Twitter for Inimigos

1/3 - Amigo do Inimigo

Apesar do Sol estar brilhando e o céu estar totalmente azul, as telas dos celulares mostravam a média de 24°, uma temperatura relativamente baixa, típica da estação de outono. A brisa gelada soprava no rosto de Twitter for Android, deixando os cachos balançarem contra o vento.

Ele estava dando uma volta na rua, apreciando a própria liberdade - no fundo, estava torcendo para que ninguém tirasse uma foto sua com a legenda ´liberdade ou solidão', pois ele mesmo não compreendia o próprio estado de espírito. O Tumblr já dizia: estar sozinho é bom. O ruim é se sentir sozinho.

Mesmo com todos os pesares, sua maior dúvida era se compraria um açaí ou uma coquinha geladinha. A mão deslizou até o bolso da bermuda, procurando o celular para que pudesse ligar para o amigo iFood. O colega com certeza ofereceria um cupom para ele.
A busca pelo eletrônico foi interrompida quando Twitter for Android ouviu uma risada ecoar.

Aquela risada. Aquela maldita risada.

Ele conhecia o exato timbre daquele gargalhar e sabia a quem pertencia mesmo antes de ver. Inclinou a cabeça para o lado e encarou, o olhar fulminante. Era Twitter for iPhone.

O inimigo estava se aproximando a passos largos, acompanhado do Instagram. Eles eram íntimos e pertenciam a um squad do qual Twitter for Android não fazia parte: o grupo dos efeitos do Instagram, que sempre excluíam o Android.

Por algum motivo, o estômago de Twitter for Android sempre doía quando ele via Twitter for iPhone. Concluiu-se que era o ódio que ele sentia pelo outro.

Ele não podia ver Twitter for iPhone se aproximar sem tentar rebaixá-lo. Era um jogo entre eles; um jogo silencioso, sem regras e sem motivo, um jogo sem vencedores. Mas, admitia, era um jogo muito divertido.
Pigarreou para chamar a atenção do inimigo e avançou, se aproximando rapidamente.

— Cadê a sua header transparente, oh maçãzinha? — Em um segundo, Twitter for Android estava do lado de Twitter for iPhone, a mão indo até a cabeça dele e revirando o cabelo prateado.

Mesmo que não tivessem tanta intimidade, aquele gesto de bagunçar os cabelos do outro era instintivo, quase normalizado. Havia algo satisfatório em ver Twitter for iPhone grunhir de raiva.

— Não sei, cadê sua câmera de qualidade? — Twitter for iPhone retrucou, a voz saindo desafinada, graças a irritação causada pelo rival.

Bingo. Twitter for Android havia conseguido alcançar o seu objetivo. Ver aquele olhar de Twitter for iPhone. Quando ele estava com raiva, sempre aparecia um risco entre as sobrancelhas prateadas, devido ao cenho franzido. Isso, mais o fato de que Twitter for iPhone era bons centímetros mais baixo do que Android, era como ver um patinho de pelúcia segurando uma faquinha. Ou como um pinscher.

Twitter for Android desviou os olhos para o Instagram, que observava tudo aquilo. Fez um gesto imponente com o queixo, pedindo para a rede social sair de perto.

— Ei, vai chamar uma ambulância, a bateria do seu amigo aqui tá baixa. Ele vai desmaiar daqui a pouco.

De fato, desmaios vindo de iPhone’s eram comuns, graças a bateria viciada. Mas Android havia falado aquilo apenas para tirar o Instagram do campo. O Instagram era ardiloso - o famoso topa tudo por likes - e, a qualquer momento, poderia divulgar tudo em um perfil de fofocas.

Estavam sozinhos agora, os dois inimigos.

— Ô verdinho, você sabe que a minha bateria melhorou muito após as últimas atualizações…

Twitter for iPhone ainda estava tentando revidar as provocações do outro. Mal sabia ele que Android nunca desistia de uma briga. A missão do ‘verdinho’ na Terra era justamente fazer de tudo para ver aquela expressão de falsa irritação em iPhone.

— Vai peitar? Abre o Snapchat e o TikTok aí por cinco minutos então.

Os aplicativos citados eram os campeões em esgotar a bateria na maioria dos sistemas operacionais. Tanto que, ao ouvir o nome deles, iPhone soltou um arrepio e negou com a cabeça. A desistência dele fez Android abrir um sorriso largo.

— Então, eu venci. — Android ergueu as sobrancelhas, o ego estando mais inflado do que nunca. Aquilo foi a gota d'água para o iPhone, que elevou o tom de voz;

— Escuta aqui, enquanto eu estiver vivo, você nunca vai vencer a nossa rinha de celul…

O filho de Steve Jobs estava realmente estressado, as bochechas assumindo um tom rubro e o dedo apontado para o peito de Android. Talvez tivessem passado dos limites.

Fato era que Twitter for Android não se deixou abalar. Não abandonou, nem por um minuto, a expressão sorridente. Sua resistência fez o iPhone vacilar e engolir em seco, como se tivesse esquecido do que ia dizer.

Óbvio que a constatação de que se aproximaram demais em algum momento, e agora, os dois estavam quase compartilhando a respiração, os rostos a menos de um palmo de distância fez iPhone perder totalmente a postura.

Os sentimentos da maçã estavam dispersos. Se o Android o odiava, ele não tinha o menor direito de ser tão atraente enquanto estavam em uma discussão séria. As covinhas eram claramente projetadas para distrair qualquer um que tentasse ofender o robozinho do Android.

O silêncio se prolongou até ser claramente desconfortável e ambos pareciam ter congelado. Sem pensar, Android curvou a cabeça, permitindo que o próprio nariz tocasse o de iPhone quando ele se abaixou. E um grito cortou o ar.

Os dois deram um pulo e se afastaram rapidamente, procurando a origem do grito. Uma muvuca havia se formado poucos metros à frente deles. Felizmente, ninguém havia reparado no estranho momento que havia acontecido entre o Android e o filho de Steve Jobs.

— O que está acontecendo? — Perguntou o Android para o Kwai, que estava totalmente alheio à confusão, cantando dançando o pé faz assim mãozinha pro ar balança o pescoço pra lá e pra cá.

— Ali? O WhatsApp caiu. Acho que ele não funciona mais em nenhum sistema. Toma. — Ao final da explicação, Kwai estendeu a mão e entregou algo para o Android, antes de sair de perto.

Android abriu a mão. O que o Kwai havia dado para ele era uma KwaiGold; a moedinha dourada jazia inutilizada na mão dele.

Esquecendo-se da própria briga, Android e iPhone trocaram um longo olhar, repleto de confusão e medo, temendo pela vida do grande amigo.

— E agora? Sem o WhatsApp não somos nada.