My heart, my pain won't cover up. You left me
Congratulations, Blue October
- Daniel?
Meus olhos não queriam acreditar no que viam. Era Daniel! Ali mesmo na minha frente! Ri de alegria e alívio. Estava salva! Ainda bem porque o pouco tempo que passara fechada ali fora o suficiente para me deixar num estado próximo à loucura.
Levantei e caminhei até ele para o abraçar com força e agradecer por ser meu salvador. Apenas esperava que não pensasse que, porque me havia salvo, voltaria para sua casa. Não, isso não aconteceria, mas era um assunto para mais tarde. Naquele momento, tudo o que desejava era colocar algum - muito - espaço entre mim e aquele local.
- Estou tão contente por ver você! Obrigada!
- Oi, pequena Hannah. Está confortável?
- Nem por isso. Por favor, vamos embora daqui.
Não respondeu, se limitou a me encarar de olhos demasiado abertos e inexpressivos, com um sorriso conhecedor em seus lábios. Era uma expressão estranha e desconfortável.
- Daniel? - pressionei, me afastando para ter uma melhor visão de seu rosto.
Ele fechou a porta e sentou na cama, me chamando para junto dele.
- Não estava em segurança com aquele demônio. Ele é tão... Violento. - levantou a mão para me tocar. - Não estava bem ali, com ele.
- O quê?
- Não se preocupe. Virei ver você todos os dias. Passaremos muito tempo juntos. Não era isso que desejava, antes de ter conhecido o demônio?
Meu raciocínio tinha congelado, com certeza, porque me dizia, com todas as letras, sons e imagens, que o responsável por meu cativeiro era Daniel e isso era impossível.
Impossível.
- Não me desejava antes dele? - não me deu tempo para responder. - Vou dar a você algo para relembrar esses momentos. - quando dei conta, tinha os lábios de Daniel juntos aos meus. Não sabiam a nada, zero, mas me congelaram. Fiquei sem resposta, petrificada e, provavelmente, ele tomou isso como um acordo porque penetrou minha boca com sua língua, de um jeito que ele nunca antes fizera, de um modo carnal, luxuriante, tão pouco angelical e tão demoníaco. Contudo, não despertava as mesmas sensações que Ezra. Era estranho, mais uma vez, desconfortável e quase nauseante, apesar de, aparentemente, não existir uma razão definida para o ser.
Acordada do estado abúlico em que me colocara, tentei lutar. Coloquei as mãos em seu peito e empurrei, com tanta força quanta tinha. Forcei meus dedos contra sua camisa, numa tentativa frustrada de o afastar. Tentei fechar a boca, sei que o mordi, mas Daniel, simplesmente, não queria saber, muito pelo contrário, pareceu gostar porque continuou se impondo, com ainda mais vigor e rigidez. Esperneei, bati-lhe com os punhos cerrados, pontapeei sua canela, virei o rosto, mas nada parecia capaz de o deter. Minha mão tentou acertar em sua face, mas foi impedida e segurada no topo de minha cabeça, ao mesmo tempo que me deitava na cama, fechando meu corpo com o seu, me impedindo de mover, de fazer o que quer que fosse para o impedir, para parar aquilo.
A imagem de Ezra enchia minha cabeça, me preenchendo de culpa, mesmo sabendo que, em termos práticos, não tinha nenhuma.
E Daniel continuava passando sua língua por minha boca, continuando pregando meus braços acima de minha cabeça. Sentia sua mão fria subir no interior de minha camisola, apalpando minha pele, tocando, sentindo.
Sentia-me impotente. Sentia-me vazia. O que poderia eu fazer, se a violência, a recusa, apenas parecia agradá-lo e incitá-lo cada vez mais?
Quando me largou, por sua própria vontade, parecia feliz consigo próprio e a gargalhada que soltou, enquanto saia, só mostrou isso mesmo.
Estava feliz, por razões que não conseguia compreender.
Por outro lado, eu estava devastada. Meu corpo tremia, meu maxilar doía. Meus braços estavam dormentes.
Talvez, ele tivesse razão. Talvez, eu fosse fraca e frágil, afinal de contas.
Ficara à sua mercê e nada acontecera porque ele não quisera. Não conseguira para-lo, nem sequer abrandá-lo
Nada.Ezra’s POV
Nada.
Nem um fio de cabelo dela foi encontrado junto da Resistência. Hannah não estava lá, sem sequer lá voltara.
Analisei os fatos:
Primeiro: o anjo dissera que ela não se encontrava em sua casa.
Segundo: a Resistência garantia que ela não voltara lá.
Terceiro: definitivamente, não se encontrava em minha casa.
Bati com o punho na mesa do escritório. Já chegara há algum tempo, mas ainda não me dera ao trabalho que contornar a secretária para me sentar na cadeira. Pensava melhor em pé. As ideias fluíam melhor ou assim eu gostava de pensar porque, naquele momento, pensar era bom.
Estava ficando louco. Aquela humanazinha me deixava louco. Se tinha mesmo fugido, a primeira coisa que faria, quando a encontrasse, seria acariciar aquele seu doce traseiro com umas boas palmadas a alta velocidade. Repetidas vezes, até ela aprender que não pode, simplesmente, brincar com os sentimentos das pessoas daquela maneira.
Sentimentos? Mas quais sentimentos? Sem dúvida que estava precisando de umas agradáveis horas de sono. Já não dizia coisa com coisa.
A sensação de frustração deu lugar a um relaxe ao sentir um par de mãos suaves massajarem meus ombros e as curvas de meu pescoço.
Por momentos, pensei que fosse ela, imaginei, desejei que fosse ela. Não me virei logo por saber que, quando o fizesse, seria a face e o corpo de Eliel que veria e não o dela. Dei-me ao luxo de acalmar meus instintos, apenas o suficiente para poder sentir aqueles dedos experientes por mais um pouco, fazendo de conta que era ela e que, quando me virasse, a encontraria, com aquela camisa de noite branca que usara na noite em que a chamara a meu quarto, com os cabelos rebeldes emoldurando suas faces, como a mais bela das pinturas, como uma cortina de fogo. A inocência e a perversidade.
- Acho que já está na altura de você retribuir, não lhe parece, docinho?
Aquela voz junto a meu ouvido me gelou por completo. Era demasiado rouca, demasiado sensual, mesmo para Eliel. A conhecia de uma época distante, de um local diferente, de circunstâncias parecidas.
Afastei suas mãos e me virei para encará-la. A pele bronzeada, cor de azeitona, os cabelos negros ondulados até à cintura, os grandes olhos de gato, tão escuros quando os cabelos, aquele corpo poderoso e bem definido que eu conhecia tão bem. Não havia como ela ter sido um anjo, um dia, porque tudo nela era pecado, começando naquela boca sempre vermelha e carnuda e acabando nos confins de seu interior.
- O que é que você está fazendo aqui?
- Isso é forma de me tratar? – questionou, fazendo-se de ofendida.
- Quando você aparece, nunca nada de bom acontece. Apenas quero estar preparado para seus estragos.
- Isso foi cruel, mesmo para você, Ezra. – se sentou, com seus particulares movimentos felinos, no sofá do escritório, fazendo sua já de si curta saia mais ainda.
- Deixe de história e responda, Khaya. – ordenei, encostando na secretária.
- Sempre adorei essa sua rudeza.
Pressionei com uma sobrancelha erguida.
- Se eu disser que estava com saudades, acredita? – forçou um de seus muitos sorrisos destinados a seduzir os homens.
Não respondi.
- Oh, está bem. – assumiu uma expressão séria. – Também recebi a mensagem dos cavaleiros. Apenas quero declarar a você meu apoio.
Sondar uma mentira nela era sempre infrutífero. Simplesmente, não valia a pena, por isso, nem tentei. Khaya era a Guardiã do Círculo da Fraude, se havia algo na qual era especialmente boa, era em enganar.
- Supondo que isso é verdade, o que pensa fazer?
- Tudo o que você desejar que eu faça. – piscou o olho.
- Não estou com paciência para seus jogos.
Ela gargalhou.
- Consigo provar a você que isso não é verdade.
Não me dei ao trabalho de responder. Contornei a secretária para me apoderar de minha cadeira e acender um cigarro.
- Alguém já te disse que você fica particularmente sensual com isso na boca?
- Várias pessoas, em variadíssimas situações. – disse, aborrecido.
Ela se levantou, como se já estivesse farta do sofá, e me seguiu até atrás da mesa, sentando nela. Num movimento sutil, se inclinou para mim, mostrando uma boa porção de seu generoso decote.
- Mas aposto que não como eu. – senti tirar o cigarro de meus dedos e levá-lo a sua boca. Quando o tirou, consegui distinguir a marca redonda de seu batom.
- O que deseja de mim, Khaya? – questionei.
- Não é óbvio, docinho? – sem tirar seus olhos dos meus, aproximou o cigarro à pele de minha clavícula e pressionou, apagando-o. Ardeu, mas nem sequer gemi. Já havia suportado muito mais. – Quero você.
- Já tivemos esta conversa. Sabe que isso não é possível.
Quando me dei conta, já se encontrava sentada em meu colo, acariciando minha mandíbula com a unha.
- E se eu disser a você que aquela que tanto deseja não quer mais vê-lo? Não quer saber de você… Preferiu o lado mais… Aborrecido. O macho mais confiável e… Angelical.
Sobressaltei-me.
- De que é que está falando?
Deu uma pequena risada, antes de aproximar os lábios de meu ouvido e sussurrar:
- Seu brinquedinho humano fugiu para casa do anjo e nunca mais, repito, nunca mais, quer ter nada a ver com o inferno.
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Entre Anjos e Demônios
DragosteNum futuro pós-apocaliptico, anjos e demônios batalham entre si pelo controle do universo, utilizando os humanos como escravos naquele jogo mortal. Serva de um anjo durante toda a sua vida, Hannah, uma humana, é repentinamente atirada para o mundo d...