Capítulo único

1.1K 96 182
                                    

Kenma estava tendo um dia péssimo.

Sempre amou sextas-feiras, era o dia que tinha as aulas mais fáceis logo de manhã e ainda eram poucas, depois tirava a tarde para fazer as lives jogando que tanto gostava e ainda passava uma noite tranquila ao lado do namorado. Nunca imaginou que terminaria esse dia tão amado chorando e arranhando-se (uma reação comum que ele tinha em relação a disforia).



Tudo começou logo cedo quando notou que não poderia usar binder hoje ao ir para a faculdade, havia usado aquela peça durante os outros dia da semana, evitando ao máximo não ultrapassar o limite de 8 horas diárias, sabia dos lados negativos de usar um binder, era sempre bom ficar dias sem, e nesse final de semana terá um reencontro com os amigos do ensino médio, não poderia não usar binder. E além de tudo isso, ele também planejava fazer uma mastectomia (só faltava o dinheiro), e usar binder constantemente afeta a a elasticidade da pele podendo ter impactos cirúrgicos. Colocou seu top esportivo e uma camiseta preta fina de mangas compridas, o pior é que sem a adorada peça de roupa que foi deixada de lado hoje, era perceptível certo volume no busto quando olhado de lado, vestiu a calça jeans branca (com o *packer por baixo, obviamente) e um tênis vermelho qualquer.

Depois que ganhou seu primeiro binder do Tetsurou há 3 anos, nunca mais foi a faculdade sem, ele sabia que tinha pessoas transfóbicas por lá, quando estava usando binder as piadinhas e provocações direcionadas a si diminuíam. Derrotado e extremamente incomodado foi a escola, sem antes, deixar um recado escrito em post-it na geladeira para Kuroo ler quando acordar.

O que previa aconteceu. Alguns marmanjos fizeram piadas sobre ele entre si e nem fizeram questão de falarem baixo para o loiro não ouvir.

As aulas dele acabaram um pouco antes do meio-dia, mandou mensagem para o namorado assim que pôde, perguntando se poderiam almoçar juntos na faculdade ou em algum lugar por perto, recebeu uma mensagem negando, pois o moreno estava acabando de almoçar e iria direto para a casa de um dos colegas, eles tinham um trabalho para entregar e sequer começaram. Riu sozinho, não era muito típico dele deixar as coisas para última hora, mas quando se tratava de trabalhos em grupos, Kuroo procrastinava até o limite.

Kenma foi para o apartamento que dividia com Tetsurou almoçar, triste por não ter a desejada companhia do amado. E pra piorar, queimou a carne que estava fritando para comer e no fim derrubou o copo de vidro cheio de suco no chão. Ele não era desajeitado, mas estava com a cabeça nas nuvens devido a péssima manhã que teve. Odiava aquelas provocações, o lembravam da época de seu ensino médio e fundamental, adiquiriu vários traumas daquele período, o bom é que também conheceu pessoas incríveis como Kuroo, Hinata, e outros amigos da escola.

Não demorou muito, e lá estava ele em frente ao computador arrumando tudo o que precisava pois iniciaria sua live em alguns minutos. E especialmente hoje, subiu um pouco sua câmera, ela pegava do busto para cima, e como não estava com o típico binder evitou aquele enquadramento. Estava prestes a abrir a live quando ouviu o celular tocando, era um número desconhecido, o mesmo número que ligou no dia anterior, não atendeu antes porque se não era ninguém da sua lista de contatos não tinha importância para si. Porém, naquele instante decidiu atender, a pessoa ligou novamente, poderia ser algum conhecido que pegou seu número com alguém e está precisando de algo.

– Alô?

— [deadname] Kozume! Ah quanto tempo, querida.

Kenma tremeu. Faz de 3 anos que não ouvia a voz de sua mãe.

Com 15 anos se descobriu como homem trans e pansexual, foi na mesma época que decidiu contar aos seus pais seu verdadeiro gênero, foi um dos piores dias da sua vida. Tudo que ouviu naquela sala e as agressões físicas que sofreu por parte da mãe ainda o marcam. Respirou fundo prestes a chorar. Desde então teve uma relação péssima com os pais, e piorou quando descobriram seu namoro com Tetsurou aos 16 anos. Assim que terminou a escola foi expulso de casa, cortou todos os laços com os familiares e foi estudar em outra cidade com o namorado.

Apenas um dia ruimOnde histórias criam vida. Descubra agora