Estava escuro na sala de estar dos Danvers. Sendo madrugada, a vizinhança não esperaria coisa diferente. O que ninguém esperaria ver, contudo, era o pequenino rastro de fumaça cinza a se formar próximo ao sofá. Ela dançava, desfazia-se e se rearranjava, tomando força em sua forma conforme os segundos se passavam. Enfim, a conexão se estabeleceu, e o autor daquele feitiço pôde ter ciência de seus arredores.
— Donald? — John Danvers ouviu o chamado esperançoso, porém fraco. Ele usou de sua força de vontade para mover suas ondas de fumaça, até que pudesse ver a dona daquela voz.
A mulher estava sentada próxima à janela fechada pelas grossas cortinas. A fofa poltrona em que estava não se amassava com seu peso inexistente. O olhar vidrado vasculhava a escuridão. Sua silhueta era fraca, quase tão esfumaçada quando o feitiço Nutius Nubes de John. O garoto, apesar de estar fisicamente longe, muito longe em Hogwarts, manteve-se parado e quieto.
Então, ele chegou na sala num rompante, usando um de seus muitos nomes e rostos. Prontamente se dirigiu a um espelho no canto daquele cômodo. Entre caretas macabras e abanos raivosos de varinha, Iohan lutava para desfazer a transfiguração em sua face. John preferiu ainda não alardear sua presença. Se o bruxo se escondia com o rosto de Donald Danvers, se ele convocara aquela mulher...
O pânico afogou os pensamentos de John, quase desfazendo a conexão de seu feitiço. Então, de alguma forma, aquela ladainha que Rose Weasley e Lia Hughes haviam contado era verdade? A Ordem tinha mesmo um plano para cercar Iohan? Mas como...?
— Você não é Donald. — As palavras fundas e sem emoção ressoaram na sala e trouxeram John de volta ao presente.
A mulher, sentada e fria, tinha os olhos vidrados fixos no bruxo na sala. O corpo, suas roupas, sua frágil imagem desbotava por completo ao inclinar-se para frente, tal qual quisesse se levantar em hostilidade contra Iohan. Porém, ela não conseguia. Sem cor, aos poucos perdendo a solidez, a mulher retesava. Lutava contra uma força que John não podia ver,mas que a mantinha presa na poltrona. Presa naquele apartamento.
— Você não é Donald — ela repetiu com mais força. Iohan sequer reagiu.
John ficou tentado a desfazer seu Nuntius Nubes, a desistir do relatório de Iohan. Voltar sua consciência para o túnel escuro de Hogwarts em que seu corpo se escondia, a fim de evitar aquela cena. O menino já sabia o que aconteceria. Desde que tinha memórias de sua vida, ele já sabia.
Como uma velha lâmpada trouxa que John tanto via naquelas ruas londrinas, a imagem da mulher retesada na poltrona piscava. Alternando-se com sua aparência normal, outra surgia. Veias roxas, cinzas e pretas por todo o corpo. Os olhos cegos e esbranquiçados. Ela inclinada para frente em dor, tentando se levantar, tentando falar, tentando gritar.
A fraca fumaça de John tremelicou em desconforto, mas ele não conseguia desviar seu olhar petrificado. A mulher se debatia em si mesma, contida, agonizando. Iohan, ainda em frente ao espelho, sequer fez contato visual ao finalizar a situação. Impacientemente se interrompeu, a fim de apontar a varinha para a mulher. Não conseguindo se impedir, John disse, melancólico:
— Tchau, Joane.
John não sabia o porquê, mas aquilo a deixava feliz. Antes de sumir completamente com o feitiço de Iohan, ela pôde ouvir seu nome. A tensão de seu rosto cego e permeado por veias escuras relaxou numa expiração. Joane Danvers se desfez como poeira ao vento, estampando um sorriso quase aliviado.
Inabalado, Iohan analisava suas faces no espelho, certificando-se de que nada de Donald Danvers permanecia. John, através de seu feitiço, encarou o reflexo do verdadeiro rosto do bruxo. No túnel em Hogwarts, o menino tinha ciência do suor nervoso que descia de suas costas, a taquicardia maltratando seu peito.
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O Invasor de Hogwarts - ano 1
FanficAlvo Potter e Rose Weasley chegaram à Hogwarts. Era um ano letivo comum, ou o mais comum que se poderia ter numa escola de magia. Porém, quando os primos e seus amigos se embrenharam na Floresta Proibida, tudo virou de ponta-cabeça. Quem era aquele...