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Explosões, raios e gritos eram o que eu ouvia ao fundo. Tentava descansar, mas a dor latejante do meu olho direito era insuportável, (perdi meu olho alguns dias atrás, graças a uma ninfa da água que jorrou um jato de água do mar, com pedaços de corais pontiagudos em minha direção, não consegui desviar tão rápido e meu olho direito fora atingido), mas não tão insuportável quanto a dor de um coração partido.

"Tudo isso é por ti, Catarina." Pensei melancólico, lembrando da mulher que deixou-me para trás.

- Camões!!! Precisamos de você, nossa proa foi atacada!

- De nada me importa. Se não posso ver minha doce Catarina. - Debruçei-me em papéis em branco segurando o fim de uma garrafa de rum.

O homem forçou-me a levantar, mas cambaleei e caí, desolado no chão, apenas sentido as ondas atingirem violentamente o navio em que estávamos.

- Nem sei porque motivos eu ainda tento. - O homem saiu rapidamente, deixando-me sozinho.

Peguei uma folha amarela que estava caída ao meu lado. Respiro fundo e vejo o que estaria por vir.

" Estantes cheias de grossos e antigos livros, uma espécie de vela sem fogo, pendurada no teto de um grande recinto. Estranhei a visão, mas continuei percorrendo com os olhos. A imagem era enevoada, mas realista. Várias pessoas estavam sentadas em grandes mesas de madeira, com vestimentas estranhas e até vulgares (apenas duas peças de roupa no corpo).

- Não acredito que ele fez isso. Não é possível. - Começou uma mulher de aparência nova.

- Mas é. Olha só isso aqui. - Um rapaz apontou para um dos livros abertos na mesa.

- Camões não pode ter feito isso.

- Mas fez. Camões era um sofredor, como todos os outros escritores da época. - Respondeu outro rapaz.

Me aproximei vagarosamente, estranhando falarem meu nome. A curiosidade me invadiu, inclinei-me até uma posição favorável para ver as páginas apontadas.
Páginas com uma língua estranha. Diferente da que nos comunicávamos no reino.
Reconheci algumas frases e palavras.
Português, minha língua materna.

- Todos seus escritos... ou quase todos eram para sua amada. - Disse uma jovem suspirando e fechando os livros.

Milhões de pensamentos e frases invadiram minha mente. Sabia que era o fim da visão. A imagem dos jovens foi se afastando e se tornando turva."

Abri meus olhos e estranhei a baixa luz do navio.
Levantei-me apressado ainda levemente entorpecido pela bebida.
Sentei-me em um barrio. Peguei a folha amarelada, molhei na pena com tinta que estava em um pequeno baú e comecei a escrever tudo o que vi até aquele dia naquela língua estranha, mas familiar para mim.

Escrevi sobre minha vida, pensamentos, ilusões...

"Catarina chamaria-me de louco."

Mas sabia que alguém leria... não neste tempo.

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