28. Gabi

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Janet King me encara do alto de sua imponência. Sua figura ostenta arrogância e orgulho pautado em sua roupa, bolsa e sapatos caríssimos, sua maquiagem impecável e seu penteado distintamente elaborado. Seu olhar é tão frio que congela os meus ossos. Ela permanece calada, me avaliando,  me perscrutando. Então sento na cama encostada na cabeceira da cama e resolvo falar na tentativa de cotar aquele clima tenso.

- Bom dia, Sra. King.

O que é impossível,  nem se eu tivesse uma faca afiada e enorme conseguiria cortar o clima pesado que ela instaurara com sua chegada ao quarto.

- Gostaria de sentar? - tento mais uma vez apontando para uma cadeira ao lado da cama em que estou deitada.

- Eu não vim aqui para uma visita cordial.

Não achei que viesse.

Ela permanece em pé,  mas se aproxima mais da cama.

-O meu filho está cego por você. -ela dá um sorriso ainda mais gelado. - Sabe, é como um fetiche. Homens pretos precisam ter ao menos uma vez na cama uma mulher branca.

Arregalo os olhos mediante àquela afirmação altamente preconceituosa.  Aquilo me choca, mas permaneço calada.

- Eu entendo até,  não devia, mas entendo. O problema foi que você não passou somente uma vez pela cama do meu filho. Veja... - ela estende os braços apontando pra mim na cama. - Você continua na cama de Aaron. Você foi tão esperta que arrumou logo uma gravidez.

-Sra. Janet... - apesar da minha personalidade pacífica, quero retrucar, mas ela não permite e me corta completamente.

-Ele está determinado a casar com você.

-Eu o amo. - digo e ela gargalha.

- Não me faça rir. Quando você olha para o meu filho vê apenas cifras. Ele é seu futuro certo, confiável. E essa criança que carrega no ventre é sua garantia.

-Eu sinto muito que a senhora pense assim, mas...

-Mas o que? - ela me corta novamente. - Você já viu uma mulher branca com um preto pobre? Claro que não. Você é linda, não posso negar, mas não tem profissão definida, trabalha como garçonete em Miami,  seus pais têm um restaurantezinho em Nova Jersey.

É,  pelo visto ela me investigou.

- Como eu disse,  eu realmente sinto muito que a senhora pense assim. - ela abre a boca pra me cortar, mas dessa vez não permito. - Eu e o Aaron nos amamos. É um sentimento puro e bom e eu não vou deixar que a senhora o contamine com seu preconceito.

-Está dizendo que isso é preconceito reverso? - ela pergunta com ironia.

- Não. Até porque não acho que isso exista. Conheço a história,  Sra. King, sei que ao longo dela os negros sofreram horrores. Sei que continuam sofrendo, pois por mais que as escravidão tenha acabado,  o preconceito continua.

- Você não pode saber de nada. É branca. Nunca sentiu na pele.

-A senhora tem razão. Nunca senti. Mas a senhora não é a única a senti-lo. O preconceito sempre esteve presente na minha família. Se a senhora me investigou,  deve saber. Meu pai branco se casou com uma latina. Eles sofreram preconceito por isso. Seu irmão branco gay também sofre por isso. Meu irmão mais novo é cadeirante e sofre. Então,  Sra. King, não venha falar comigo como se só a senhora no mundo tenha sofrido preconceito. -ela me encara sem dizer nada, mas vejo raiva em seus olhos. -Eu sinto muito, de verdade, por você ter sofrido, mas não posso admitir que desconte em mim toda a sua dor. Eu amo seu filho. Ele me ama também,  não por eu ser branca ou por um fetiche. Ele ama quem sou e o que sou. Com defeitos e qualidades. Estou grávida de um bebê que é fruto desse amor. -toco em meu ventre, profeticamente. - Juntos vamos formar uma família querendo a senhora ou não.

Preconceitos (em ANDAMENTO)Onde histórias criam vida. Descubra agora