Os personagens de Saint Seiya pertencem ao tio Kurumada, infelizmente. Se fossem meus, além de eu estar rica, os cavaleiros teriam mais sorte na vida.
A PROVA FINAL
Chiisana Hana
– Eu sei que está com saudade, mas a mamãe tem muita coisa pra fazer – a garotinha chinesa murmurava para sua boneca, a primeira das poucas que possuía e sua preferida a quem ela deu o nome de Ming-Na.
A boneca de tecido com longos cabelos de lã macia havia sido um presente que o Mestre Ancião lhe deu pouco depois de adotá-la. Oito anos se passaram e a boneca continuava como nova por conta do cuidado da sua pequena dona, que a mantinha limpa e longe de qualquer coisa que pudesse danificá-la.
Até pouco tempo atrás, Shunrei passava boas horas brincando com seu pequeno tesouro de pano, entretanto, agora que estava mais crescida, passou a ajudar nas tarefas da casa e as brincadeiras com sua filha ficaram para as poucas horas livres. O tempo ficou ainda mais escasso depois que os dois garotos chegaram. Os dois passavam a maior parte do dia fora de casa, dedicando-se ao treinamento para cavaleiro, mesmo assim as tarefas domésticas aumentaram. Era preciso fazer mais comida, havia mais roupa e mais louça pra lavar e dona Mei-Ling, a senhora que o Mestre contratou para cuidar da casa, não gostava quando a menina fazia corpo mole. Felizmente o menino de olhos claros era muito educado, limpo, mantinha suas coisas em ordem e não dava nenhum trabalho extra. Shunrei encantou-se por ele assim que o viu chegar e o sentimento só ia aumentando com o passar dos dias.
Já com o garoto de pele e olhos escuros não havia como se entender bem. Era grosseiro, bagunceiro, porquinho e debochado, além de sempre arrumar confusão pelo povoado. Shunrei apenas tolerava a presença dele e tentava interagir o mínimo possível a fim de evitar qualquer problema.
Todos os dias, depois de ajudar nos afazeres domésticos e fazer a lição que o Mestre lhe dava, Shunrei costumava sair para bisbilhotar o treinamento dos garotos. Não entendia muito bem do que se tratava tudo aquilo, esse negócio de virar cavaleiro, e achava o Mestre exigente demais com eles, mas se divertia observando e criando histórias em sua cabecinha infantil. Gostava de pensar em Shiryu como o pai da sua estimada Ming-Na nas brincadeiras de casinha e o ar de seriedade que o pequeno sempre carregava o deixava parecendo um mini adulto e só reforçava essa impressão.
Anos se passaram, Ming-Na e as outras bonecas acabaram relegadas a um cantinho decorativo no quarto de Shunrei, mas ela continuava a imaginar Shiryu como o pai de seus filhos. Entendeu que o que sentiu por ele desde o primeiro dia foi amor e, embora ele nunca tenha dado um sinal claro de que a correspondia, ela continuava a sonhar com o dia em que ele finalmente se declararia e então a beijaria.
Acreditava que teriam tempo até se dar conta de que o treinamento estava chegando ao fim. A prova final seria dentro de poucos dias e ela não fazia ideia do que viria depois. Nem Shiryu nem o Mestre falavam sobre isso, mas era claríssima a tensão no ar.
Na véspera do teste, ela preparou um jantar especial com os pratos preferidos de Shiryu, o qual comeu e ainda repetiu. A gentileza não passou despercebida e, depois da refeição, ele a convidou para um passeio pela montanha.
– Obrigado pelo jantar – ele disse enquanto andavam pelo bosque iluminado pela luz da lua cheia. – Estava incrível.
– De nada. Foi para te animar e desejar boa sorte amanhã. Já está acabando... – Shunrei engoliu em seco. Não queria chorar, mas seus olhos ficaram marejados, então ela se virou para o outro lado, como se olhasse algo naquela direção e disfarçadamente os enxugou. – E depois? O que você vai fazer?
– Depende do resultado.
– Você vai conseguir, é claro – ela disse, com uma convicção que nem ele mesmo possuía.
– Espero que sim. Já tentei várias vezes e essa vai ser a última chance que terei de inverter o fluxo da cachoeira. Quero acreditar que dessa vez conseguirei, mas...
– Claro que vai conseguir! – ela insistiu. – Mas e depois? Você pensa em ir embora?
– Eu não sei... – ele respondeu com sinceridade. Estava tão focado na tarefa que realmente ainda não havia parado para pensar no que viria depois. – Eu realmente não sei, Shunrei.
Nenhum dos dois ousou falar por alguns minutos, continuaram caminhando em silêncio. Depois conversaram amenidades, evitando o assunto da prova, até que ficou tarde e resolveram voltar para casa. Shunrei desejou a Shiryu boa noite e boa sorte, então cada um recolheu-se em seu quarto mas nenhum dos dois adormeceu de imediato.
Shunrei vestiu o pijama e deitou-se na cama, mas em vez de dormir, começou a rezar por seu amado, para ele passar na prova e também para que permanecesse em Rozan após. Depois de seis anos com a presença dele na casa, o lugar ficaria terrivelmente vazio sem ele. E não era um medo infundado, era uma possibilidade muito real. Ela o conhecia muito bem, sabia que ele era orgulhoso demais para continuar morando na casa do Mestre depois de falhar. A única chance de ele ficar era passando no teste e se tornando um cavaleiro. Ainda assim, Shunrei temia que ele precisasse ir embora depois de obter a armadura, afinal não se sabia ao certo que obrigações ele teria com a tal fundação que o enviou para o treinamento.
Enquanto ela se dedicava às orações, Shiryu se revirava em sua cama. Precisava superar sua prova final, tinha de fazê-lo, treinou todos esses anos por isso e não queria decepcionar o Mestre. Mas o que faria se não conseguisse? A pequena conversa que tivera há pouco com Shunrei o despertara para essa possibilidade. O Mestre permitiria que continuasse morando naquela casa? Ele teria coragem de ficar depois de uma falha? Com que cara enfrentaria o Mestre? E Shunrei? Como enfrentaria ambos se fosse um fracassado?
O jovem discípulo ponderou por um longo tempo até chegar a uma conclusão: não deixaria Rozan sob hipótese alguma. Com o tempo, a vergonha diminuiria e os dois perdoariam sua falha. Sim, podia tolerar o fracasso, daria um jeito, mudaria para outra casa, arrumaria um trabalho comum. Podia conceber falhar na prova porém ficar longe das duas únicas pessoas que amava nesse mundo era algo inconcebível.
Com essa certeza acalmando seu coração, Shiryu finalmente adormeceu.
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A Prova Final
ФанфикDepois de seis anos, o treinamento de Shiryu estava chegando ao fim. A prova final seria dentro de poucos dias, nem ele nem o Mestre tocavam no assunto, mas havia uma tensão no ar e não era somente por causa da prova. Terceira fic da série Interlúd...