Capítulo 68 - Anahí's POV

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Os dias passam, a saudade cresce.

Anahí: É legal. Assim, estou tendo bem mais trabalho do que eu tinha na U&H, mas estou gostando.

Ian: Eu ainda não aceitei essa ideia de você ter saído de lá. Tudo isso só para fugir dos almoços comigo?

Anahí: Ah meu Deus, como você adivinhou? – Brinquei e caímos na risada pela milésima vez naquele dia.

Ian havia ido até o meu apartamento naquele sábado à tarde. Dulce contara que eu havia saído da U&H. Óbvio, sem mencionar o motivo, e acho que talvez tenha sido por isso que Ian insistira para que nos víssemos. 
Parece estranho, mas eu me sentia tão bem com Ian que em pouco tempo tínhamos criado uma boa amizade. Compartilhávamos uma espécie de cumplicidade e eu me sentia extremamente confortável com ele, não a ponto de contar sobre eu e Poncho, claro.

Ian: Tá, agora falando sério, Any, por que saiu de lá assim? Numa bela segunda eu espero você e Dulce para almoçar e simplesmente recebo a notícia de que seria privado da sua companhia! Você devia ter me contado antes para que eu pudesse me preparar psicologicamente!

Anahí: Você é tão bobo! – Revirei os olhos – Desculpa não ter contado antes, mas é que eu não sabia quando iria... – Menti. A verdade é que eu não queria, e nem iria, me explicar a respeito do porquê daquela minha saída repentina da U&H – Mas, enfim, saí de lá porque recebi uma proposta melhor.

Ian: Simples assim?

Anahí: Aham! – Menti outra vez – Simples assim. – Se ele soubesse o quão complicado era.

Ian: Se você diz... Não vou insistir – Deu de ombros – Tá a fim de ver um filme?

Anahí: Se isso envolve sair de casa, não.

Ian: Ô desanimo! Por que está triste? – Encarou-me sério.

Anahí: Estou cansada, só isso. 

Ian: Triste, seus olhos não negam. – Insistiu.

Anahí: É, um pouco. – Concordei um pouco distraída.

Ian: Já te falaram que a vida é curta demais para perdermos tempo com esse negócio de tristeza?

Anahí: Toda essa psicologia barata é para me fazer sair de casa? – Ele me olhou por segundos sem dizer nada. – O quê?

Ian: E aí? Vamos?

Anahí: Ah não, Ian...

Ian: Any, gracinha, você não está entendendo, eu não estou te dando uma opção. – Levantou-se, puxando-me pela mão. Então, sem opção, eu fui. E não me arrependi. Depois de uma semana inteira chorando e pensando em Poncho, naquela tarde, pela primeira vez, eu conseguira passar mais de uma hora sem pensar nele.

Mas se naquele sábado eu quase não pensei, domingo fora o dia de pensar o dia todo. Talvez porque eu não tivesse nada para fazer, ou porque fazia exatamente uma semana daquele outro domingo, ainda muito vivo em minha memória. Era fato, se eu tivesse um segundo em que eu não estivesse fazendo nada, eu pensaria nele. Remédio? Fazer o máximo de coisas que eu conseguia. E foi fazendo isso que eu passei a semana seguinte. Trabalhava como uma louca, e quando podia ainda trazia trabalho para casa. Procurava chegar o mais tarde possível em meu apartamento, o silêncio e a solidão daquele lugar não vinham sendo uma boa companhia. Passava horas no telefone com Angel, Paulina e Ian, que mostrara-se uma ótima companhia para assistir a filmes de terror depois do expediente. 

Conforme os dias passavam minha dor diminuía um pouco, embora a saudade só aumentasse. Bom, pelo menos eu não chorava mais todas as noites, e isso era um grande avanço. 

Anahí: E aí? – Perguntava enquanto fazia um suco – Qual vai ser a programação desse final de semana? – Era sexta-feira, sete horas. Acabara de chegar em casa do trabalho, e bom, Ian estava comigo para mais uma sessão de filmes de terror.

Ian: Já se recuperou do salto de paraquedas? – Sim, paraquedas. Era esse tipo de coisa que eu e Ian vínhamos fazendo nos últimos quatro finais de semana. Acabara descobrindo um ótimo remédio para afastar todos os pensamentos. Adrenalina. Toda aquela euforia momentânea me dava uma sensação de liberdade e completude que realmente não condiziam com o que acontecia dentro de mim. Era como se eu pudesse me sentir viva, sentir que existia um coração que ainda batia acelerado dentro do peito.

Anahí: Claro! Estou pronta para outra. O que vai ser? Mergulho? Rapel?

Ian: Pensei em algo um pouco diferente... – Disse enquanto bebericava o suco de morango que eu fizera.

Anahí: Tipo?

Ian: Nesse sábado vou para Newark...

Anahí: E o que tem em Newark?

Ian: O aniversário da minha mãe. – Eu estaquei – Queria que fosse comigo. – Como? Engasguei. Impossível, era essa a palavra. Por suposto que a mãe de Ian era a mãe de Alfonso, e junto com ela estaria toda a família dele, e pior, ele.

Anahí: Desculpa, Ian. Acho que não posso... Tenho umas coisas para fazer. – Tentei parecer natural.

Ian: Ah! Qual é? Até agora a pouco estava toda animada para o final de semana! Eu sei que não é o melhor programa do mundo, mas você vai gostar. – Não, eu não ia gostar.

Anahí: Ian, eu... – Balancei as mãos, estava nervosa, ou melhor, apavorada com a ideia – Não, eu acho que não. – Por um instante eu pensei em contar a respeito de mim e Alfonso. Mas logo minha sanidade gritou e eu desisti daquela bobagem. Por mais que Ian fosse meu amigo, eu não sabia ao certo o que ele faria se soubesse. Imaginem se ele resolvesse abrir a boca e contar para Zuria? Não, isso não. Destruir a família daquele bebezinho inocente não fazia parte do que eu chamava de projeto de vida. 

Ian: Ah, Any... – Olhou-me, e todo aquele ar brincalhão já não estava presente em seus olhos, ele parecia suplicar – Eu não quero ir sozinho.

Anahí: Mas e a sua família? O seu irmão... Eles vão estar lá.

Ian: Vão, mas eu sempre me sinto meio deslocado nessas ocasiões. Todo mundo acompanhado, achando que tem uma vida perfeita, e eu, a ovelha negra da família, sempre sendo cobrado. ‘Ian, quando vai casar?’ ou ‘Ian, não vai parar de viajar e arrumar um emprego decente?’ – Disse, retomando o ar divertido tão natural dele. Mas o que eu conhecia dele me permitia ver que por traz daquele ar zombeteiro ele realmente se incomodava com tudo aquilo. 

Anahí: Pelo menos os meios que você tem de ganhar dinheiro são legais! Pior seria se você vivesse à margem da lei. – Brinquei. Não sei se comentei, mas Ian era fotógrafo. Trabalhava por conta própria, e corria o mundo ganhando dinheiro aqui e ali.

Ian: Viu só? Não sou tão mau assim! Mas sério, vamos comigo. Por favor. – "Por favor"? Como eu diria não? Na verdade era muito difícil dizer não para ele. Ou porque ele insistia até que me vencesse pelo cansaço, ou porque, como agora, me olhava com aquele ar de súplica fazendo com que qualquer resquício de objeção evaporasse. Okay, respire, Anahí, não seria tão difícil assim rever Alfonso. Ou seria? Que se dane!

Inevitável, eu veria Alfonso. Inegável, eu queria vê-lo.

Palavras, apenas palavrasOnde histórias criam vida. Descubra agora