Capítulo Único

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Dorcas batia o pé contra o assoalho do corredor que dava para o escritório da diretora McGonagall.

Ela nunca tinha sido chamada para a diretoria, não desde que iniciou os estudos na Hogwarts High. A única vez foi quando ela e seus pais foram apresentados à escola, mas em relação a comportamento, sempre tinha sido uma aluna exemplar.

Não exemplar no nível Lily Evans, mas no estilo invisível da palavra.

Ela não causava problemas para os professores, estava com as notas sempre na média ou pouco acima dela, não ficava de recuperação, mas não era a primeira da turma e evitava responder às perguntas que não fossem direcionadas para ela. Não fazia diferença.

Naquele momento, se perguntava o que tinha feito de errado para que aquele pesadelo estivesse acontecendo.

Tinha criado uma conta no Twitter quando tinha ainda 13 anos. Era natural que usasse a rede social como forma de desabafar sobre como a escola era difícil... e sobre outras questões também.

Tinha 15 anos de idade quando descobriu que não era perissexo. Muitas mulheres cis — e homens trans e pessoas não binárias também — menstruavam tardiamente, mas mesmo assim a sua mãe, Alichia, pareceu preocupada demais com esse assunto, já que as mulheres da família costumavam menstruar aos 12 anos, e então a levou para um ginecologista.

E então descobriram que ela não tinha útero.

A notícia tinha sido mais fácil de receber do que qualquer pessoa imaginaria. Afinal, ela era uma mulher, ela deveria querer ter filhos biológicos quando estivesse mais velha. A propósito, tendo 15 anos, ela já deveria ter sonhado com isso várias vezes e começaria a explorar a sua sexualidade logo.

Só que... não.

A verdade é que Dorcas nunca sentiu vontade de se casar e ter filhos. Isso nunca foi um sonho ou uma prioridade para ela. Inclusive, quando descobriu como acontecia um parto, ela sentiu menos do que a sua vontade já inexistente de parir um ser humano. Algumas pessoas poderiam considerá-la fria por causa disso.

Era bom não precisar se preocupar com cólicas menstruais, remédios para a dor, absorventes, roupas manchadas e emoções à flor da pele. Mas por outro lado... Sentia-se estranha, diferente. Aos poucos, cada uma de suas colegas foi menstruando e isso parecia criar uma conexão esquisita entre mulheres, que ia desde compartilhamento de absorventes a comparação de medicamentos para cólica. E ela apenas repassava o que sabia por conviver com suas primas diariamente.

Não sabia como de repente passou a ter contato com a comunidade LGBTQIAP. Supunha que era inevitável quando se acessava o Twitter todos os dias. Um dia, ela aprendeu o que significava "intersexo" e se questionou se a agenesia Mülleriana se encaixava. Algumas pessoas diziam que não, outras diziam que sim. Podia parecer ridículo, mas saber que tinha outras pessoas como ela... era bom.

E isso a levava a aquele momento, sentada no sofá de espera para a sala da diretoria, onde a professora McGonagall conversava com sua mãe.

Há exatamente dois dias, uma garota chamada Emma Vanity descobriu o user de vários alunos LGBTs da Hogwarts High, e resolveu expor para todo mundo.

Dorcas supunha que era culpa sua, por não ter censurado o nome da escola em seus desabafos, mas nunca imaginou que iam descobrir quem estava por trás da @whyasterin se nunca divulgasse fotos suas.

Não importava se tinha sido descuidada, se tinha ocorrido um ataque maciço de hackers ou se alguém era digno de um emprego no FBI, a questão era que se sentia exposta. Agora ela tinha passado de ser a invisível da escola para uma das chacotas da Vanity, e não gostou da mudança nem um pouco.

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