1 - Ponte

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Luffy nunca tivera os gostos musicais parecidos com os de Law no entanto, agora, ficar cantarolando a música favorita do tatuado não lhe soava tão ruim assim. Sentado sobre a berma daquela ponte onde antes fora feliz, com uma garrafa vazia numa mão e um cigarro na outra, nem mesmo o som do telemóvel a tocar insistentemente ao seu lado o conseguia distrair da melodia.

Se lembrou do passado, daquela noite em que com um novo anel no dedo depois de ser pedido em casamento naquele mesmo local, Law o pegou no colo e o levou desse jeito até á casa que partilhavam enquanto o menor o abraçava pelo pescoço. Se lembrou do sentimento de completo no seu peito totalmente oposto ao agora, daquela noite inesquecível em que mais uma vez os seus corpos se tornaram um, agora com um novo significado. Se lembrou de cada traço do mais velho... De cada toque... De cada demonstração de amor...

Recordou também dos seus maus hábitos. Dos raros momentos em que via Law beber escondido para afugentar o stress, o suficiente para se acalmar mas não para perder o controle ou para deixar que Luffy percebesse que algo estava mal. Lembrou do cheiro a tabaco entranhado no tecido das suas roupas de cada vez que o outro fumava, hábito que apanhara do pai adotivo e que deixava aquele odor intenso do qual Luffy sempre reclamava e da promessa de um dia largar o vício, única que nunca cumpriu.

Se lembrou que, agora, dava tudo para ter esses hábitos de volta. Nunca mais reclamaria se eles fizessem de novo parte do seu cotidiano até porque, naquele momento, ele mesmo estava embriagado por eles, pela garrafa que pegara na casa de Marco e pelos cigarros que encontrara no bolso do casaco do seu amado. Naquele momento, sendo essa a única coisa que ainda o unia a Law, não parecia tão ruim assim quanto costumava achar. De facto, se soubesse que acabaria daquele jeito, teria aproveitado mais esses momentos ao invés de reclamar deles, teria guardado cada memória como uma pérola preciosa, teria - talvez - até compartilhado esse mundo com o tatuado e posto de lado a sua razão, apenas para ter ficado mais uns segundos junto dele enquanto o mesmo debilitava a sua própria saúde.

Olhou a tela do celular onde uma foto do mais velho ainda se fazia presente. "Se eu for ter com você, será que está tudo bem? " - Murmurou para ele mesmo. Ah sim, aquilo parecia o mais certo agora. Law era o único que lhe restava, sem ele... Que motivos tinha Luffy para continuar a viver?

E ele tentou... Tentou esquecer Law, tentou ver algum lado positivo na vida, tentou fazer com que a bebida que sempre ajudava o maior, o ajudasse a ele também a esquecer. Tentou, mas não conseguiu... Ao invés disso, parecia ter encontrado o fundo de um poço de autodestruição no qual não havia mais nenhuma saída a não ser cavar mais fundo e reencontrar a única pessoa que ele sentia que alguma vez o amou direito.

Abriu a lista de contactos. De algum jeito, olhou para aquele número do irmão loiro que nunca tivera coragem de apagar e mandou uma última mensagem. Provavelmente Sabo nunca a veria, talvez até ficasse feliz por deixar de ter o irmão empecilho andando por aí. Recebeu uma nova chamada, agora de Zoro e não de um número desconhecido como até ali e sorriu. Ah sim, que saudades dos amigos. Daqueles que não queria preocupar, que não tinham de arcar com os seus problemas naquele momento e que - pensava Luffy - talvez não ficassem tão mal assim sem ele por perto. Afinal, passaram meio ano sem se falar, ele via diariamente fotos nas redes sociais onde cada um estava feliz vivendo do seu jeito, do mesmo modo que ele se arriscara a fazer. E agora que perdera o motivo para continuar nessa mesma vida, não tinha de tirar o sorriso dos outros. Bastava reencontrar o motivo do seu.

Fechou os olhos e sentiu o corpo pesar. Tirou o casaco de Law que ainda tinha vestido apenas para sentir, uma ultima vez, aquele aroma do namorado agora mais fraco, que ainda se encontrava entranhado no tecido.

- Estou indo ver você, Torao - murmurou com o primeiro sorriso que conseguira dar desde aquele dia. Se lembrou, uma última vez da sensação de ser abraçado pelo maior e finalmente, deu o impulso de que o corpo precisava para cair daquela ponte, lançando-se para a frente e chocando com a água do rio em baixo de si. Aos poucos, sentiu a aflição da falta de oxigênio, a água entrar pela boca e pelo nariz em direção aos pulmões, o sentimento de sufoco que o fez agoniar durante alguns longos segundos antes de fechar os olhos para ter um último deslumbre do que foi a sua vida.

"Ah é, talvez o Ace esteja lá também" - lembrou-se o menor antes de os seus olhos pesarem num último suspiro, agora, para não voltarem a abrir.

Antes do último suspiroOnde histórias criam vida. Descubra agora