Shirley, Shirley, Shirley. Shirley Graham. SHIRLEY.
Por algum motivo aquele nome não saía de minha cabeça, ou era apenas eu que não o deixava ir? Por que eu fiquei tão surpresa ao descobrir o nome da mulher maluca que divide o quarto comigo? Perguntas que eu mesmo faço a mim mesma e eu não faço ideia da resposta.
Mas, o que mais me preocupa é: por que aquela mulher que me deu um pouco do seu café da manhã se mandou daquela sala assim que mencionei que Shirley Graham me chamara de má? Não é possível que seja pela razão que estou pensando. Não... não é possível.
Enfim, de qualquer jeito, depois daquele climão naquela salinha, onde terminei de comer o meu sanduíche, voltei à minha cela e ela estava lá, finalmente. Ela estava lá. Shirley estava sentada em sua cama, como de costume, com aqueles seus mesmos tremeliques de sempre, roendo as unhas com os joelhos levantados até o seu queixo. Ela olhava para a escada do beliche, parecendo assustada. Levei um breve tempo para reparar de que ela não estava usando o mesmo uniforme da clínica que todas as pacientes usavam: ela estava usando uma roupa marrom misturado com amarelo, nunca tinha visto aquele tom de cor na minha vida antes.
— Shirley? — chamei-a, não ligando se ela acharia estranho eu saber o seu nome. Ela me olhou, espantada. — Tudo bem?
— Má! Má! — ela começou a gritar. —
Ela começou a se debater nas paredes e no seu lugar no beliche. Eu assisti à cena assustada, sem saber o que fazer. Ainda continuava parada na porta quando dois seguranças vieram até dentro da cela. Pensei que estavam vindo para mim, mas eles entraram dentro da sala e foram até Shirley, que agora estava chorando, ainda roendo as unhas.
Um dos seguranças olhou para mim.
— Que é que aconteceu aqui? — ele perguntou, confuso.
—
— Má... má... — Shirley sussurrou, começando a se acalmar quando o outro guarda, que estava ajoelhado no chão para ficar à sua altura, começou a lhe fazer carinho nos braços.
— Então você não faz ideia do que aconteceu por aqui, certo? — insistiu o segurança.
— Sim, tenho certeza — respondi firmemente, sem tirar os olhos de Shirley, que parou de falar.
— Shh, calma — o guarda que estava ao seu lado disse. — Vamos te levar para Aquela Salinha e vamos te dar o remédio, tudo bem?
— Não! — berrou ela. — Eu não quero mais remédios! — Apontou para mim. — Ela é má! ELA É MÁ!
— Tá, ok, tudo bem, ela é má. Shh...
O segurança se virou para mim.
— Por que ela está dizendo isso toda hora?
— Não faço ideia.
Fiquei traumatizada com Shirley Graham depois daquela cena dentro da cela. Várias pacientes foram parar na porta de minha sala quando os dois seguranças levaram a maluquinha para uma sala fora do corredor de onde ficavam os quartos. Todas as pacientes me encararam como se eu tivesse feito algo péssimo, mas, como eu disse antes, eu não faço ideia do que pode estar acontecendo.
Entrei dentro da minha cela novamente e fechei a porta de ferro que praticamente estourou e ecoou por todo o corredor. Lá dentro, fui até a minha parte do criado mofado da sala, onde eu guardava meus utensílios... íntimos (não sei uma palavra certa para isso). Lá dentro, encontrei um de meus calmantes. Qualquer uso de remédio não autorizado aqui dentro da clínica pode gerar consequências graves e eu já estou cansada de ouvir isso pelo mesmo segurança que não tira as mãos do cinto, eu sei. Mas não me recuso de usar pelo menos uma vez por dia... ou semana...
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Quando nós dormimos
HorrorBillie Port é uma adolescente de 14 anos que tem um transtorno do sono: a paralisia. Com o seu foco em acabar de vez com seus sonhos assustadores, ela vai à consultas de psicologia para amenizar a situação, mas tudo começa a piorar quando sua mãe va...