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Maratona 6/7

Levo alguns segundos para me situar, e ela grita outra vez.
Merda.
Lili.

Pulo da cama, com a adrenalina deixando todos os meus sentidos alertas.
Acendo a luz do corredor e entro de uma vez no quarto dela. Lili está
sentada na cama. Ela vira abruptamente a cabeça diante do ruídoe da luz, os
olhos desesperados de terror.
Então abre a boca para gritar de novo.

- Lili, sou eu, Cole.
Suas palavras saem atropeladas:
- Ndihmë. Erësirë. Shumë errësirë. Shumë errësirë!
O quê?

Eu me sento ao seu lado na cama e ela se joga em cima de mim, quase me
derrubando, e passa os braços ao redor do meu pescoço.
- Ei.
Eu a tranquilizo quando recupero o equilibrio, e a abraço, acariciando seu
cabelo.

- Errësirë. Shumë errësirë. Shumë errësirë - sussurra ela sem parar, agarrada
a mim, tremendo como um potrinho recém-nascido.

- Inglês. Em inglês.
- O escuro - murmura no meu pescoço. - Odeio o escuro. E muito escuro aqui.

Ah, porra, ainda bem.
Eu já tinha imaginado diversos cenários de horror e estava pronto para lutar
contra quantos monstros fosse necessário, mas relaxo diante de suas palavras.
Mantendo um braço em volta dela, eu me debruço e acendo a luz da cabeceira.

- Melhor? - pergunto, mas ela não me solta. - Está tudo bem. Está tudo bem. Eu estou aqui - repito várias vezes. Passados alguns minutos, ela para de tremer e seu corpo relaxa. Ela recosta na cama e seus olhos encontram os meus.

- Me desculpe - sussurra ela.
- Shh. Não se preocupe. Estou aqui.
Lili olha para o meu peito e um rubor lento colore suas bochechas.

- É, eu costumo dormir pelado. Considere-se sortuda por eu ter vestido minha calça - brinco. A boca dela relaxa.

- Eu sei - diz, me olhando por baixo dos seus cilios compridos.
- Sabe?
- Sim. Vocêê dorme pelado.
- Você já me viu?
- Já.
O sorriso dela é inesperado.
- Bem, não sei o que achar disso.

Fico satisfeito que o terror que Lili sentiu no escuro tenha passado, mas ela continua olhando ao redor do cômodo com ansiedade.

- Desculpe. Não quis acordar você - diz ela. - Estava assustada.
- Foi um pesadelo?
Ela assente.
-E quando abro os olhos e está... está tão escuro...- Ela estremece. Não sabia se estava sonhando ou acordada.

- Acho que isso faria qualquer um gritar. Aqui não é como em Londres. Não tem poluição luminosa em Trevethick. O escuro aqui é... escuro.
- Sim. Como o... - Ela se interrompe e estremece com repugnância.
-Como o que?- sussurro.

O humor e a provocação em seus olhos sumiram, substituídos por uma
expressão atormentada e tensa. Virando o rosto, ela olha para o próprio colo.
Esfrego suas costas quando ela fica em silêncio.

-Me conte - peço.
- No... Como se diz? Kamion... Caminhão. No caminhão - continua ela, subitamente inspirada.
Engulo em seco.
- Caminhão?
- Sim. Que nos trouxe à lnglaterra. Era de metal. Como uma caixa. E escuro. E frio. E o cheiro..
E quase impossível ouvir o que ela diz.

-Cacete - digo baixinho e a abraço de novo.
Ela parece mais relutante em me abraçar desta vez, provavelmente porque estou sem camisa, mas não vou deixar que lide sozinha com esses pesadelos horrorosos. Em um movimento ágil, fico de pé, ainda a segurando contra o meu peito.
Ela prende a respiração, surpresa.

- Acho que é melhor você dormir comigo.

Sem aguardar a resposta, eu a levo até meu quarto, acendo as luzes e a faço
sentar no chão ao lado do closet. Lá dentro, pego a camisa do pijama e entrego
a ela. Aponto para o banheiro.

Mister | SprousehartOnde histórias criam vida. Descubra agora