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Brasil, 10/08/2019.

Eu amo antiguidades, talvez esse tenha sido o motivo de eu ter decidido gastar meu sábado livre indo até o outro lado da cidade só para chegar em uma loja. O Google dizia que era a melhor da cidade, era a que tinha o maior número de avaliações positivas, então resolvi confiar.

Mas havia algo estranho lá, principalmente com a vendedora que assim que ouviu o sininho da porta tocando já foi atrás para ver quem estava entrando no estabelecimento. Eu era a única pessoa além da mulher de cabelos brancos.

— Você demorou, eu estava te esperando. — A senhora disse, o que é muito estranho considerando que nunca a vi na vida. Como assim demorei? E como assim ela estava me esperando?

Apesar de saber que estava sozinha, não consegui evitar dar uma olhada ao redor para ver se a mulher estava falando com outra pessoa. Não estava. Dei um sorriso para a senhora, talvez fosse algo padrão e a mulher dissesse aquilo para todos os clientes, talvez fosse apenas para passar uma sensação de reconhecimento. Algumas pessoas devem gostar disso. Ou talvez, o que é mais provável, ela só tivesse me confundido com alguém.

— Oi, eu só vou dar uma olhada — digo. A verdade é que nem sei exatamente o que vim procurar, eu apenas queria alguns móveis e objetos para decorar meu mais novo apartamento. É uma longa história que começa com uma traição e casamento que não deu certo, termina comigo ficando com o apartamento que comprei com o meu ex-noivo. Pelo menos isso aquele traste me deixou.

A mulher assente e diz que se eu precisar de ajuda é só chamá-la, depois ela volta para o balcão e começa a organizar uns cristais. Após dar uma volta em quase toda a loja e encontrar apenas um abajur que combina com a minha decoração, vou para o caixa para poder pagar. Se eu for rápida, pode ser que consiga ir em outra loja ainda hoje.

Coloco o abajur no balcão para que a mulher veja, mas ao invés de pegar o objeto, a senhora segura a minha mão. Fico muito tentada a puxá-la para me livrar do seu toque, a mão dela está gelada e isso faz com que um calafrio percorra todo o meu corpo. Além disso, o aperto da senhora é muito firme para que eu simplesmente puxe a mão de volta.

— Posso ler? — A mulher pergunta e eu levo apenas um instante para entender que ela quer ler a minha sorte pela minha mão.

— Eu não acredito nessas coisas.

A senhora sorri, mas não me solta.

— Ah, querida, você ficaria surpresa com tudo que existe.

Acabo notando que a mulher não vai desistir, portanto também não vou conseguir me livrar dela. Por fim, cedo e deixo que ela leia minha mão mesmo considerando tudo isso uma grande baboseira. Ninguém pode saber nada sobre outra pessoa olhando para a mão dela, muito menos saber o futuro ou a sorte.

Após uns segundos de análise a mulher finalmente me solta e depois me encara por um longo momento.

— Diz que você vai viajar e viver uma aventura inesperada, que vai encontrar o amor e que terá que fazer uma escolha. — A senhora diz.

Impossível. Eu não planejo viajar e muito menos viver uma aventura, minha vida é calma, quase monótona. Encontrar o amor está fora de cogitação. Mas mesmo não acreditando em uma palavra daquilo, pergunto:

— Que escolha?

— Ainda não chegou o momento — a mulher sorri para mim. — Que tal levar um espelho? Eles ficam por ali — e aponta para o fundo da loja, eu acompanho seu movimento com o olhar e percebo que quando tinha dado uma volta pela loja, não tinha notado a quantidade de espelhos.

Por mais que eu não esteja precisando de nenhum espelho, não custa nada olhar, afinal eles são tão lindos e são tantos que eu poderia até fingir estar numa casa de espelhos.

Caminho até lá, quase que hipnotizada. Há um espelho muito mais bonito que outros, ele até combinaria com minha sala de estar. Paro em sua frente para poder observá-lo com mais atenção. Sim, ele é muito lindo mesmo.

Por alguma razão sinto uma necessidade enorme de tocá-lo, então eu o faço. Mas algo estranho acontece, é como se ele tivesse reagido ao meu toque, como se a superfície antes sólida tivesse se tornado líquida e agora pequenas ondas se movimentam por todo o espelho. Só que isso não pode ser possível. Ou pode?

Não, não pode. Eu só posso estar ficando doida. Quando alguém toca em um espelho ele não se movimenta como se a pessoa tivesse tocado na água.

Mas eu toquei e foi isso que aconteceu. Decido tocar outra vez, só para ter certeza de que nada vai se movimentar, afinal pode ter sido só um truque da luz, apenas uma ilusão de óptica.

Porém não foi, quando toco o espelho outra vez, minha mão afunda e sinto que estou sendo puxada, acabo perdendo o equilíbrio e de alguma maneira entrando no espelho.

Através do Espelho (COMPLETA)Onde histórias criam vida. Descubra agora