O vento gelado bateu em meu rosto e inalei profundamente. O ar da serra não era apenas mais frio. Ele também tinha aroma de amor e saudade. Uma saudade que eu nem conseguia explicar direito. Talvez fosse minha mente me forçando às despedidas, como se a iminência do casamento das princesas fosse o fim da vida como eu a conhecia. Como eu a vivi nos últimos anos.
O Conde D'Eu e a Princesa Isabel conversavam ao longe, sentados em uma toalha de piquenique. Eu realmente esperava que eles se dessem bem. Não apenas porque suas personalidades eram semelhantes e eu acreditava que pudessem ser felizes, mas também pela certeza de que Leopoldina estava encantada por Augusto. Se Isabel escolhesse Gastão tudo seria mais fácil.
Seria como finalizar aquela tarefa confiava há tantos anos. Educar as princesas, uma delas a futura Imperatriz do Brasil. E elas eram agora duas princesas impecáveis, que seriam aceitas em qualquer corte do mundo. Mas eu esperava que elas pudessem ser felizes. Como eu queria que elas fossem felizes.
Eu sabia que casar por escolha também não era uma garantia de felicidade. Eu mesma era uma prova de que as pessoas podiam mudar, que novas paixões podiam surgir. Mas talvez se as princesas escolhessem maridos que combinassem com elas, por quem realmente tivessem afeto, isso evitaria que seus futuros fossem como os dois pais ou o meu.
Era aquela a linha de pensamento que eu tentava evitar, porque a minha maior saudade era Pedro. Mesmo que há menos de dois dias eu estivesse nos braços dele ouvindo juras de amor. Tudo havia terminado em discussão, como era corriqueiro nos últimos tempos. Eu me perguntava se nosso relacionamento estava desgastado, se a perda de nosso filho havia nos afastado de uma forma irreversível.
Ou talvez fosse essa sombra da minha partida, que fazia com que nós buscássemos outros culpados. Parecia um futuro distante, mas agora batia em nossa porta e nenhum de nós parecia saber como lidar com isso. E estávamos lidando da pior maneira possível, em embates frequentes, discussões, acusações. Estragávamos nossos momentos de paz como se não fossem merecidos.
Talvez o ar de Petrópolis me lembrasse Pedro. Me transportasse a um tempo diferente, em que ele não hesitaria em fazer uma viagem impensada para me encontrar. Um tempo onde ele ao menos questionaria meus planos de viagem acompanhada apenas de Dumas e dos mais jovens. Pedro parecia tão cansado quanto eu de nossas brigas, mas não encontrávamos uma forma de pará-las.
Eu o amava tanto que aquele amor fazia parte de mim, de quem eu era, de como me via. Mesmo sabendo meu papel, eu nunca havia me sentido de lado em sua vida. Eu sabia que era uma prioridade tão importante quanto sua família. Mas a perda de nosso bebê despertou tantas inseguranças sobre nós dois.
Nas últimas semanas eu me sentia como uma expectadora. Pesava cada vez mais a forma como a Imperatriz me julgava. Saber que Dina também sabia de nosso relacionamento também era um duro golpe. Eu me sentia prestes a fugir daquela realidade. A ironia era que minha maior fuga era ele. E sem Pedro eu me sentia frágil.
Não era nosso primeiro momento de crise, mas certamente era o mais difícil deles. Eu ainda me sentia fragilizada e sabia que Pedro também. Mas, por algum motivo, não éramos capazes de encontrar a força um no outro. E tal pensamento me dilacerava e me dividia.
Ver o amor nascendo entre as princesas e seus príncipes me recordava daquele momento em que tudo aconteceu comigo e com Pedro. Eu soube que o amaria no primeiro olhar, como se nossas almas fossem ligadas por uma conexão inexplicável. E era aquele o tipo de amor que gostaria que minhas princesas experimentassem.
Acompanhei Isabel e Gastão em seus passeios durante todo o dia. Propositalmente mantive a distância, o que me fez ter tempo para pensar e sentir. E tantos sentimentos me deixaram preocupada, incapaz de me desligar do mundo mesmo quando tudo virou escuridão.
Era uma noite fria e sentia falta de Pedro. Me sentia frustrada por uma tola expectativa de que ele pudesse aparecer por ali, mesmo sabendo que Pedro estava ocupado demais governando o país. Eu apenas o queria comigo e apenas nos queria em paz, sem medos ou discussões.
Perdida em pensamentos eu acreditei que era apenas impressão que a porta tinha sido aberta. Mas a cama afundou atrás de mim e de repente senti o braço dele me envolvendo, seu corpo colando no meu. Seu cheiro familiar, muito mais do que o de Petrópolis. De muito mais amor e muito mais saudade.
O susto inicial deu lugar a uma completa entrega. Pedro não falou nada, apenas permaneceu me abraçando. Seus lábios tocavam levemente meu ombro e eu ouvia sua respiração. Entrelacei nossos dedos, me aninhando ainda mais à ele. Eu só precisava daquilo, só precisava de Pedro.
- Você é o amor da minha vida. – ele disse tão baixo que se não estivesse grudado em mim eu não ouviria. – A pessoa que mudou minha vida, que deu sentido à tudo.
Eu suspirei, sentindo uma lágrima escorrer.
- Eu queria dar a você esse espaço, mas eu não consegui. – Pedro beijou meus cabelos. – Eu não consegui, meu amor.
- Eu não quero espaço. – respondi tão baixo quanto ele. – Quero você por perto. Quero nós dois.
- Me desculpe pelos últimos dias. A ideia de perdê-la tem me feito agir de forma irracional. – ele me abraçou mais forte.
E meu silêncio foi sem saber se queria prolongar a conversa.
- Eu te amo tanto. – ele disse triste. – Tanto.
- Eu também, meu amor. – virei em sua direção, acariciando seu rosto. – Mais do que tudo.
- Não quero mais discutir, Luísa. – Pedro também acariciou meu rosto. – Não posso mais discutir com você. Eu me sinto perdido sem saber se estamos em paz e destruído quando sei que não estamos.
- Eu também. – me aproximei e encostei minha testa na dele. – Você é minha força, Pedro. Eu preciso de você.
- E eu de você, meu amor. Estou sentindo sua falta.
Passei o polegar pelos lábios de Pedro antes de beijá-lo. Tão lentamente, como se estivéssemos redescobrindo um ao outro, como se qualquer coisa pudesse quebrar aquele momento. Mas nada aconteceu além de nosso amor, do desejo crescendo, da sensação familiar de estar com o homem que eu amava.
A lua iluminada o quarto, palco de tantas outras vezes em que estivemos lá. Quando nossos lábios não estavam juntos nossos olhares se encontravam. E foi assim que tiramos nossas roupas, que Pedro deitou-se em cima de mim. Me fez dele e se fez meu. Era mais do que prazer, era nosso amor mais genuíno.
- Eu te amo. – ele sussurrou contra os meus lábios.
E quando eu estava com ele tudo parecia estar no lugar.