O QUADRO

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Era mais uma tarde de domingo. O bairro estava mais calmo, o assobio dos pássaros sem a interrupção de buzinas e motores de automóveis era notória e o ar sempre parecia mais limpo nesse dia da semana.

Helen, como um tipo de tradição pessoal que criou a 4 meses, não deixava de ir à única galeria que se mantinha aberta até o fim da tarde a cada dois domingos.

Seu objetivo era sempre o mesmo, frequentava aquele lugar a fim de contemplar a pintura que tanto lhe intrigava. Seu nome era ''O que te chama a atenção?'' A arte nada mais era do que uma grande tela azul com um simples ponto preto no meio de toda sua composição.

Havia dias em que cinco minutos bastava, mas também havia dias que Helen passava mais de uma hora olhando para ele. E a jovem mulher sabia que atraía olhares curiosos sobre ela, mas nada que a incomodasse ao ponto de lhe interromper os devaneios. Até que:

-É impressionante, eu não consigo parar de olhar - Num leve sobressalto de susto, a mulher de longos cabelos ruivos, olhou para o rapaz que estava do seu lado a alguns minutos, mas não tinha percebido. Sobretudo, voltou seus olhos para a arte.

- Olhar o que?

- Ora! O pequeno ponto no centro - apontou na direção - Será que era somente essa a intenção do pintor ao colocar esse título para sua pintura?

- Qual a intenção?

- Nos fazer automaticamente focar no que não está uniforme com o restante.

Aquelas últimas palavras sobre saltaram nos ouvidos de Helen. ''Focar no que não está uniforme''

- Acho pouco provável, visto o tamanho da insignificância que isso tem, comparado a toda imensidão azul do restante da obra - Comentou ela, mas na verdade era exatamente essa dúvida que vem refletindo em todo esse tempo.

- Então o ponto não te chama a atenção? - Encarou-a com um olhar sugestivo.

- Não é que não chama, mas seria ele o fator mais importante do quadro? - Devolveu o mesmo olhar.

- Bem, se você o retirar, tudo o que sobre é uma cor.

- E quanto à sua imaginação? - gracejou, Helen, retirando do rapaz um sutil sorriso e um aceno com a cabeça em concordância.

E voltaram a encarar a obra novamente.

- Acha metafórica?

- Essa pintura? Com toda certeza ela é!

- Como transcreveria?

- Não gosto da ideia de ter que legendar - Disse ele, um pouco reticente - Gosto mais da sensação que cada coisa me provoca. Contudo, se esse é o caso - Encarou a pintura mais uma vez - Nós, pessoas, estamos sempre focando em algo... Seria esse algo o todo azul, ou a pequena e hipotética ''falha'' no centro?

Helen ficou alguns minutos pensando e então disse:

- Até poderíamos pensar sobre ''Seria o ponto uma falha ou o essencial?''

- Exatamente por isso que não ponho legendas. Pois sempre pode haver uma perspectiva diferente.

Helen assentiu devagar e o silêncio voltou a ser companhia do ambiente, enquanto ambos ainda observavam a arte. 

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