Capítulo Três

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Não havia dormido bem.

Meu corpo todo doía em lugares específicos onde a dor era aguda e inquietante. Mas a maior dor se concentra nas minhas têmporas. Eu culpo meu colega de quarto que o impregnou de cerveja. O cheiro, pela manhã assim que acordei, era insuportável. Abri a janela com uma velocidade surpreendente e só não caí devido às grades. Respirei fundo e deixei que o ar de fora expulsasse o de dentro, deixei que o meu quarto inspirasse e expirasse aquilo tudo. Obviamente meu colega ainda dormia, o que é uma coisa boa, assim eu tive tempo de descobrir a pior coisa sobre a Katharine até o momento: Os banheiros.

Não que fossem sujos e malcuidados, nada disso. Mas eles eram coletivos e todos os garotos estavam lá. Era como o banheiro da marinha, tinha cabines, mas a privacidade era quase igual à zero. Todos os garotos, de todas as turmas da manhã, estavam lá. Não fazia ideia se meu colega era do turno vespertino, mas eu fiquei com inveja do apagão dele.

Peguei a primeira cabine, infelizmente.

Ouvi vozes de todos os lados e foi a mesma coisa que sentir que estava sem a cabine. Não havia um minuto onde todos aqueles garotos calavam a boca, era apenas conversas sobre jogos, sobre outras pessoas, sobre sexo e matérias. Me limpei o mais rápido que pude e me vesti ainda dentro da cabine, eu não ia arriscar tirar a toalha no meio de tantas outras pessoas. Menino ou menina, meu corpo ainda era o meu corpo e eu ainda tinha a necessidade de escondê-lo como bem entendesse. Me vesti depressa, deixando apenas os tênis faltando. Isso eu poderia aguentar.

Quando abri a porá da cabine, um dos garotos me chamou. Não fazia ideia de como ele sabia meu nome mas não pode ter sido outra pessoa, acho que sou o único aqui que se chama Atlas.

— Onde está Vinci?

— Quem? — Questionei.

Alguns garotos riram. Evitei olhar para... tudo deles.

Eles estavam à vontade.

— O seu colega de quarto?

Então o reconheci como sendo o garoto que ficou à esquerda, segurando o ombro de Encrenca. Ou melhor, Vinci. Procuro com os olhos o garoto que ficou à direita, mas não o vejo.

Acabo pensando no que dizer, mas todas as alternativas parecem perigosas e não vou abrir minha boca para dizer que ele deve estar de ressaca quando estamos em uma escola onde a palavra bebida se limita apenas a suco e água.

Então dou de ombros e digo, vagamente, que ainda está dormindo. Ele entendeu o que quis dizer e não pude. Ele também parecia estar com os mesmo sintomas da ressaca. Mas o banho ajudou.

Limitei-me a um sorriso vago e fui embora. Os banheiros, assim como a recepção, ficava em um bloco diferente. Tive que andar depressa já que meus pés estavam descalços e eu precisava me apressar já que tinha apenas, calculando rapidamente, pouco menos que meia hora para comer alguma coisa. Uma lida rápida nas regras — que tinha frente e verso — me informou que os alunos têm uma hora para se arrumarem para as aulas. Eu precisava mais que uma hora, eu precisava de, pelo menos, um dia inteiro para decorar onde as placas azuis estão para me informar aonde vou, descobrir para que lado está o bloco dos banheiros e não o da recepção. Foi então que acabei parando no meio daquele pátio e vi o garoto que esbarrou em mim andando na minha direção e ele estava... completamente arrumado e tranquilo.

Hesito.

Não há como eu sobreviver aqui sem buscar informações e a voz do meu pai insiste em me dizer que informação é poder. Resisto à tentação. O garoto passa por mim de cabeça baixa. Escuto os passos dele se afastando...

— Ei — o chamo, derrotado e com raiva da voz insistente do meu pai.

O garoto de cabelos pretos e virou e pareceu levemente tímido comigo o chamando. Ele ficou assim, meio murcho, desde que eu disse que sou do terceiro ano.

Entrelinhas (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora