Delicate Sense

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O céu em Seul amanheceu cinza e carregado, a chuva grossa despencava desde a madrugada, deixando a cidade toda sonolenta e preguiçosa. Taehyung estava acordado há horas e não tinha ânimo para nada além de encarar a janela. Em poucas horas estaria de novo dentro de sua sala, ouvindo toda a ladainha da diretoria e dos acionistas.

Há mais de três semanas que tentava entender todos os aspectos de sua própria vida. Desde que recebeu o correio de voz de Seokjin, ele o usava como ponto de apoio para seguir em frente. Por três vezes ele pensou em correr até o local que o google maps mostrava ficar do outro lado de Seul. Mas se dessa vez ele estragasse tudo, sabia que não teria volta. Por isso se impediu de ir até ele antes de ter clareza sobre sua própria vida.

Se levantou a contragosto e seguiu para debaixo do chuveiro. Depois concluiu o ritual: calça, camisa, gravata, colete e terno. Um bom empresário, um diretor respeitado e competente. Porém infeliz e cansado. Entrar naquele carro e dirigir até o prédio se tornava um fardo, não via mais sentido em viver aquela vida.

Seu sonho era mesmo aquele? Ter todo aquele dinheiro era suficiente? Fingir ser o modelo de homem que a sociedade coreana adora era não só cansativo, mas ridículo. Taehyung se sentia como uma grande piada. E o que mais o incomodava era que Seokjin viu nele justamente o esteriótipo que criou para si.

Porque quem oferecia dinheiro para ele e o tratava como um objeto era o Taehyung que se escondia de tudo e de todos. Era o empresário que não podia ser visto com outro homem, o hétero. Covarde e medroso.

Durante todos os dias, enquanto tentava voltar a trabalhar como antes, aqueles pensamentos eram as únicas coisas em que conseguia focar. Cada dia mais sufocante, queria parar de pensar e começar a agir, mas jogar tudo para o alto nunca foi seu forte. Até aquele momento da vida, Taehyung seguia uma linearidade, fazia o que precisava e pensava só na recompensa final.

O problema era que, na verdade, ele percebeu que não havia recompensa. Pelo menos não a que ele esperava. Havia dinheiro no banco, e um carro de luxo na garagem, outrora até a garota perfeita estava em seu apartamento na cobertura. Mas apesar disso, nada foi suficiente. E foi num quarto de motel barato, nos lábios cheios de um homem desconhecido, em uma noite quente de verão que ele voltou a sentir alguma coisa.

A partir daquela noite, tudo em sua volta fazia cada vez menos sentido. Sua farsa caia por terra, sua atuação decaia e ele não sabia mais quem era Kim Taehyung. Viu sua garota ir embora, levando com ela sua culpa de ser um babaca. Viu seu trabalho se tornar ridículo, e agradar homens ricos já não parecia uma carreira digna. Nada do que tinha era realmente o que desejava.

Nada.

[...]

— Portanto, Taehyung, eu espero que você esteja de acordo com a nossa nova linha de raciocínio — o presidente disse, o olhando de queixo alto e nariz em pé.

Taehyung ouviu todas as palavras que mais de quatro dos acionistas disseram, e viu a mesa da diretoria dizer amém a cada uma delas. Não fazia sentido, não era exatamente o conceito que queria trabalhar quando aceitou o cargo. Eles sabiam disso, sua filosofia era completamente diferente, aquela proposta visava o lucro cego e inconsequente.

— Tenho certeza que posso amadurecer a ideia, senhor Kang — concordou a contragosto, não adiantaria criar uma cena naquele momento.

O resto da reunião pareceu passar com a velocidade reduzida. Todos queriam dar sua opinião, defender seu ponto de vista, e o Kim só queria estar longe dali. A cada minuto que passava, sua inquietação aumentava, tornava-se aos poucos um claustrofóbico na própria vida. Queria fugir, tirar aquelas roupas e respirar de novo.

Olhos Perversos | TAEJINOnde histórias criam vida. Descubra agora