A vida é uma dádiva. Olha as cores que ela tem... Cores são como bandas, cada uma tem seus arranjos. Ah, os tons dessa música... tudo tão esvoaçante, as vezes, tão simplório... Tão mágico.
-Eu diria utópico, mãe. - Ravi diz.
-Querido, a realidade é ideal, desde que exista. Isso por si, é utopia.
-Concordo como sempre, mãe.
-Essa fala é minha, garoto.
-Mas eu aderi, sou um filho sensato. - Ravi faz com que sua mãe contemple sua beleza mágica aos risos.
-Eu te amo.
-Eu também, mãezinha.
-Vai para o quarto, eu vou lavar as louças.
-Tá bom, já vou.
Bem, Asteria seguiu o combinado, lavou a louça, enquanto seu filho deveria ir dormir. Em seu próprio quarto. Até porque, Ravi, seu filho, tem um quarto... Mas, lá estava ele, sentado na poltrona, no quarto de sua mãe, sendo um livro qualquer de biologia, para reafirmar os pensamentos de sua mãe sobre as peculiaridades de sua criança.
-Ei, quando eu disse para ir para o quarto, eu quis dizer o seu. - disse Asteria, como se estivesse inconformada e surpresa.
-Mãe, você não acha que Cudo é um péssimo nome para um animal? Principalmente para um mamífero tão bonito, tira todo o ar elegante que ele tem. Parece apelido de cachorro.
-Mas um cachorro também é um mamífero...
-Esse não é o ponto, mãe.
-Ei, ei, ei, mocinho, eu que o diga. Não desconverse aqui. Por mais que eu ame dormir com você, não acha que está grandinho?
-Só tenho 140cm, eu sou metade de um homem. - Ravi parecia tão firme no que dizia, que sua mãe foi obrigada a rir.
-Meu pequeno sol, vem cá - Ravi deita em cima de Asteria, como se ele fosse um cobertor humano - você escovou os dentes?
-Sim, e...
-E a língua?
-Sim, claro...
-muito bem. - Asteria interrompe.
-Mãe.
-Diga - Asteria responde sabendo o que vem pela frente.
-Não acha que Pequeno Sol é meio extravagante? Faz parecer que sou espalhafatoso.
-Hm, você diz isso deitado em cima de mim, quer dizer, calor humano demais, fica bem quente, você é uma pessoa ensolarada.
-Ai você quebra meus argumentos.
-Meu filho, você nem tentou, sei que consegue fazer melhor que isso - Asteria retruca, rindo.
-Me desculpa, é o sono, eu já deveria estar dormindo, mas a sua barriga fica se mexendo demais quando você ri assim...
-Primeiro - Asteria aos poucos vai parando de rir - Eu concordo que deveria estar dormindo, mas eu comecei a rir agora, nem vem me culpar.
- E segundo? - Ravi pergunta, e Asteria que olhava as sombras dos carros que vagamente se projetavam no teto, fechou os olhos e sentiu o sorriso de seu filho se formando em cima de sua barriga, como se soubesse perfeitamente o que sua mãe iria lhe dizer...
-Meu sol, você é o melhor amigo que alguém poderia ter. - Asteria manteve seus olhos fechados.
-Obrigado por reconhecer - Ravi respondeu, com a voz abafada e levemente alterada pelo sono.
Aos poucos, mãe e filho foram vencidos pelo sono, quase simultaneamente. Era assim as noites de suas vidas. Bem, se fossem vistos por terceiros, provavelmente, diriam que era uma relação incomum, mas era ao menos, natural. Nada anormal. Uma relação familiar amistosa. Até um certo ponto, realmente seria apenas isso. Uma relação amistosa.
-Bom dia... filho? - Asteria abre os olhos e vê um Ravi pensativo, com um olhar vago, prontamente arrumado para mais um dia. - Sem sono?
Ravi acordou de seus devaneios - Oi mãe, bom dia! Não, só estava esperando você acordar - que era algo recorrente, contudo, incomum para uma criança, mas, na listas de coisas incomuns dos comportamentos de Ravi, isso nem era lá grande coisa. Bem, Asteria pensava assim, ao menos.
-Ravi, são cinco e quarenta e cinco da manhã, não é como se eu estivesse atrasada.
-Mas mãe, o sol já nasceu, está tão fresco e tudo parece tão calmo. Tão satisfatório, olhe - Ravi sugeriu, com uma plenitude louvável.
"Ótimo, Matusalém ainda vive! Estou criando um velho senhor com alguns milênios de bagagem e eu não sabia?" Foi o que Asteria pensou.
-Hm, no meu ponto de vista, é praticamente uma penumbra. Realmente calmo. Mas você não parece ter acordado exatamente agora, né. - Disse Asteria, olhando de cima a baixo para seu filho, impecável, agindo como se fosse normal estar arrumado naquele horário. Com 10 anos de idade.
-Mãe, se eu te dissesse que pessoas como eu, lindas por natureza, acordam arrumadas, você acreditaria? - Ravi soltou uma de suas pérolas.
-Eu preciso me arrumar todo dia, então não. - Asteria responde como se esse fosse exclusivamente o único motivo pelo qual ela não acreditava.
- É, faz sentido - Ravi faz uma careta para assentir - então deve ser por que sou um ser celestial e mágico.
-Filho, nunca pensei que isso fosse um problema, mas acho que você está lendo demais - Asteria força uma cara de preocupada. Bem, no fundo, talvez ela realmente estivesse.
- Talvez, se eu sou seu "sol", eu sou celestial, de um jeito ou de outro.
- É, você está lendo demais. - Asteria externizou seu pensamento mais recente.
- Errado eu não estou...
- Imagina quando esse ser virar adolescente? - Agora, Asteria ignorava seu filho com seus pensamentos em voz alta.
- Não se preocupe com o futuro, ele...
- Por favor, pare. Eu sou a médica aqui. - A mãe em busca de paz e sossego exclamou. - sinto como se eu tivesse envelhecido súbitamente.
Sim. Astéria era uma médica. Bem sucedida. Uma pediatra, infectologista. Serviu como Tenente-Coronel da Aerónautica. Sua fama, era devido a sua Tese de Doutorado sobre o combate a doenças. Uma pessoa brilhante, isso era indiscutível. Desde nova, provou a todos e a si mesma de sua capacidade. Atualmente, obteve sua própria maternidade e gerencia seu próprio negócio, algo conquistado pelo seu próprio esforço.
-Mãe, a senhora é nova demais para isso, quer dizer, nem tanto, mas... ah, envelhecer faz parte né.
-Ravi, você faz com que eu queira aplicar psicologia educacional em mim mesma.
-Eu quero comer pão com leite condensado.
-E eu queria ser jovem. A vida é assim. Sem fonte da juventude para mim. Sem leite condensado para você. E você nunca gostou de doce.
-Hm, será mesmo que não existe? - Ravi com aquele olhos âmbar semi cerrados, olhos travessos de uma criança - mãe, o dia não está com uma tinção vibrante?
-Por que diz isso? - Asteria sorri ao ver seu filho tão contente.
- Porque mãe, a senhora é minha cor favorita.
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Suficientemente Crível
Historical FictionUma história que podia ser baseada em fatos reais, mas a realidade é deprimente, então, a ficção salva.