Único.

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A noite estava fria. Seus pés descalços e desprovidos de meias se arrastavam juntos para debaixo do cobertor, e suas mãos se uniam próximas ao seu peito - onde sentia o coração bater mais forte que o normal, ansiando por coisas completamente improváveis.

Toda vez que fechava os olhos, sua mente desenhava Simon à sua frente, com todos os detalhes que jamais esqueceria, incluindo a pequena e discreta cicatriz próxima aos seus lábios. Doía pensar que não houve tempo suficiente para perguntar a origem do machucado, e para perguntar também tantas outras coisas das quais sempre quis saber. Não houve tempo o bastante para nada.

E pois é, tempo. Foi tão... pouco tempo. E há tanto tempo atrás. Wilhelm se questionava por quê as lembranças permaneciam tão vívidas em si, por quê ele não conseguia esquecer. Se perguntava se Simon ainda se lembrava da forma como ele mesmo lembrava de tudo, se Simon ainda sentia a sua falta como ele sentia a dele. Não havia um único dia em que o moreno não invadisse os pensamentos do príncipe, fazendo morada ali e o convencendo de que jamais seria capaz de amar outro alguém.

Pois naquele quarto, monótono e frio, só se ouvia o ar-condicionado e a respiração pesada de alguém que, mais uma vez, estava sozinho pensando demais em tudo. O peito apertado se apertou mais ainda, e o coração acelerado acelerou ainda mais.

Wilhelm muda sua posição na cama, agora de bruços e encarando o teto escuro acima de si. As lágrimas aos poucos brotavam em seus olhos e escorriam por suas têmporas, molhando suavemente suas mechas de cabelo castanho claro próximas às orelhas. Era tanta coisa, e a dor nunca ia embora, por mais que Wilhelm tivesse ido. Ele foi, deixou para trás seu último porto seguro, em troca da vida que ele nunca desejou ter. Em troca de passar o resto do seu tempo na Terra fingindo ser alguém que não é, por pura pressão e obrigação. Perdido, sem poder se encontrar novamente no abraço do único que seria capaz de tirar toda a dor e angústia de si.

Fechou os olhos.

Fechou os olhos e puxou com vontade o ar para seus pulmões, viajando por seus pensamentos para onde não houvesse aquela dor. Onde só o que havia era ele e Simon, deitados na cama ao lado do aquário com os três peixinhos e iluminados pelo abajur de lâmpada amarelada. Onde os olhos escuros e ansiosos de Simon o encaravam, onde as digitais de Wilhelm encontravam a pele escura e macia da bochecha gordinha. Onde sua língua umedecia seus próprios lábios, sedentos pelos alheios.

Onde não importava o frio que estivesse fazendo lá fora, ali dentro sempre seria quente e aconchegante, onde Wilhelm sempre poderia se refugiar quando a mais tormenta tempestade chegasse. Onde, naquele calor, ele encontrava um sentido à vida. Onde todos os pontos se encontravam, e tudo que o atormentava, simplesmente desaparecia como fumaça no ar.

"Eu te amo. Eu te amo. Eu te amo." Era o que ecoava em sua cabeça enquanto aos poucos se lembrava de que o único lugar onde poderia ter Simon, seria em seus pensamentos mais profundos e sinceros. Que ali, naquele momento, não existia nada além de sua própria respiração e o som do ar-condicionado.

Levou as palmas das mãos ao redor de seu corpo, abraçando a si mesmo enquanto tentava sentir, sem sucesso, o toque de Simon no lugar de seu próprio. Ele não estava ali, e jamais estaria. Porque naquela vida, Wilhelm jamais poderia estar com a única pessoa que amava, e deixá-lo ir embora foi a última opção que lhe restou.

Abriu os olhos.

Abriu os olhos, desejando que da próxima vez que os fechasse, fosse a última.

Se eu pudesse ter vocêOnde histórias criam vida. Descubra agora