Vanessa

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E lá estava ela novamente, tentando encontrar alguém com quem compartilhar suas palavras, alguém que não tentasse lhe arrancar a cabeça do pescoço pelo que ela é, alguém na mesma situação ou algo parecido, que pelo menos a entendesse, mas aquilo parecia impossível. Nesse enorme mundo em que vivia, ela era a única que tinha sido marcada com aquilo, uma coisa que a acompanhará pelo resto de seus dias, que ela nem sabe se terão fim.


Fugindo, se esgueirando, caçando para se alimentar. No início era simples, pois seu dono a ajudava trazendo suas refeições, mas após o ocorrido com aquele grupo de fanáticos achando que eram os salvadores do mundo, ela acabou ficando sozinha. "Ah Zé! Por que você foi tão desatento?" ela pensa, mas nunca saberá, não até descobrir o porque de seu senhor ter se deixado levar pelos prazeres desse mundo e pela morte iminente. Não até descobrir que ele tinha desistido de tudo e achava que seu destino já estava traçado, pois descobriu coisas horríveis sobre si mesmo e sobre seus semelhantes, que ela nunca sonhou em saber.


Aquele beco parecia estar mais escuro essa noite. Ela sempre passava por ali, mas até parece que nunca tinha reparado naquelas latas de lixo num canto. Talvez porque nunca tinha precisado disso antes. Talvez porque sempre passava com pressa por ali e nunca pensou que voltaria àquele lugar depois de tudo o que aconteceu.


Ela ouve um barulho.


Não como aqueles que ela costumava ouvir sempre naquele local. Ratos. Gatos. Mendigos. Não. Aquele ruído era diferente. Como se chamas ardessem em brasa e no fundo, uma voz sussurrasse palavras obscuras que ela ainda não tinha entendido o significado, ou não conhecia. Ela se vira, tem alguém a vigiando. Do alto uma sombra passa e desaparece em meio a escuridão. No fundo ela sabe quem é, mas não quer acreditar que aquilo seja possível. Que algum inimigo a tenha encontrado. Não da forma como ela tem se escondido desde o início. Aquilo que seu senhor fez foi uma isca, ela tinha certeza disso, mas também não queria acreditar que tudo tivesse acontecido tão rapidamente.


- Espere! – sussurra uma voz suave e agradável. Parece pertencer a um adolescente na flor da idade, com seus 15 anos no máximo, pois existem vestígios de troca de tons no som da sua voz. – Te procurei por tanto tempo, Vanessa. –


Como ele sabia o nome dela? Isso era impossível! Sua família estava longe, pois ela havia os deixado em sua cidade natal pra fugir e evitar transtornos, ela havia forjado sua própria morte, mas já fazia muito tempo. Meses ou anos. Só agora ela tinha parado pra pensar no tempo que se passou, e não se lembra ao certo quando tudo começou. Não se lembra de nada. Parece que, quando a eternidade é seu fardo, você não tem tempo pra pensar no quanto o tempo está se passando.


- Quem é... -


- Você não me conhece. – ele a interrompe. Aquela voz definitivamente é de uma criança. – Estou aqui pra te ajudar, mas você tem que confiar em mim. Venha. Me acompanhe, pois estamos sendo observados... –


Um tiro faísca do lado esquerdo, batendo numa lixeira. Parece até ter acertado ali propositalmente. Os dois correm o mais rápido que podem. Ela está desarmada. Tudo ficou em seu antigo esconderijo, com seu mestre despedaçado. Seu único companheiro, com suas armas, roupas e tudo o mais que ela precisava pra viver essa sua vida. Tudo se queimou em uma enorme bola de fogo. Ela observa o rapaz. Ele tem braços fortes e ela ouve sua respiração. Aparenta ser como ela, mas seus traços, seu sangue pulsando e seu coração batendo a confundem, apesar de ela saber que isso é possível. Sombras passam sobre eles, faíscas de tiros continuam a ser vistas, junto com o barulho característico da pólvora sendo explodida no cano da arma. Ela apenas segura reciprocamente na mão direita do rapaz, sendo guiada para algum lugar seguro. "Assim espero..."

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⏰ Última atualização: Feb 05, 2016 ⏰

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A Dama de todas as noitesOnde histórias criam vida. Descubra agora