Capítulo Quatro

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Não havia muita coisa a ser dita, mas quem poderia imaginar que meu cartão também me dava acesso às piscinas?

Não que eu estivesse com vontade de tomar banho. Só é um ótimo lugar para estar no primeiro intervalo. Depois da aula de português com o professor de olhos verdes que ainda não decorei o nome, tive duas aulas seguidas de química. Foi estressante. Alguns alunos seguiram do refeitório direto para seus quartos, outra bandeja de aço com comida fumegante. Eu, entretanto, ouvi alguns alunos conversarem sobre as piscinas e que iram vir aqui hoje à noite. Só segui as placas azuis e agora estou aqui, de frente a uma piscina enorme, sem barulho algum a não ser minha colher no prato.

Eu não fazia ideia se Linda sabia que seus tão educados alunos faziam pequenos encontros? Quer dizer, eles não são burros nem nada, evitam as câmeras e são discretos... Saber que há um grupo, mesmo que pequeno, aprontando debaixo do nariz de Linda me deixa sorridente enquanto aprecio esse lugar deprimente.

Ousei correr o risco de trazer meu celular comigo. Pensei que, já que Linda se confia que não tenho recuperar o meu, ela não vai me revistar uma segunda vez. — Isso não impediu que eu suasse frio quando passei por ela para sair do refeitório. Não sabia se ela tinha algum detector ou algo assim que pudesse usar de surpresa.

O celular está ao meu lado e convenientemente estou com internet. Não tenho para quem mandar mensagem, não deixei nenhum amigo para trás quando meu pai tomou a decisão de me colocar aqui, e eu também não podia mandar nenhuma mensagem para ele. Não podia falar com ninguém. Mas eu gostaria de falar com Mica, pelo menos mais uma vez. Sei que ele nunca me responderia. A sensação de solidão é diferente do desejo de estar sozinho; estou sozinho agora, isso é o que eu quero, me sinto confortável e afim. Mas saber que estou sozinho... é uma tremenda merda. Eu queria que estivesse chovendo, assim algum barulho poderia me acalmar e...

Paro de comer assim que ouço a porta ser aberta por outro aluno.

Vejo o que acontece a seguir em silêncio.

Duvidoso está aqui — mas não por vontade própria.

Está sendo carregado por garotos que o agarram pelo ombro. A camisa dele está melada e o rosto vermelho pelo esforço que está fazendo para não chorar. Deve ter sido encurralado por aí e agora eu entendo a preocupação dele em colar em mim. É para que outros não conseguissem pegá-lo. Largo o celular e a bandeja no mesmo cantinho e me levanto. Porque ele não está gritando? Porque não está revidando?

Me detenho. Não consigo dar mais nenhum passo na direção deles mesmo sabendo o que está prestes a acontecer... Meu estômago revira e eu me sinto como dois anos atrás. E não é um sentimento bom, é quase como o sentimento de solidão só que bem mais esmagador.

Vejo Duvidoso olhar para os lados, desesperado e mesmo assim, calado. Assustado demais para gritar. Os dois garotos que estão segurando seus ombros se aproximam cada vez mais da borda de uma das piscinas. Eles estão tão sorridentes.

Um deles fala bem alto:

— Cuidado para o seu pau não sumir quando a água gelada encharcar suas calças!

O outro riu. Então tentaram tirar a roupa dele.

Foi então que aconteceu, é a mesma sensação. Parecia que eu trocava de pele, como uma cobra, e era tão de repente, eu apenas agia, colocava o senso no fundo da cabeça e pensava em apenas uma coisa. De longe, Duvidoso me viu e seus olhos já estavam lacrimejando.

Sem som, ele disse: — Por favor.

E eu fui à direção dele, a raiva explodindo.

— Ei! — Gritei — Não jogue ele aí.

Entrelinhas (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora