O Herdeiro de Ketu - parte 4

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— Tem certeza de que isso vai dar certo? — perguntou Liv pela décima vez.
Antes que Tom pudesse responder, Sarah falou.

— Eu não tenho conhecimento sobre magia mortal, mas sempre imaginei que a pessoa precisasse saber como a magia funcionava para realizar um feitiço.
Ele fechou os olhos. Contou até cinco. Tentou ignorar que duas garotas lindas que dependiam de sua vida estavam com dúvida se ele conseguiria salvá-las.

— Quem aqui está sobre pressão — ele resmungou.

Sarah riu, e ele soube que ao menos a parte sobre super audição dos imortais era verdadeira.

— O que estou tentando fazer — ele falou pela quinta vez — é recriar o Egungun, a união do mundo mortal com o mundo dos espíritos ancestrais.

— E como essas roupas estranhas e máscaras vão ajudar? — perguntou Liv apontando para as vestes dele.

Não era nada fácil de explicar. O manto vermelho com traços triangulares em amarelo e azul, e a máscara de barro do Monte Santo do Reino das Chamas, de onde a família de Tom era nativa, simbolizavam a conexão do homem com o Orun, a realidade invisível onde habitavam os deuses e espíritos ancestrais. Sarah e Moira se referiam àquilo como Reikai, reino dos deuses e celestiais.

Mas o povo de quem Tom descendia, os Iorubás, acreditavam em uma camada entre dimensões. O conceito, ele admitia, era similar ao Ketu onde a família de Sarah morava. Mas ele sabia que era algo mais poderoso. Era a morada dos orixás, os deuses de seu povo. E através do Egungun ele poderia se comunicar com esse Lugar Entre Mundos. Isso se seus deuses o aceitassem como digno de viajar entre as realidades.
Aqueles itens eram o tesouro que seus pais lhe haviam deixado.

— São o manto e a máscara do Oráculo de Ifá — ele explicou. — Se os orixás me aceitarem, poderei criar uma rota de fuga para nós.

Liv engoliu em seco. Tom tinha lhe explicado a ameaça dos executores. A menina estava tentando engolir o luto, talvez deixando para sofrer quando estivessem de fato seguros. Ele não sabia. Mas sabia que a única esperança para eles, era que Tom se tornasse o Clérigo de Ifá. Um Alagbâs.

Apesar de saber que apenas um Alapini, o Grande Clérigo da Cidade Capital Oyó no Continente Delta, podia ordenar um Alagbâs, não se importou. Dependia dos deuses aceitá-lo ou não.

Ele tinha todo o conhecimento dos rituais. Só tinha medo do que Sarah tinha dito. Ela errou sobre o saber, já que Tom sabia como a magia funcionava. Mas ele não tinha magia no sangue. Dependia dos orixás o aceitarem.

Tom colocou a máscara e vestiu o manto. Pegou um bolo de feijões e óleo de palmeira que tinha em sua casa. O dispôs no chão, em um prato, e fez um círculo em volta. Se ajoelhou e fez orações. Repetiu cada prece como tinha aprendido desde antes de começar a andar. Colocou todo o seu fervor nas orações. Se levantou e começou a rodear o círculo. Vinte e uma orações, uma para cada um dos 21 orixás principais.

Quando pegou a adaga, sentiram outro abalo na terra.

— Estão quase conseguindo — falou Moira, enquanto andava para lá e para cá com o bebê no colo.

Tom tentou ignorá-la. Essa era a parte em que estava receoso. Teria que derramar seu sangue sobre a oferenda. E torcer para ser aceito. Assim que encostou a faca na mão, Heimduriel o interrompeu.

— Há uma maneira de garantir que você seja aceito.

— Como? — perguntou Tom, virando para encarar o celestial pelos buracos da máscara.

Heimduriel tentou se levantar, mas não conseguiu, gemendo em seguida. Em um segundo Moira estava ao seu lado. O celestial olhou para Tom.

— Se eu dividir com você minha energia, você terá um vínculo comigo. Assim terá acesso à magia celeste, e poderá usá-la para o ritual.

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