Capítulo 5

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O chão treme sob meus pés, olho em volta procurando alguma coisa em que me segurar, mas não encontro nada. Penso nas estatísticas sobre terremotos em Londres, tenho certeza de que estou vivendo uma coisa rara. As paredes do quarto se esfarelam na minha frente, o teto forma uma longa rachadura de um canto a outro, deixando o lustre delicado que Gael e eu escolhemos há alguns meses em uma situação precária. Não vejo solução melhor do que me jogar na cama e cobrir a cabeça com o travesseiro, depois fecho os olhos com vontade e quando os abro de novo, tudo voltou ao normal, mas meu coração ainda está acelerado. Koda salta na cama de um lado para outro, em um pedido claro e insistente para passear, o terremoto em forma de cachorro.

Meu cérebro tem dificuldade em se ajustar ao mundo real, em parte porque as coisas ainda giram lentamente, apesar de eu estar bem acordada. Além disso, uma dor pressiona ritmicamente minha têmpora como se alguém tentasse usar minha cabeça como papel em uma máquina de escrever. Empurro Koda gentilmente e viro de lado. Gael tem a expressão serena de um pai ausente quando o filho chora de madrugada e eu levanto, arrastando os pés e protegendo os olhos da luz que entra através das cortinas brancas. Visto um conjunto de calça e moletom com capuz com Koda me empurrando com o focinho cada vez que paro para recuperar o equilíbrio.

Desço as escadas e registro superficialmente a bagunça da festa da noite anterior, solto um gemido pensando na tristeza que é limpar a casa de ressaca, mas esse é um problema para mais tarde. Olho de relance para o sofá, onde jogamos Verdade ou Consequência há algumas horas e um pensamento fugidio escapa de mim. Cato meus óculos escuros na cesta onde jogamos tudo que não queremos esquecer antes de sair e pego a guia no pequeno armário no hall de entrada. Koda fica imóvel, sabendo que ajo em seu interesse, e saímos para a luz extra clara do dia.

A caminhada forçada começa a me despertar e os últimos acontecimentos da noite voltam com tudo. U-au! Gael e Ethan se beijaram, penso. Teria sido esquisito se não fosse tão sexy. Embora eu tenha sentido uma pontadinha de ciúme, não me pareceu errado, aqueles dois tinham química, isso eu já tinha percebido antes, o beijo só comprovou que eu tinha bons instintos. Fora só uma brincadeira, nada para me preocupar, então eu podia fantasiar inocentemente. Mas e aquele ditado: toda brincadeira tem um fundo de verdade? E se eu tivesse perdido alguma coisa? Ethan passava muito tempo comigo, mas não foram poucas as vezes em que ele e Gael saíram juntos.

Dou graças quando Koda termina de fazer o que precisava e voltamos para casa, cada passo é um esforço gigante para mim. Só quando subimos os três degraus da entrada percebo que esqueci a chave. Suspiro e toco a campainha, torcendo para Gael escutar. Também não levei o telefone, então começo um mantra combinado com um movimento repetitivo de subir e descer o último degrau. "acorda Gael acorda Gael acorda Gael..." Sento o dedo no botão e escuto o som harmonioso, mas insistente invadir a casa. Paro quando escuto a maçaneta girar. Gael aparece pela fresta, apenas um olho aberto contra o sol. Koda alarga a abertura da porta e passa voando por ele, que abre a porta totalmente para me deixar entrar. Agradeço com um beijo em sua bochecha e tiro os óculos quando a porta se fecha. Ninguém parece disposto a falar e Gael me segue até a cozinha. Aponto para a cafeteira e ele aquiesce quase imperceptivelmente, já sentado em um dos lugares à mesa da cozinha. Seus olhos, já pequenos num dia normal, estão inchados e o pouco do azul que consigo ver parece mais escuro. Respiro fundo, reunindo toda a força que tenho para proferir uma frase completa.

— Você tá bem?

Abaixo a cabeça e me apoio na bancada, exausta. Gael levanta o polegar, depois coloca os braços cruzados na mesa e apoia a cabeça neles. Bebemos o café extraforte em silêncio. Quando termina o seu, Gael abaixa a caneca e sorri para mim. Levantamos juntos e voltamos para a cama, mas antes de deitar, ele fecha a persiana e mergulhamos no mais abençoado escuro.

Você, ele, nós | Barry Keoghan + Andrew Garfield fanficOnde histórias criam vida. Descubra agora