A primeira neve

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Felix Lee Yongbok era um garoto peculiar.

Com seu rosto moreno decorado por sardas, seus lábios em formato de coração e sua voz grave totalmente divergente ao pequeno e angelical rosto que portava. E ainda assim, era a pessoa mais brilhante e divertida que qualquer um já teve o prazer de conhecer. Nascido em Melbourne, na Austrália, o garoto tinha um imenso amor pelo verão e os dias mais quentes do ano, por isso era totalmente compreensível, ao menos em sua visão, o seu mau humor rotineiro nos dias gelados do inverno coreano.

Faziam praticamente cinco meses que havia se mudado para Seoul (não que ele estivesse contando, pff!), e para piorar ele havia chegado justamente no meio do outono, enquanto os dias gradativamente perdiam o calor e as cores, iniciando aquele período do ano que ele tanto odiava. O preto e branco sem graça do inverno.

Sair de seu país natal e ir morar em um local com cultura, idioma e clima tão diferentes do que estava acostumado era um ato de extrema bravura, principalmente para o Lee, que possuía um grande apreço por uma rotina. Mas não havia nada que ele não faria para alcançar o seu sonho de ser um artista plástico conhecido, e quando recebeu um convite da maior academia de Belas Artes da Coreia do Sul, foi quase instantâneo aceitar sem mal cogitar os contratempos que teria ali.

Era uma pessoa sociável e simpática, sua gentileza conquistava mais as pessoas que o conhecia do que sua aparência, e ele gostava disso em si. Os amigos verdadeiros, que naquele pouco tempo havia criado, eram de longe as pessoas mais importantes que ele tinha, tanto que não foi surpreendente nem para sua mãe, quando anunciou que iria morar com Chan e Hyunjin, seus melhores amigos, para poupar dinheiro no aluguel e nas contas do apartamento.

Porém ainda assim, mesmo sendo uma pessoa tão gentil, calorosa e compreensiva, Felix tinha seus dias ruins, e esses eram marcados no calendário. No período de dezembro até março, Felix não era Felix, era algum gêmeo do mal que se apossava de sua identidade e espalhava todo o mau humor existente na terra por aí. Tudo isso porque ele odiava muito os dias frios.

Então obviamente que foi surpreendente para o casal de amigos e colegas de apartamento ver o Lee entrando na cafeteria de Seungmin com o maior e mais brilhante sorriso que já havia esboçado em solo coreano, com os cabelos ruivos acobreados totalmente desgrenhados pelo vento congelante e o rosto avermelhado pela mesma razão.

— Oi, Seung! Você pode me trazer uma xícara de café, tá um frio horrível lá fora.

Pediu gentilmente colocando a bolsa de materiais de pintura sobre o balcão e se livrando do enorme cachecol listrado que usava, aquele enorme sorriso desconcertando aos três amigos. Seungmin gaguejou algo incoerente, que soou como algo afirmativo, e correu aos tropeços para a cozinha. Já Hyunjin e Chan conversavam com olhares enquanto bebericavam as bebidas fumegantes que pediram antecipadamente.

— Algum problema? — Felix perguntou, o tom de voz mais baixo apaziguando o coração do mais velho. De volta à normalidade...

Ou não, já que quando encarou o ruivo ele ainda tinha um sorriso largo estampado nos lábios bem desenhados.

— Você tá bem, Lix?

A pergunta veio de Hyunjin, que ainda foi além ao colocar as costas de sua mão sobre a testa fria do Lee, com uma expressão levemente preocupada. Felix apenas riu e agradeceu quando o Kim colocou a xícara com a bebida quente à sua frente.

— Eu tô legal, gente... É sério Chan. — garantiu ao ver o olhar incrédulo do mais velho.

— Então qual a do sorriso?

— Eu não posso ficar feliz?!

Chan revirou os olhos quando o sorriso do mais novo aumentou, Hyunjin não tinha muitas reações senão olhar seu namorado com uma careta de "eu seguro e você liga pro terapeuta", mas Seungmin o cutucou discreto e logo apontou para o termômetro local, anunciando o dia mais frio daquele ano com 9° C. E Felix apenas assentiu bebericando com cuidado o café já adoçado.

AO SOM DO PIANOOnde histórias criam vida. Descubra agora