Se fosse pra viver assim eu preferiria nunca ter nascido. Uma magoa que cresce tão profundamente e tão nitidamente me afeta todos os dias e cresce ao longo deles também. Tenho 17 e estou no 2 ano do ensino médio, aliás meu nome é Tamires mas isso não importa nem pra mim e muito menos pra você, claro que já tive minhas briguinhas de escola, queria eu elas fossem meu maiores problemas, porque meu psicológico nem é tão importante mais, eu já consegui arruiná-lo de outra forma, ou melhor, já conseguiram o arruinar de outra forma.
Minha mãe sempre foi digamos que, estranha. Ela nunca se importou comigo, e eu bem que queria que essa fosse um discurso de menina mimada. Nunca conheci meu pai então cada final de semana quando ela voltava das festas eu via um homem diferente, alguns vieram mais dias e outros menos, e chegou a vez de Paolo, um homem grande, barbudo, falava alto e cheirava a mofo, o-conheci com meus 8 anos, quando me escondia atras da fresta da porta para espionar quem seria o convidado pós festa desta vez, ele era normal, uma aparecia com o qual eu já estava costuma ver em casa principalmente em madrugadas de sábado, mas mesmo sendo igual Paolo era diferente, sempre me causou repulsa e eu nao fui muito com a cara dele. Claro, não gostei nadinha quando minha propria mae anunciou o seu namoro com o homem que me dava nojo, mas até que eles ficaram juntos por muito tempo...
Aos meus doze anos, vivia só eu e minha genitora, com parentes inexistentes e uma mãe estupida eu não tinha a quem recorrer, Paolo, era ele, ele me olhava de um jeito estranho, não sei se era fúria ou indignação, só sei que era perturbador. O relacionamento dos dois foi ficando estranha ao passar dos anos, a gritaria sempre fora muito alta, acho que minha ela não vai sentir saudades disso...
Teve uma vez, minha festa de 13 anos estava chegando, eu não tinha amigo nenhum e minha mãe nunca se preocupou em fazer festinhas, eu estava sozinha mais uma vez para comemorar o dia que você se aproxima mais da morte, ficava contente com o conceito de morrer se meu futuro fosse assim. Vi Paolo me observando pela porta um dia que fora dormir lá em casa, o susto foi grande, ele nunca nem chegou perto de ser um pai pra mim, acordei de repente e logo vem essa figura de terror para me assustar, seu olhar ameaçava me atacar por mais que não pudesse vê-los por entre a luz escura, não sabia como agir, não sabia como falar, não sabia como respirar, ele foi embora e eu não sabia oque foi aquilo e qual obsessão bizarra tinha por mim.
Não achava que isso era normal, isso não tinha sido normal, contei para minha mãe lógico, mesmo se ela não acreditasse muito ia somar para a lista de coisas que o Paolo faz para ela finalmente o deixar, além das gritarias e a gora tapas... já te contei sobre a minha ‘dona’, ela não estava nem ai, falou que era bobagem mas com um olhar de preocupação, fazendo sua fala e seu jeito corporal não entrarem em sintonia.
Eu estava todo dia no fundo do poço e não aguentava mais essa sensação, sabe, de que tudo que você viveu até hoje foi o mais puro desperdício e que na realidade ninguém te ama. Já pensei em desistir da vida milhares de vezes, um sonho. Mas nunca tive coragem de fazer nada com meu próprio corpo e nunca conseguiria tirar minha vida, até pra isso sou uma pura covarde. Lembrei de uma coisa que possuía, um livro, escrevia como um diário há uns anos atrás, talvez conseguisse lidar com meus sentimentos escrevendo nele. Foi isso que fiz, escrevi, meus sentimentos todos lá, aberto ao público, o público eram as palavras, as letras, e cada pontuação que ali havia, elas e só elas eram capazes de me entender.
As coisas em casa não estavam fáceis, a vida já não era uma benção a muito tempo e já não entendia o conceito de deus. Paolo me dava medo, ele sabia disso e usava a seu favor, não dava mais tapas em minha figura materna, ele aespancava, e a ameaçava sobre terminar com ele ou contar todos seus horrores a polícia. Mas o que eu podia fazer? Mata-lo?
Infelizmente suas visitas noturnas viraram frequentes, eu já estava com 15 anos quando retornou, já sabia me defender de certa forme e trancava meu quarto toda noite, já não era mais minha casa, era dele. O desgraçado tinha a chave do meu quarto. Foi quando tudo aconteceu. Ele se sentou perto da minha cama, mas foi só quando aquele velho nojento estava sob a mão na minha perna que finalmente acordei, o terror pairava sobre mim, não conseguia me mexer e seus braços, agora, me apertavam para não saltar fora dali, mas toda força não seria precisa, entrei em choque, minha ficha não estava caindo, aquilo estava acontecendo, meus olhos se encheram de lagrimas e minha única palavra que consegui dizer foi “pare” tão baixo que nem eu mesma pude ouvir.
Finalmente tudo aquilo tinha acabado, com um sussurro em meus ouvidos do homem mais podre que já conheci, suas palavras pesadas, duras e frias “não conte a ninguém, você sabe do que eu sou capaz”. Nunca mais me esqueci, nunca mais irei esquecer.
Minha cama, ela... ela estava cheia de sangue, ela estava amaçada, ela estava encardida, ela nunca mais vai ser um lugar confortável para descansar. Tive meus maiores pesadelos nela.
Peguei meu diário, mas agora, não contava mais oque havia acontecido. La eu escrevia tintin por tintin de como eu gostaria que ele fosse a óbito, meu sonho nunca fora tão grande assim, primeiro eu o-pregava numa carteira, ou melhor, na poltrona favorita dele, aquela na qual o cheiro de cigarro e bebidas já está impregnada, lá ele está preso, suas banhas são apertadas pela corda que o amarra, sua pele fica roxa com a pressão dela, enquanto isso eu taco álcool puro nele, quebro garrafas de vodca em sua cabeça, minha mãe, agora é a vez dela, ela pega o isqueiro, acende ele, a melhor parte vai começar, e em quando Paolo grita palavras insignificantes como “pare!” “vocês são loucas¹” “me desculpe!” eu e minha parceira rimos e agradecemos, se deus existe, ele finalmente apareceu. Escrevi isso e fui dormir, tentei buscar do sono um lugar de refugio da realidade triste e cinzenta.
No dia seguinte o inesperado, mas esperado aconteceu, eu não sabia como tinha acontecido simplesmente vi Paolo carbonizado na sala de estar como escrevi em meu diário, ele estava lá, morto. Foi o meu diário, eu tinha certeza “foi ele foi ele foi ele” eu repetia num ar de felicidade extrema. O meu sonho, o meu sonho tinha sido realizado, e ele foi graças aquele livro, nunca imaginei que ele poderia ter vida, ou até mesmo magia.
Mas agora eu me pergunto, como você pode acreditar que um diário foi capaz de matar um homem, alguém teve que fazer o trabalho sujo. Não é mesmo?
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Eu faço a minha própria mágica
Mystery / ThrillerConta a história de Tamires, uma menina rejeitada pela mãe e que não sabe onde anda seu próprio pai. Nada é fácil pra ela, principalmente nas noites de sábado. ⚠️Gatilhos: -Abuso sexual. -Depressão. -Pensamentos suicidas.