combinavam perfeitamente com as nuvens levemente rosadas.

  Yukio puxou a manga do meu kimono para chamar a minha atenção. Virei o rosto em sua direção e percebi que ele tinha uma mancha marrom no nariz. Como havia conseguido sujar seu nariz? Havia tentado cheirar a terra? Ou havia caído de cara no vaso? Acho que nunca saberei a resposta.

  Ele apontou para a porta de casa com sua mãozinha suja e notei minha mãe nos chamando para dentro. Parecia que estou finalmente livre do meu tedioso e cansativo trabalho de carregar vasos pelo jardim.

  Deixando as ferramentas de jardinagem para trás, Yukio correu até nossa mãe, sendo barrado por ela na entrada. Foi obrigado a retirar os sapatos e continuou correndo para dentro da casa. Como ele conseguia ter tanta energia assim?

  Assim que coloquei meus pés descalços do tatame de casa, pude sentir os passos apressados dos dois em direção ao banheiro, além do delicioso cheirinho de comida. Fui até a cozinha para lavar as mãos e beber um copo de água enquanto presto atenção nas vibrações provenientes do solo. Aparentemente, minha mãe havia fechado a porta do banheiro e estava vindo na minha direção.

Imagine - Kyojuro Rengoku [Em Hiatus]Onde histórias criam vida. Descubra agora