Meu reflexo no espelho me encarava de volta. Olhos caídos e o rosto manchado de terra avermelhada. Acolho meu rosto com as mãos abundantes de água. A frieza com que ela tocou minha face fez eu me sentir mais vivo, estranhamente, afinal, eu já estava vivo. "Haha" penso comigo mesmo. Me volto para o vidro e percebo meus olhos totalmente negros.
_Não, agora não! - Recolho meu rosto entre as palmas novamente.
Corro meus olhos pelo chão iluminado na luz branca do banheiro e imediatamente vejo uma sombra passar por trás do meu corpo erguido sobre a pia. Salto para longe do espelho e paro bem no meio do cômodo olhando por toda a volta.
Vagarosamente vou me voltando para o reflexo. Não tinha nada. Não posso me dar o luxo de ter visões de novo.
_Está tudo bem? - Uma garota aparece com uma das suas mãos segurando a porta aberta.
Eu estava bem no meio de tudo, pálido e imóvel. "Que primeira impressão horrível", pensei comigo mesmo.
_Você... - Deixo minhas mãos suspensas no ar, olhando apenas para aqueles cachos ruivos do seu cabelo. Os olhos dela me fitavam curiosos, como os meus também a fitavam.
_Ah, Não faz muito tempo que estou aqui... cheguei agora. - Ela rebate, tentando não parecer uma curiosa intrometida.
O silêncio entre nós dois era de fato constrangedor.
_Na verdade... É que o banheiro... - Aponto para o desenho pregado na porta de madeira onde retratava a silhueta de um homem. _Ele é de menino.
Ela olha a placa e posso ver seu rosto corar levemente. Sua mão delicada retira uma mecha de cabelo que cai sobre o rosto.
_É... Eu sabia. - Ela me olha com um sorriso sem graça e bobo nos lábios. Em seguida sai do banheiro e fecha a porta.
Fico por alguns segundos parado no mesmo lugar, lembrando das suas feições. Havia um hematoma, percebi isso assim que vi ela na porta. O roxo em seu pescoço era quase apagado mas estava lá. Lavei minhas mãos outra vez, me olhei no espelho procurando por alguma sombra e me desfiz do banheiro.
[•••]
_Você gostava dela? Da menina no banheiro? - A jornalista interrompe minha história, ignorando todo meu sentimentalismo forçado.
_Ela se chamava Emma e era uma boa companhia. Na maioria das vezes me entendia. - Respondi revirando meus olhos. _Nunca tive muito interesse nas garotas. Ela era especial somente por ser a única menina no internato. Mas não era muito inteligente.
A jornalista não pareceu gostar muito da minha resposta sincera, mas se conteve em apenas escrever as palavras.
_Esses papéis dizem que você teve um amigo homem no internato com quem teve um relacionamento, é verdade? - Elizabeth enrugava a testa esperando que eu concordasse.
Me senti ameaçado com a pergunta e desviei os olhos para a mesa de centro. Ela havia espalhado vários papéis sobre a mesa de madeira. Estávamos reunidos na sala e ela acabou por fazer uma bagunça com folhas em todo canto.
_O nome dele era Armin. Nós brincávamos e fazíamos os afazeres juntos, não tinha nada de romântico entre dois garotos de 14 anos. Mas ainda sim, não durou muito tempo.
_Vocês brigaram? - Ela indaga realmente curiosa. Poderia colocar uma boa briga de internado em sua matéria.
_Ele morreu. - Respondi ríspido, bebericando meu chá.
Ensurdecedor era o silêncio que ficou, o clima chato que criei. Não que eu me importasse, mas me senti na obrigação de dar mais informações para jornalista.
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Um monstro para cada criança
HorrorA história contada pelo Sr. Clay relata uma infância traumática e assustadora. Quando pequeno, não sabia diferenciar os monstros reais com os apenas de sua cabeça. As coisas pioraram após perder a sua mãe em um acidente desastroso e ser mandado para...