Capítulo Único

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Das três casas com a qual Dimitrescu se relacionava, era perceptível que a casa Beneviento era aquela com quem suas integrantes possuíam mais afinidade. Era comum reuniões entre as líderes de ambas as casas no castelo, chás da tarde em que discutiam sobre assuntos que não eram da sua alçada obviamente. Você era apenas uma empregada cujo dever era servi-las e sair do meio do caminho o mais rápido possível, mas era óbvio que na prática não era bem assim. Você era uma ótima observadora.

E assim você percebeu que toda vez que ocorriam essas reuniões, Bela Dimitrescu ficava incrivelmente agitada. Ao contrário de Cassandra e Daniela, a filha mais velha de Alcina era a mais comportada e madura das três, geralmente ficando no próprio canto a maioria do tempo, lendo seus livros por horas a fio até que fosse interrompida por uma de suas irmãs. Mas sempre que Donna Beneviento aparecia ela mudava da água pro vinho, observando as reuniões de longe como se sua não-vida dependesse disso. Era engraçado ver alguém que viveu mais do que você se comportar como uma adolescente.

Já da parte de Beneviento, bem... Você não tinha o que falar. Sério. Vocês nunca haviam de fato interagido e aquela mulher parecia ser trancada a sete chaves, nem mesmo o rosto por trás do tecido preto você sabia como era. Oculta da cabeça aos pés, a única coisa com quem você poderia ter uma espécie de contato era a boneca Angie, mas essa era uma ideia dispensável. Aquela coisa era bizarra demais até mesmo pra você.

Mais uma dessas reuniões ocorriam enquanto você cumpria seus afazeres, limpando as janelas do quarto de Alcina quando o telefone tocou. Você parou imediatamente e fitou o aparelho mais uma vez, até ele tocar novamente e você finalmente atendê-lo.

— Alcina? — Uma voz suave soou do outro lado da linha, mas ela estranhamente lhe causava calafrios. Deveria ser Mãe Miranda, você pensou, e isso não lhe deixava nada confortável. Sua relação com a religião era... Conturbada, por assim dizer.

— Castelo Dimitrescu, — Você tentou manter o mesmo tom desinteressado de sempre — no momento a Senhora Dimitrescu está numa reunião. Caso queira deixar um recado, passarei sua mensagem assim que os compromissos de minha senhora acabarem.

Uma risada pôde ser ouvida do outro lado da linha e por mais que ela fosse suave, acabou arrepiando cada pêlo do seu corpo. Você apertou a mão contra o telefone, assustada, antes de ouvir a voz lhe respondendo com o mesmo tom suave de antes: — Assim que eu terminar esse telefonema, vá até Alcina e diga para ela vir ao meu encontro imediatamente. Diga que Mãe Miranda possui assuntos que devem ser tratados com urgência, mais urgência do que qualquer outra coisa que ela esteja fazendo no momento.

E ela desligou a ligação, lhe fazendo correr até Dimitrescu logo depois de colocar o telefone no gancho, ainda assustada. Era a primeira vez que você interagia com Miranda de fato, e mesmo que ela não demonstrasse ameaça em sua voz, dava pra sentir que seguir suas ordens era a melhor opção. Você parou em frente a porta e respirou fundo, ajeitando seu vestido antes de entrar e interromper a reunião.

— Mil perdões pela interrupção, senhora. — Você disse abaixando a cabeça, mas percebendo como Donna se encolheu e Alcina lhe encarou com desaprovação antes de você encarar o chão — Mas Mãe Miranda ligou e pediu que a senhora vá ao encontro dela imediatamente. Ela disse ter assuntos de extrema urgência para tratar com a senhora, er, mais urgente que seus assuntos pessoais.

Dimitrescu levou uma das mãos até a têmpora e a massageou, fazendo uma cara feia antes de voltar sua palavra para Beneviento: — Ótimo. Mil perdões por sair no meio da nossa reunião, mas se ela diz ser algo tão urgente assim... É melhor não irritá-la. Fique a vontade nesse meio tempo, a casa é sua. Você trouxe seus equipamentos de costura, certo?

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