Dolly
- Ninguém me avisou que iria chegar um novo morador!. - Tentei conter a raiva que passava pelas minhas veias.
- Sério? Eu jurei que tinha contado à vocês duas sobre isso. - Dona Margaret usava de seu deboche cotidiano só para arrancar uma queixa minha.
Mas naquela noite, ela não iria conseguir.
- De qualquer modo, Senhorita, eu não vou me dar o trabalho de ajudar na mudança de ninguém amanhã, já que eu nem sabia disto. - Dei com os ombros, e antes que ela pudesse falar mais alguma palavra, saí dali.
Aceitar fazer parte do sindicato de um prédio, com certeza foi uma das piores decisões da minha vida. Parecia uma ideia legal, poder comandar o lugar onde moro, mas esse céu virou inferno.
Bati a porta do meu apartamento com a força que Deus me deu, e me joguei no sofá, eu era a única que me importava realmente com o bem estar de todos, mesmo sem ser retribuída.
- Jesus!. - Calie apareceu por cima do sofá.
- Maria! - Coloquei a mão sobre o peito sentindo meu corpo todo ficar quente de uma só vez. - Que susto, menina.
Calie deu a volta no sofá e puxou minha pernas pra cima, para que pudesse sentar ao meu lado.
- Por que bateu a porta assim? - Se largou no sofá e colocou minhas pernas sobre as suas.
- Por que entrou no meu apartamento sem eu estar presente?. - Perguntei indignada, ignorando seu questionamento.
- Responda minha pergunta.
- Responda você, pivete!
- Não se esqueça que eu sou a única da família que ainda fala com você. - Usou o mesmo papo de sempre, para poder arrancar minhas respostas.
- De novo isso?...Você está igual a
à eles, Calie. Cada vez mais parecida. - Me levantei repentinamente e sentei na poltrona ao lado. - Se quer saber, tenho problemas pra resolver.- E?.
- Vá para seu quarto - Apontei com o queixo para a porta. - Seu pônei não é de enfeite, dê cenouras pra ele.
Calie se levantou me olhando e caminhou até a porta.
- Até mais. - Falou antes de entrar no quarto de hóspedes. já estava tarde, por volta das 23:00, não poderia mandar ela ir embora -- por mais que eu quisesse. --
Joguei a cabeça pra trás amarrando meu cabelo de qualquer forma, deixando fios soltos caídos sobre minha testa, e peguei os papéis encima da mesinha de centro.
Fechei um pouco os olhos para ver melhor as letras pequenas, e acendi o abajur.
- Então lembre-se: Natal, é sinônimo de nascimento, ou, renascimento. É tempo de viver intensamente, e não deixar os sentimentos trancados como um diário. É hora de se libertar, de falar e se expressar, esse é o momento de amar. - Falei decorando a fala e sorri ao perceber que havia aprendido todo o texto.
Mermão, esse é o tempo de amar!
Levantei da poltrona e bati as mãos uma contra a outra em forma de vitória.
Escutei um barulho agudo parecido com o som de uma guitarra, mas ignorei, ninguém no prédio tinha uma guitarra.
- Coisa da minha cabeça tonta. - Revirei os olhos e fui para meu quarto. Eu estava pronta pra dormir em quatro minutos, com meu vestido de cetim rosa e minhas pantufas felpudas.
Deitei de bruços, como costumava deitar na minha cama, e me cobri com meu lençol que era rosa pastel, igual o resto do quarto.
Estava prestes a cochilar quando escutei novamente o som de guitarra. Franzi o cenho e afastei as cobertas me arrastando para fora da cama.
- Capeta. - Me coloquei sobre os pés e caminhei até a sala. - O que é isso? - O som voltou a soar e não parou mais, era uma melodia metálica.
Olhei para a porta do quarto de Calie, e olhei para a porta do apartamento.
Suspirei e decidi ir ver o que era aquele barulho, toquei a maçaneta mas voltei.
[...]
- O que é essa frigideira na sua mão?. - Dona Margaret me encarava como se eu fosse uma maluca que fugiu do manicômio.
- Só por precaução!. - Dei de ombros. - Então, Vamos resolver esse problema?
Notei uma risada sair dos lábios finos da mulher.
- Olha a hora! Eu sou uma velha senhora, não saio daqui nem com esse apartamento em chamas. - Fechou a porta na minha cara.
Fechei o punho antes de poder falar alguma coisa. Ela realmente fez isso?
- Dona Margaret? - Estava para bater em sua porta, mas vi que o som havia parado. - Até que enfim.
Sorri em satisfação e segui o corredor, indo pra meu apartamento. Estava tudo em paz novamente, conseguiria dormir 8 horas perfeitas, e no outro dia...
[...]
01:15
O barulho voltou a incomodar meu apartamento.
- Mas não é possível!- Peguei a frigideira que havia deixado na escrivaninha por precaução e me levantei novamente da cama.
Saí do meu apartamento com o santo virado pro sol, e segui o som daquela guitarra maldita, amaldiçoada pelos infernos.
O barulho vinha do apartamento 106, ninguém morava naquele apartamento, mas pelo que Margaret havia dito, no outro dia alguém se mudaria para lá.
Olhei para a campainha por um breve momento, mas nem se quer passou pela minha cabeça toca-la.
Segui meu impulsos e acabei espancando a porta.
Depois de pelo menos eu deixar meus punhos roxos, a porta finalmente se abriu.
Deixei meus olhos focados na roupa da pessoa, que era masculina, para não ficar mais nervosa, e soltei tudo que eu precisava naquele momento.
- Olha aqui seu filho da puta, desgraçado, mulambo de bosta. Eu não sei se você percebeu, mas são quase duas horas da manhã e tem vizinho querendo dormir. - Finalmente olhei em seus olhos.
Foi como uma corrente elétrica de demência misturada com espanto, a Calma que aquele garoto carregava no olhar me deixou em estado de maconha.
Meu olhar permaneceu fixo em seus olhos castanhos, que por sua vez não hesitaram em passear por todo meu rosto e corpo.
- Tá, mas você vai me bater com essa frigideira?. - Olhei para a panela em minha mão e voltei a encara-lo.
- Se você tocar de novo essa porcaria, eu vou sim. - Usei meu olhar mais mortal e me virei pra seguir o corredor de volta ao meu apartamento.
Toquei a maçaneta da minha porta e assim que coloquei o pé para dentro de casa, o som da guitarra mais uma vez invadiu o ambiente.
- Não é possível.
Alarguei os passos, e firmei os pés no chão, se eu estivesse de salto com certeza teria furado o concreto.
Voltei ao apartamento 106 e estava prestes a arrombar aquela porta na base da frigideirada, mas ela foi repentinamente aberta o que me fez dar um passo pra trás.
Coloquei a frigideira na frente do rosto e encarei com o olho esquerdo aquela cena.
- Babaca de merda.
O imbecil do vizinho 106 estava me esperando na porta com uma guitarra preta nas mãos.
Oie, comentem o que acharam do primeiro capítulo 🥕
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Meu Garoto Guitarrista
RomanceComo se já não bastassem os problemas da vida, ainda me vem um Guitarrista, vigarista, com pinta de artista querendo atormentar o resto de paciência que resta nessa minha consciência.