Matinal

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Acordar cedo não era um hábito comum de César.

Quer dizer, ele se via obrigado a fazê-lo desde sempre, foi assim quando ia à escola e tempos depois, quando ia ao trabalho, mas a questão é que, não importa quanto tempo tenha se passado, ele continuava odiando levantar naquele horário e, sempre que podia, virava a noite e madrugada para acordar apenas no meio da tarde, honrando a sua fama de ser noturno.

Mas, ultimamente, isso vinha mudando. Mais especificamente, desde que Joui passou a ser uma parte significativa de sua vida.

Veja bem: moravam juntos há cerca de dois meses e nas últimas semanas o Cohen se viu quase que automaticamente inserido na rotina do mais novo. Joui levantava todos os dias, sem falta, minutos antes do sol nascer, para assim iniciar o seu dia de forma saudável com exercícios matinais e preparando um belo e reforçado café da manhã para ambos, algo que César estava totalmente desabituado.

Não é como se Joui o forçasse a segui-lo em seus hábitos, mas independente do quanto o outro se esforçasse, não conseguia continuar a dormir sem a presença do namorado em sua cama, abraçando-o como um ursinho. Sentia-se protegido, e há tempos que não tinha um sono tão tranquilo e revitalizador.

Talvez estivesse viciado em seu abraço. Talvez.

Quando deu por si, já estava de pé logo pela manhã por vontade própria e, acredite, completamente descansado, algo que, há apenas alguns meses, pensaria ser praticamente impossível. Claro, não acompanhava o namorado nos alongamentos e corridas matinais, não era o tipo de pessoa que curtia se exercitar, preferia permanecer na cama enquanto ele não estava de volta.

O clima na casa pela manhã era tão acolhedor, o cheiro de café e torradas caseiras era viciante, César via-se inebriado pela calmaria e frescor desses momentos que dividia com Joui, saboreando daquilo que ele havia preparado com tanto carinho, fazendo questão de sentar ao seu lado para mimá-lo com beijinhos e cafuné, aproveitando a companhia agradável um do outro enquanto podiam, antes de terem que seguir para os seus trabalhos.

César trabalhava como freelancer, o que acabava contribuindo para os seus hábitos noturnos, mas até nisso ele sentiu uma melhora. Começava a trabalhar pouco depois que Jouki saia, e pouco antes dele chegar, já havia terminado, sobrando tempo para passarem a noite juntos, além, é claro, de ter percebido uma óbvia melhora em seus resultados. Isso o deixava animado, Joui estava certo quando lhe disse que estabelecer uma rotina seria melhor do que virar noites trabalhando exaustivamente.

Obviamente, a convivência com o japonês trouxe muitas mudanças em sua rotina, para melhor, lógico. Mesmo que não acordasse tão cedo quanto ele, era realmente surpreendente a forma como haviam conseguido se adaptar à vida um do outro tão rapidamente e de forma tão orgânica. César admirava toda a disposição do mais jovem, que estava sempre animado e cheio de energia.

Por isso, se surpreendeu ao acordar em seu novo horário usual e perceber que Joui ainda estava ali, deitado ao seu lado, dormindo feito pedra.

O mundo estava virando de cabeça para baixo mesmo.

Espreguiçou-se sobre a cama, ouvindo o estalo alto de suas costas e uma pequena pontada de dor na omoplata direita, fruto da sua má postura. Joui não se moveu um centímetro até então, mesmo com toda a movimentação nada sutil do namorado. 

Realmente estranho.

"Joui…?" César optou por chamá-lo, suave, enquanto se aproximava do mais jovem. Sem resposta. Percebia seu peito subindo e descendo em uma respiração ritmada, aparentemente tranquila. "Joui, amor!" Tentou novamente, desta vez apoiando os braços sobre o peito desnudo dele, aproximando o rosto do seu. "Acorda" pediu, o tom de voz levemente mais alto para se fazer ouvir.

Pareceu funcionar, já que observou o namorado abrir lentamente os olhos, sonolento, com a mente ainda perdida em outro lugar, nem mesmo percebendo o outro corpo sobre o seu de imediato.

"César…?" Questionou, para ninguém em específico, com a voz rouca pelo despertar recente, tentando focar os olhos pequenos e pesados na figura de cabelos compridos sobre si.

César sorriu de lado, apreciando a fofura que era Joui acordando pela manhã, algo que raramente conseguia prestigiar. Cruzou os braços sobre o seu peito, admirando-o encantado.

"Bom dia, Joui" sua voz estava tranquila, quase divertida, e ele não tirava os olhos de si nem por um segundo. Joui bocejou, esfregando os olhos para limpá-los e melhorar a visão.

"Bom… dia!?" Pronunciou, ainda levemente confuso. "Já é de manhã?"

César soltou uma risadinha pelo nariz, achando tudo aquilo adorável.

"É sim" respondeu, chegando mais perto para depositar um beijinho rápido em seus lábios ressecados. "Dormiu bastante hoje?"

Em certo momento, César sentiu sua cintura ser segurada pelas mãos aquecidas do japonês, aproveitando do toque carinhoso em sua pele por baixo da camiseta larga. Joui acariciava-o preguiçosamente, parecendo estar em um estágio quase letárgico, hipnotizado.

"Sim…" respondeu no automático, nem parando para analisar a pergunta direito, ainda estava um pouco cansado e sempre precisava de um tempo  para se orientar depois de acordar. Nos seus primeiros cinco minutos do dia, Joui era ninguém. 

Cohen apenas sorria, analisando cada mínima ação do outro. O piscar lento dos olhos encarando o teto, a respiração leve e o movimento sutil de seu corpo funcionando sob o seu, e a mente provavelmente perdida em algum lugar do vazio, tentando se reencontrar aos poucos.

O jeito foi ficar ali, apenas aproveitando da sua silenciosa companhia, deitado em seu peito e admirando todo o seu processo de despertar. César apoiou a cabeça nos braços, sem tirar os olhos de seu amado, que vez ou outra encontrava-se de olhos cerrados e respirando um pouco mais fundo, relaxado. Era quase como uma meditação inconsciente, ele gostava de pensar.

Alguns minutos se passaram, e o mais novo parecia estar de volta ao corpo. Encarou com um sorriso o cabeludo debruçado sobre si, o mesmo que o encarava também sorrindo, singelo, e o apertou em um abraço, envolvendo os braços fortes em suas costas, arrancando risadas reclamonas dele quando ouviu alguns de seus ossos estalarem.

"Aai, Joui. Já chega!" Suplicou com a voz apertada, sentindo a risadinha contida e rouca do outro causar um arrepio em todo o seu corpo. Jouki afrouxou o aperto, agora apenas o abraçando carinhosamente, como um ursinho de pelúcia gigante. Sentiu um tapinha sem força atingir seu peito, causando mais cócegas do que qualquer outra coisa. "Filho da mãe, quer me quebrar?" Questionou com falsa repreensão.

"Bom dia pra você também, César" disse ainda sem conter a voz risonha.

"Já te dei bom dia, doido!" 

"Pois eu estou dando de novo" provocou, apertando o nariz do mais velho entre os dedos, fazendo-o revirar os olhos, não conseguindo se segurar quando riu nasalado mais uma vez naquela manhã.

"Beleza, então, dorminhoco" iniciou, agora tratando de levantar e colocar-se ajoelhado ao lado do namorado, que permaneceu na mesma posição. "Hora de levantar."

Na mesma hora, se surpreendeu ao ter sua boca roubada em um rápido beijo sem aprofundamento, apenas um leve selar de lábios. Ele sorriu, fechando os olhos para aproveitar o momento e o calor do corpo próximo novamente.

"Credo, seu nojento" exclamou alto ao separar o ósculo quando sentiu o japonês atrevido tentar invadir sua boca com a língua. Joui riu mais alto dessa vez. "Vai escovar esses dentes primeiro, aff." Limpou o lábio inferior que havia sido tomado anteriormente, enquanto finalmente se levantava da cama, ajeitando as roupas bagunçadas.

Joui levantou-se logo atrás e o abraçou de lado, apenas para depositar um beijinho demorado em seus fios desgrenhados e sussurrar em seguida, em seu ouvido:

"Te amo, seu rabugento."

É, às vezes era bom sair da rotina.

Rotina - Joesar auOnde histórias criam vida. Descubra agora