Quando acordo, tenho a nítida sensação de que ainda estou sonhando. O quarto ao meu redor é branco e dourado, a cama de dossel é macia e tem mais travesseiros do que eu poderia sonhar. Minhas armas estão enfileiradas em uma mesa de mogno e um espelho oval mostra meu reflexo em meio aos lençóis de seda. Não pareço muito masculina, talvez seja porque tomei um bom banho pela primeira vez desde que me alistei. Um banho com água quente em uma banheira, em um cômodo fechado onde pude tirar toda minha roupa para me esfregar. Também não sei há quanto tempo não me vejo no espelho, mas reparo que meus cabelos cresceram um pouco e estão começando a cobrir minhas orelhas.
Me espreguiço e engatinho em direção às minhas roupas em uma cadeira do outro lado da cama, repassando mentalmente todos os acontecimentos de ontem.
O Dragão não foi encontrado e eu sou o novo capitão da guarda pessoal do príncipe.
Santo Deus!
Não vou ficar pensando demais nisso, decido, enfiando minha calça de montaria e a camisa preta. Depois a máscara. Preciso mais do que nunca parecer um homem, embora eu esteja dormindo no quarto adjacente ao do príncipe, ou seja, no quarto que supostamente um dia será da esposa do príncipe Arjun.
Essa é outra coisa que não me permito pensar muito.
Quando estou caracterizada como capitão Shang, abro a porta que separa meus aposentos do dele. Arjun está em pé no meio do quarto, vestido em tons de creme, dourado e verde escuro. O cabelo está preso em um rabo de cavalo alto com um prendedor de ouro que imita uma pequena coroa e algumas mechas lisas escorrem soltas nas laterais. Parece mais elegante do que eu jamais consegui fazer com meus cabelos. Seu colete é de veludo verde com fios de ouro e as luvas, que assim como as de ontem deixam seus dedos de fora, combinam com o colete e com as calças.
Quando entro Dan Dan está no meio do processo de borrifa-lo com um perfume que lembra o cheiro das florestas de bambu. Eu espirro e Arjun se vira para mim, acenando alegremente. Dan Dan faz cara feia, deixa o perfume de lado e passa a procurar algo especial entre as diversas caixas de joias abertas na cômoda.
— Bom dia, capitão! — cumprimenta a mesma criada de ontem, parada no canto segurando um espelho de mão para o príncipe e uma toalha pendurada no braço. Ela troca o peso de um pé e outro como se estivesse nervosa com a minha presença. — Dormiu bem?
— Perfeitamente bem, obrigado... — Tentou lembrar seu nome, mas é impossível. — Pela preocupação.
— O príncipe quer saber se você deseja algo especial para o desjejum. — gagueja a criada. Viro-me para Arjun, que mexe os dedos rapidamente. — Sua alteza o está convidando para tomar café com ele assim que terminar de se vestir.
Dan Dan deixa cair uma caixinha e vira-se surpresa para o príncipe.
— JunJun, você está convidando um soldado para comer com você? Um homem do Regente? — pergunta ela horrorizada.
JunJun entorta a cabeça, então move os dedos. Eu olho para a criada, esperando uma tradução.
— Ele está dizendo que vai ser bom te conhecer melhor, já que você é o novo segurança dele.
Aceno agradecida.
— Nesse caso, vossa alteza, aceito o convite com prazer.
Arjun sorri satisfeito e Dan Dan bufa, voltando a procurar o que quer que estivesse procurando antes.
— Vou precisar aprender a língua de sinais — digo para ninguém em particular, mas Arjun aponta para a mesa de desenho, onde há um bloquinho novo e uma pena branca.
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Qingshan e o imperador
RomanceO imperador está morto, o Regente não se importa com o povo e o príncipe não é capaz de governar. Nesta releitura da balada de Hua Mulan, a família de Li Qingshan não possui homens e as coisas estão cada vez piores para ela e sua mãe. Quando mergulh...