A primeira semente de Romã - Kore

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O tempo, ou pelo menos a concepção que os mortais têm de tempo, me fez amar o contraste entre o calor do sol em minha pele imortal e o chá gelado entre meus lábios. Mas sentada neste campo colorido, junto às minhas criações - as quais apelidei de rosas - cresce em mim a ânsia por algo maior que os vilarejos que minha mãe insiste em me mostrar. Ao contrário do que muitos imaginam, eu conheço a vida no Olimpo e toda a pompa dos outros deuses e eu prefiro conviver com as Ninfas e Oceânides.

...

Já passa do final da tarde, escuto Enna me chamar "Lady Kore! Lady Kore! Lady Deméter chegou do Olimpo" e com isso eu sabia que um dos meus poucos momentos de liberdade tinha acabado, caprichei em meu sorriso diplomático e respondi "Enna, minha querida, diga a mamãe que estou indo" Enna sorriu de volta e correu para comunicar a Lady Deméter que seu bichinho estava voltando. Não me entendam mal, eu amo minha mãe, amo mesmo mas relações familiares são difíceis; Zeus, meu pai, provavelmente nem lembra que eu existo e minha mãe me fez a razão de sua existência imortal. Eu suspirei e me levantei, levando meus papiros e a xícara vazia de chá para casa. Ao passar pela porta vejo a mamãe sentada à minha espera, com um sorriso que é capaz de criar uma primavera particular para quem o recebe e é impossível não sorrir de volta.

Eu sempre me surpreendo com sua beleza. Mamãe é uma das Deusas mais bonitas que eu conheço, sua pele negra reluz na luz fraca, seu cabelo castanho é longo, cacheado e cheio - não é à toa que é conhecida como Deméter dos cabelos bonitos - e faz o par perfeito para seus olhos cor de ocre. Ela ainda estava com o Quíton que colocou para ir ao Olimpo, ele é branco preso a um medalhão com desenho de trigo. A roupa marcava bem o corpo curvilíneo de minha mãe, o que a deixava ainda mais deslumbrante.

"Minha filha perfeita, como passou o dia?" a deusa da colheita me perguntou com um abraço

"Fiquei lendo mamãe, como foi no Olimpo? como estão todos?" perguntei sem me importar de verdade "A querida, fomos convocados para discutirmos a situação com Tifeu, Hades estava com raiva porque Zeus complicou o trabalho dele no Submundo. Todos como sempre estão sendo irracionais, mas isso não é nada para a sua cabeça se preocupar meu grãozinho" Hades, o rei do submundo estava no Olimpo e eu não estava lá para vê-lo? Não que eu já o tivesse visto, minha mãe não gosta dele e mandou eu ficar distante dos assuntos de Plutão, mas eu tenho muita curiosidade. Nenhuma das ninfas que vivem no mundo mortal ou Olimpo o conhecem, dizem que ele chega com o seu famoso elmo da invisibilidade e só o tira na frente dos outros deuses ou no mundo inferior.

E quando eu consegui uma mera descrição, a ninfa de um dos rios do submundo falou que ele era o ser mais horrendo que ela já tinha visto e que conseguia superar a feiura de Hefesto. Bom, eu conheço Hefesto e ele não é nada feio, as pessoas costumam fazer comentários maldosos porque ele é diferente, por isso acredito que Hades também não deve ser 'horrível'. Dei fim aos meus devaneios e sorri para minha mãe em resposta, ela pegou minhas mãos e disse "Venha, me ajude a preparar o jantar" olhei a expressão cansada da deusa e beijei sua testa "mamãe, por que você não vai tomar um banho? deixa que eu te preparo um prato de Choriatiki e para sobremesa Baklava" mamãe gargalhou e me disse "você me acostuma mal" eu pisquei e ela saltitou para o banho. E esses momentos de cumplicidade me fazem esquecer que eu quero mais, eu preciso de mais, eu mereço mais.

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*Kore é o primeiro nome de Lady Persefóne, ela só recebe o nome Persefóne depois de ir ao Submundo

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