— Acho que não deveríamos estar aqui, Eliza, tá muito frio, choveu hoje e eu ainda queria chegar a tempo de tomar meu açaí antes que acabe.
— Fica tranquila, Cris, a mamãe vai guardar um pouco pra você, agora continua andando. Eu disse pra trazer a jaqueta. Onde já se viu? Sentir frio em Belém?! Mas enfim, minha irmã gosta de ser a diferentona do pedaço.
– Égua, mas tu gosta de encher meu saco mesmo, não sei nem o porquê ainda venho contigo, já que eu vou ficar de canto toda vez enquanto tu se diverte.
– Já disse, é só tu ires no fluxo, não te empolga muito mas não fica lá, paradona.
Era sempre difícil para Cristina acompanhar a irmã gêmea na escola de seu namorado, onde sempre ficava de canto, sem saber nem em que direção olhar. Sem contar nos meninos cheirando a suor que se aproximavam só para perguntar aquilo que ela mais odiava no mundo por ser tão óbvio.
– Vocês são irmãs? Sério que ela é tua gêmea?
A vontade que ela tinha de dizer "Porra, tu não estás vendo?" Era enorme, mas ela não tinha coragem. A verdade é que, diferente de Eliza, Cris era uma menina de 17 anos muito tímida que, por mais que sentissse as mesmas coisas das meninas de sua idade, ainda se guardava muito, pois não tinha, nem de longe, a mesma popularidade da irmã, cresceu quase como uma sombra dela. E a culpa disso tudo não era de ninguém, afinal ninguém tem culpa de ser extrovertido e interagir (o mesmo serve para quem é o contrário, como Cristina).
Pelo menos tinha encontrado um lazer que a animava muito quando esperava sua irmã terminar a pegação dela com Danilo, o grande jovem candidato a futuro advogado. Em meio a uma escola repleta de gente escrota que olhava o outro como se tivesse alguma doença contagiosa, havia um menino que, em uma das várias manhãs de pegação naquela Alcindo Cacela de Eliza, fazia Cristina transcorrer o tempo mais rapidamente.
Gustavo era aquele maluco bem estabanado, mas não, não pense que ele era atrapalhado por causa disso. No máximo ele tropeçava em alguém e depois voltava para implorar desculpas. Numa dessas ele acabou pisando no pé de Cristina. Bom, pelo menos aquilo rendeu uma conversa, introduzida com alguns palavrões e caretas, mas foi uma conversa.
– Sim, porra, tu não estás me vendo aqui não? – a expressão era como se ela fosse matar ele com o olhar.
Ele nunca fora um rapaz de responder qualquer tipo de insulto, não sabia se por medo ou por educação.
– Perdão, moça, eu estava atrasado para voltar à aula e passei rápido, não vi que estavas aqui. Por sinal, não lembro de você. Não estudas aqui, não é? — ele, mesmo com todo o interesse de saber onde estava o rosto da água-viva que o professor falara antes do intervalo, se prendeu por alguns segundos naqueles olhos.
– Graças a Deus que não! Sou de outro bairro. Estou esperando a minha irmã acabar de se chupar com o Danilo pra podermos ir embora. É um saco não poder voltar sozinha. E eu tô com fome.
O pensamento que pairava a cabeça de Cristina agora era "Por que eu tô contando essas coisas para um estranho?" Mas antes que pudesse raciocinar a respeito, ela se assustou.
– Se estás com fome, vem comigo, sei de um lugar aqui que você vai adorar. Tem a melhor coxinha da rua. Vem, sua irmã nem vai perceber.
– E o pior é que não vai mesmo não.
Assim como Cris ficara confusa de confiar naquele menino estranho, alto e de casaco bege esquisito. Gustavo também só pensava em como ia perder a cara da água-viva e de como do nada sugeriu comida paga por ele a uma estranha.
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Desencontros Casuais
RomanceExistem momentos em que preferimos estar sozinhos, para tomamos um tempo para si e decidirmos nos reconstruír, certo? Bom, é assim na maioria dos casos após um término. Mas e quando as etapas da vida são saltadas sem sequer nos dar chance de escolhe...