o famoso bilhete.

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Quando mais novo, pensava que os monstros viviam debaixo da minha cama. Hoje, anos depois, descobri que, na realidade, os tais vivem em boas casas e nós os chamamos de seres humanos.

Meu ex namorado — e uma boba paixão criada apenas por eu próprio, aparentemente — é um deles. Segundo Jungwon, um de meus amigos, ele diz que não tenho culpa quanto a entregar meu coração a alguém, pois faz parte do amadurecimento emocional em si, acho.

Só que isso não impede de sentir o que sinto, a dor que arde e que consome. Semelhante a uma alergia, que irrita de modo constante e ativo, os últimos dias têm sido uma tormenta. Logo mais as férias escolares vão acabar, terei de enfrentar os demais colegas, e, principalmente, o dito cujo que partiu a droga do meu coração em mil pedacinhos.

É sexta. Jungwon viajou dias antes da tragédia que me acometeu, restando, então, meu outro melhor amigo, o adorável e serelepe, Nishimura Riki. Ele demora algumas horas em casa, apenas para me ver chorar enquanto assisto o filme mais besta do mundo, o qual, sinceramente, nem é tão água com açúcar assim.

Niki, com o prato em mãos, contendo uma parte da torta de frango feita por minha mãe, prova um pedaço desta. Bebe um gole do suco, dizendo, em seguida:

— Você sabe que o castelo animado nem é tão sentimental, né? — encarei ele, minha feição provavelmente toda destruída, já que Niki suavizou o olhar. — Jungwon hyung pediu pra eu tentar te consolar, você sabe que eu não sei fazer isso, mas vamos lá. — suspirou, respirando fundo, deixando de lado a comida. — Você, incrível. Seu ex, babaca. Mas, sério, ele é um completo idiota por te deixar. Vai, liga lá pra aquela sua lanchonete preferida e pede o que quiser, eu pago.

Levo alguns instantes para processar o que me foi dito, apreciando o tal gesto. Niki, diferente de Jungwon, tem sua própria maneira de lidar com as coisas, mesmo que isso signifique o oposto do recomendado. Jungwon diria palavras doces, e tentaria fazer eu sair de casa. Niki, não. Ele tende a usar grana e comida pra resolver seus problemas, e segundo ele, funciona direitinho.

O celular de Niki tem uma senha difícil, tem uma foto de nós três como fundo e é cheio de aplicativos misturados. Há sempre uma grande possibilidade de você ver o aparelho dizendo as seguintes palavras: armazenamento cheio.

— Lanchonete Killer Queen, no que posso ser útil? — é uma voz terna e gentil, e não a reconheço, infelizmente. Geralmente, é Heeseung hyung quem atende às ligações, o que talvez signifique que ele possa estar em sua folga. Ou seja, sem chances de eu dizer o de sempre, visto que isso ocorreu.

— Eu gostaria do combo grande — começo, e ao notar a fragilidade da minha própria voz, tusso um pouco longe do aparelho eletrônico, retornando em seguida: — E um pote médio de sorvete sabor maçã verde, pode colocar cobertura de chocolate no sorvete?

— É claro, deseja mais alguma coisa?

Respondo que não, ele repassa as informações e eu as confirmo — vem mais batatas no combo escolhido, além de que os acompanhamentos são mais variados, mesmo que seja um pouquinho mais caro — cito meu endereço, finalizando a chamada logo após isso.

— Vai ficar bem mesmo? — Niki pergunta parado perto da porta, a mão na cintura. Sorrio fraquinho, assentindo para ele. — Me desculpa não poder ficar mais, sabe como é minha mãe.

— Manda um beijo pra ela, okay? E se cuida. — o abraço, ganhando um beijinho na bochecha no final.

É sexta e o silêncio reina na casa. De maneira geral, minha mãe saiu com seu novo namorado e meu pai está na sua segunda lua de mel com minha madrasta — dessa vez, levaram minha irmã, e apesar de ter sido chamado, não tinha cabeça o suficiente pra aguentar.

Me deito no sofá, a tela mostrando títulos semelhantes, e, sem tanta paciência, desligo a mesma. É assustador o quão profundo se torna o silêncio após isso, se assemelhando ao ato final de uma importante peça de teatro.

Meu celular apita, sinalizando uma mensagem de Niki, a tal sobre o meu pedido já ter saído. Leva, relativamente, quinze minutos entre os pontos, portanto ganho um bom tempo para tomar banho antes disso.

Enquanto sinto a água recair sobre mim, fico remoendo todos os fatores que fizeram meu relacionamento acabar. Não éramos o casal mais popular da escola, estávamos longe disso, mas todos que sabiam da relação, diziam o quão bonitos ficávamos juntos.

Os verbos passados doem, tornam tudo real, vívido, sombrio. Levou semanas até que eu percebesse suas intenções, para, em seguida, acabar com o namoro. Vieram as férias escolares, um tempo conturbado.

Foram apenas meses — poucos, tardios, e às vezes gritantes — e hoje tudo virou pó. Saio do quarto usando um conjunto de moletom, caminhando até a porta com certa lentidão, e a abro. Heeseung hyung exibe um sorriso atencioso, o meu pedido em mãos. Ele é próximo de Niki, e sempre que pode, me defende dos meninos mais velhos.

— Niki contou-me do ocorrido, precisa de algo? — questiona, adentrando em seguida. Empurro a porta, e o vejo caminhar até a cozinha. Lhe sigo, nada dizendo. Vendo meu estado, Heeseung deixa as coisas sobre a mesa e me abraça fortemente.

Não sabia que precisava chorar tanto até me ver grudado a Heeseung, onde seu perfume é familiar e seu aperto protetor guarda consigo todas as mágicas que desconheço como são feitas.

— Você não precisa ficar, tem trabalho. — murmurei meio choroso, a respiração se acalmando aos poucos. Juro que podia ouvir as batidas de seu coração, cujo ritmo aparentava aceleração. Ele não me larga, mas, naquele instante, também não queria sair do conforto de seu abraço. — Vão descontar do seu salário todo esse atraso.

— Não posso te deixar aqui desse jeito. — respondeu, a voz suave, se assemelhando a veludo. Respiro fundo, me afastando um pouco dele e o mesmo seca minhas lágrimas. Sei que, ainda almejando que ele fique, há outras prioridades no momento.

— Vou ficar bem, acredite. — digo, uma espécie de mantra para eu próprio, que nem mesmo parecia verdadeira naquele instante. Heeseung me olha duvidoso, não crendo em nada do que eu disse, mas assente, sabendo que não adianta forçar, me fecharia ainda mais.

Novamente, o silêncio, e ele, para mim, parecia um velho conhecido. Levanto-me do sofá — mal notei quando Heeseung trouxe-me aqui — e caminho até a cozinha. Encaro todo aquele dinheiro de Niki gasto, sorrindo fraquinho, sequer crendo nisto.

Em meio a grande porção de fritas, por entre os acompanhamentos e a embalagem do hambúrguer, se mantém um papel mediano colado no pote de sorvete, e percebo ser um bilhete. Retiro o pote da sacola, observando a fofa caligrafia, sorrindo, ainda que involuntariamente.

"Não tenho certeza de nada, mas a visão das estrelas me faz sonhar." De princípio, a frase soa estranhamente familiar, embora, obviamente, não a reconheça; então, com cuidado, levo o bilhete até meu celular — largado de qualquer forma sobre a cama — e pesquiso a citação no Google.

Descubro ser Van Gogh, uma forte referência da arte. Paro por alguns instantes, pensando, uma reflexão se desenvolvendo enquanto volto para a cozinha, levando toda a comida para meu quarto. Mastigo uma das batatas, o Spotify reproduzindo Queen numa altura baixa; o bilhetinho se mantém na escrivaninha, não preciso dele para recordar as exatas palavras.

E a pergunta que não queria calar: quem havia escrito aquilo, afinal?

na real, a fic só nasceu por surto coletivo mesmo, mas como eu amei o desenvolver dela, cá estou eu. é minha primeira short com enhypen, então dêem bastante suporte e amor, okay? o próximo capítulo saí semana que vem, até logo mais!

Bilhetinhos para Kim Sunoo.Onde histórias criam vida. Descubra agora