Eu acordei. Passei meus olhos pelo local em que eu estava e não o reconheci. Logo percebo que estou no chão, e não onde eu dormi na noite passada. Lembro-me de tudo, e todos os detalhes do meu quarto. Lembro-me de ter chorado muito a noite, e de ter, pela primeira, vez deixado minha cachorrinha, Penny, dormir em minha cama. Ela era um dálmata, eu estava com ela há apenas um ano. Lembro-me de minha mãe ter ido para a minha casa, para ficar comigo durante uns dias. Mas há algo de que eu não consigo me lembrar... quem sou eu?
Eu me lembro de que no dia anterior eu havia ido ao parque, e vi uma cena nada agradável: um homem coberto de sangue rindo para um cara ensaguentado caído no chão. Aquilo me fez chorar e vomitar horrores porque jamais havia visto ninguém olhar e rir de maneira tão psicótica a um corpo quase morto, mas... quem sou eu?
Agora, passei os olhos pela sala escura que eu estava novamente e pude ver com clareza uma porta, a qual eu, estranhamente, não havia visto antes. Levantei e caminhei com uma certa insegurança até ela. A abri e, em seguida, dei de cara com um vidro enorme - aparentava ser um espelho -, mas eu não conseguia ver o meu reflexo, o que era estranho, pois eu conseguia me ver. Conseguia ver minhas mãos, pernas e corpo, e me sentia perfeitamente bem. "Será que eu morri?", pensei. Achava que não, mas no momento eu não tinha certeza de absolutamente nada. Toquei lentamente o espelho com meu dedo indicador, sem saber realmente o que queria com isso, e me surpreendi ao vê-lo ligar magicamente, como um grande aparelho celular. Analisei a imagem que aquela "coisa" me proporcionou com calma. Era um quarto. Paredes azul claras, uma janela com uma cortina florida e teto cheio de adesivos de estrelas. E na cama, sob um edredom bagunçado da cor verde escura, estava eu.
Tinha penny pulando desesperadamente em cima do meu corpo, mas eu não mexia sequer um músculo. Mexia-me sem parar, a fim de fazer com que meu corpo naquele quarto demonstrasse algum sinal de vida, mas nada acontecia. Nesse momento, não tinha nenhum controle. Pude ver minha mãe adentrando desesperada com um copo de água em mãos e jogando o líquido em mim mas, como esperado, nada aconteceu. Ela tomou seu celular em mãos e discou um número desconhecido; eu não escutava sua voz, mas sabia, com certeza, que ela estava gritando com quem quer que estivesse na outra linha. Com receio, toquei mais uma vez no espelho, e só aí percebi que era um video. Avancei alguns minutos e me vi no hospital. Um equipamento estranho cobria a minha boca, meus batimentos eram normais e minha mãe dormia na poltrona ao lado de minha cama.
"O que é isso? O que está acontecendo? Por que isso está acontecendo comigo? Onde eu estou? Quem sou eu, afinal?", perguntei-me, esperando que as minhas preces fossem ouvidas e todas as minhas dúvidas fossem tiradas. Certamente, nada aconteceu. Por um momento pensei em ser um sonho mas, tudo parecia ser tão real. Pensei também que poderia ser uma outra dimensão ou realidade, talvez? Mas, coisas assim não deveriam acontecer do nada, não é?
Voltei em passos lentos para a sala e fechei a porta. Me sentia vazia, fraca. Felizmente, ou infelizmente, nada me impedia de continuar pensando ou agindo. Apesar de não saber onde estava, eu, de certa forma, me sentia segura. Eu não estava com medo.
Deitei-me no chão novamente, respirei fundo e fechei os olhos, na esperançosa tentativa de dormir e acordar no lugar onde eu pertencia. Não aconteceu. Abri novamente meus olhos e ainda estava naquela sala. Suspirei frustrada e caminhei até a porta: " Talvez tenha algo atrás desse maldito espelho", disse. Lentamente, abri a porta, e o "espelho" havia sumido. Agora, conseguia ver um longo corredor e, ao fim, uma escada. O lugar era bonito, parecia ser uma construção antiga. Havia madeira escura e uns toques de azul marinho complementando as paredes daquele corredor. Caminhei até a escada e a desci, insegura com o que poderia estar me aguardando ao fim dela. Parei de frente ao que parecia ser a porta de saída do local, e, na esquerda, pude ver uma sala bem grande. Havia uma mesa de centro com dois sofás a rodeando, um em cada lado daquela enorme sala, e na frente da mesa, paralelo a mim, uma lareira. Atrás de um dos sofás, havia algo que parecia ser um "bar" particular. Eu, exatamente no centro da sala, olhei ao outro lado, e pude ver com clareza um quadro bem grande. Tombei minha cabeça ao ver a imagem de um homem bem vestido e arregalei os olhos ao ver que eu reconhecia sua face. Era ele. O homem que eu havia visto rindo de maneira tão psicótica e amedrontadora estava em um quadro, bem na minha frente.
— Ah, oi! A festa é só amanhã a noite! Mas você não me parece vestida adequadamente... – ditou uma voz forte e rouca atrás de mim. Por alguns segundos, meu corpo congelou com a pequena possibilidade de ser o homem do quadro. Lentamente, me virei, e lá estava ele, vestido em um terno preto, com os cabelos escuros levemente molhados e um dos botões do terno aberto. — Espere... você não é alguém que eu convidei, é? – Ele me lançou um olhar penetrante e indecifrável, mas eu não o temi.
— Hmm, acredito que não... –, eu disse, recebendo como resposta os olhos semicerrados em minha direção.
— E eu sequer conheço você? –, ele se aproxima, mas eu permaneço imóvel. Em resposta a pergunta, apenas movimento negativamente a cabeça. — Então quem é você, e o que está fazendo na minha casa?
— Minha resposta para as suas duas perguntas é: eu não sei! –, respondi com sinceridade, o que apenas o deixou mais confuso. — Eu sei que pode parecer maluquice, mas eu acordei aqui! Em um quarto, no final do corredor. –, ele acenou positivamente com a cabeça, parecendo saber do que eu estava falando.
— Olha, o quarto que você está falando é o meu quarto! Eu estive nele até agora, e não me lembro de ter te visto lá. – ele pega seu celular e passa os dedos impacientemente pela tela. — Você deve ter bebido muito, garota! – ele riu. — Mas, de qualquer modo, você deve estar perdida, não é? Me diz o seu nome completo. Eu tenho alguns amigos na polícia, eles podem te ajudar a encontrar sua casa e... sei lá, sua família.
— Eu... eu não sei o meu nome... –, ele me olha confuso. — Como eu disse, eu acordei aqui! Do nada... não me lembro quem sou. – Ele suspirou e jogou o celular no sofa, caminhando até o "bar".
— Sendo assim, não posso fazer nada por você no momento! Está com sede? –, ele pergunta após retirar de um freezer duas garrafas de o que aparentava ser refrigerante e dois copos.
— Como eu posso ter certeza que você não vai me envenenar? –, falo seriamente e ele me encara, logo virando-se totalmente a mim e apoiando os cotovelos no mesmo balcão em que havia colocado as bebidas.
— Quem apareceu na minha casa do nada foi você! –, disse ele com ênfase no "minha". — E outra, normalmente, você, a estranha, me mataria! Não eu. Mas se não quiser aceitar, eu entendo. Imagino que você não tenha onde ficar, não é? –, ele tomou seu copo em mãos e se dirigiu até mim. Finalmente, parei para observá-lo. Seu cabelo era escuro, e a pele bem e rosada. Parecia ter um corpo definido, e seu rosto era perfeitamente formado, com traços finos e a mandíbula marcada. Seus olhos tinham cor de mel; era como se brilhassem a luz do Sol que batia levemente em seu rosto.
— Não... não tenho. – ele me observou cuidadosamente e fez um sinal para que eu o seguisse. E eu o fiz.
— Pode ficar nesse quarto aí! Era da minha irmã, então imagino que tenha algumas roupas que caibam em você. O banheiro é naquela porta. Não sinta-se tão em casa! Vou te deixar ficar porque não sou um monstro paea deixar você sair em uma cidade quando você não sabe nem o próprio nome! Mas, você ainda é uma estranha. –, ele diz e eu apenas concordo com a cabeça, o achando um tanto simpático demais, mas não ouso reclamar já que, seria bem difícil sair daquela casa sem nem saber que horas são. — Eu vou falar com os meus amigos policiais e ver o que eles podem fazer, certo? E nesse meio tempo, penso em um nome pra você!
— Certo. e... muito obrigada! Você está sendo muito gentil comigo... mesmo eu tendo, de certa forma, "invadido" a sua casa e a sua privacidade. – o vi parar na porta e me encarar.
— Nah! Não precisa me agradecer. E, aliás, meu nome é Robert! –, ele ditou antes de me deixar sozinha no quarto.
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Lost in somewhere
Mystery / Thriller⚠️pode conter gatilho⚠️ De repente, ela acordou. Não conseguia lembrar-se quem era, nem o que havia feito para chegar onde chegou. Mas ele se lembrava até dos mínimos detalhes com perfeição. Afinal, todos nós faríamos loucuras sem pensar por aqueles...