Uma brisa fresca batia em si, sacudindo os fios de cabelo preto enquanto descascava uma tangerina. Movia-se levemente na simples cadeira de balanço, apreciando a paisagem vista de sua varanda. O cheiro cítrico da fruta o embriagava completamente de recordações, transportando-o para o passado.
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Sua namorada era, sem dúvidas, a mulher mais incrível que ele tinha conhecido. Toda vez que pousava seus olhos nela, não conseguia evitar olha-la com admiração e amor. Ela o fazia flutuar e também era quem firmava seus pés no chão.
Ele a conheceu com nove anos quando esqueceu a merenda em casa e estava sem dinheiro para ir à cantina. Ao chiar alto, a garota dois centímetros mais alta – o que ela sempre fazia questão de ressaltar – e de curtos cabelos castanho claro se ofereceu para custear o lanche dele com uma condição. Ele aceitou de imediato, fazendo-a sorrir perversamente. Em compensação a boa ação dela, ele teve que bancar seu lanche o resto da semana. Apesar de achar um absurdo, não se recusou a pagar a extorsão dela, já que ela o tinha ajudado enquanto esteve faminto. Depois da semana de exploração, Lucas continuou a procurar Helena em sua sala, que ficava na ponta oposta de seu corredor, para passar o recreio com ela.
Não demorou muito para se tornarem inseparáveis e, mais tarde, mesclarem seus amigos, tornando-se um grupo só. Também não demorou muito para a amizade especial que nutriam pelo outro se transformar em algo a mais, algo que eles não eram capazes de diferenciar.
Quando entraram na adolescência, tudo passou a ser mais confuso, entretanto, outras coisas ficaram mais nítidas. Ambos tinham consciência de seus sentimentos, mas sempre negavam em voz alta para seus parentes e amigos que insistiam em implicar com a relação dos dois, o que os fazia acreditar que o outro não correspondia da mesma forma.
No aniversário de Matheus, o primeiro a fazer quinze anos do grupo, uma roda de pessoas com corações apreensivos circulava uma garrafa que girava rapidamente enquanto jogavam Verdade ou Desafio. Quando uma das garotas na roda desafiou Lucas a beijar Helena, ele a olhou com raiva e, ao mesmo tempo, gratidão. A ficha de Helena só caiu quando a roda passou a gritar seu nome e, em seguida, "beija! beija!". Trocaram olhares receosos para confirmar se ambos concordavam antes de Lucas engatinhar até onde Helena estava sentada e beija-la.
Ao descolar seus lábios do dela depois de dois segundos, ele desviou o olhar e voltou encabulado até onde estava sentado antes, ouvindo o gritinho estridente de seus amigos serem substituídos pelo silêncio enquanto rodavam a garrafa novamente. Ele estava tão distraído com seu coração palpitando forte e suas mãos tremendo que nem pôde vislumbrar o rosto corado de Helena lhe espiando a cada poucos segundos.
Ainda na festa, Helena foi confronta-lo por estar a ignorando. A conversa que começou com "foi só um selinho, nada demais", terminou com uma declaração dele e um pedido de namoro aceito por ela.
Anos haviam se passado e a chama do amor deles se transformava em um incêndio maior a cada dia. A confiança forte, as brincadeiras constantes, a cumplicidade extrema, demonstrações de afeto e o jeito que se transbordavam no outro constituía o relacionamento deles. Suas famílias os apoiavam com vigor, apesar do pai de Helena não ter aprovado muito bem no início que sua pequena filhinha namorasse antes dos trinta anos, mas deu o braço a torcer por saber que Lucas era um bom garoto.
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Perfume de Laranja
RomanceSob a brisa fresca ao mover-se levemente na cadeira de balanço, enquanto descascava uma tangerina, Lucas foi tomado por recordações, transportando-se para o passado ao se lembrar da promessa feita há vinte e quatro anos para o amor da sua vida.