Capítulo 1

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Você vê, talvez ele fosse a pior pessoa do universo. Ele avaliara essa hipótese. 

E chegou a conclusão de que talvez fosse mesmo. Mas não se importava mais com isso .

Quando todo e qualquer desejo do coração e todos os sonhos de um futuro são cortados constantemente pelo risco de morte constante e ainda, ser obrigado a assistir um amigo recém-adquirido ser assassinado na sua frente em meio a um cemitério abandonado por Deus e ninguém parece fazer nada a respeito... Bom, isso tira qualquer esperança de uma pessoa normal. E aparentemente, esse era o último resquício de normalidade na vida de Harry Potter, O Garoto Que Não Morria (como ele carinhosamente passara a se chamar nos últimos tempos).

 Ele tentou.

Isso ninguém pode tirar dele. A consciência de que incansavelmente ele havia tentado fazer a coisa certa. Uma vez depois da outra, depois da outra, depois da outra. Ele nunca recebeu uma ajuda verdadeira . Não dos trouxas , não dos magos

.

Começou poucos dias antes, se lembrou. Ele estava pensando sentado em sua cama semi mofada, observando no menor quarto da casa dos Dursley as grades da janela projetando sombras no chão. Harry tentara por muito tempo afastar aqueles pensamentos sombrios de sua mente. Mas ficara simplesmente impossível não ver após ter a verdade esfregada em sua cara tantas vezes. Ele não se importava mais, percebeu. Com mais nada. E certamente não com a Grã-Bretanha mágica. 

Era impossível não repassar sua vida em sua mente, uma vez após a outra. Tentando descobrir quando .. onde ... o que deu errado para que ele se encontre nessa situação. 

Harry se perguntava se foi algum dia de prioridade na vida de seus pais, mesmo quando era apenas um bebê. E doía pensar nisso. Doía, mesmo em seus pensamentos mais obscuros, pensar que podia sonhar com uma vida com eles, desejar ter conhecido James e Lily Potter mais do que tudo na sua vida, e ainda sim, no fundo... ele não pensou que jamais tivesse sido prioridade na vida de seus próprios pais. E isso talvez rasgue mais a alma do que qualquer outra coisa. 

Quando descobriu que ele não era uma aberração, que era um bruxo... que seus pais não eram bêbados mortos em um acidente de carro... mas que eles o amavam, que morreram  para salvá-lo... ele se lembrava de nunca ter se sentido tão amado como naquele momento. E desde então, quando algo o fazia se sentir para baixo, ele pensava consigo mesmo " Eles me amavam. Me amavam a ponto de morrer por mim ".

Ele não tinha mais esse consolo.

E então ele entendeu cada vez mais sobre o mundo bruxo. Os Potter, ele descobriu depois do torneio TriBruxo, eram ricos. Uma carta de Gringotes lhe fora enviada confirmando a sua emancipação e, portanto, acesso completo aos cofres e bens da família. Aparentemente, o torneio era destinado apenas a magos com 17 anos, a maior idade bruxa, e como ele havia participado, ele era, perante a comunidade bruxa, maior de idade. Foi quando ele soube. Os Potter eram podres de rico .

Ele sabia que era uma linha de pensamento muito perigosa. Ele a jogou para o fundo de sua mente quase o ano inteiro. Mas havia um momento em que era impossível não perguntar. Se os Potter o amassem acima de tudo, acima de seu próprio orgulho, de sua guerra, eles teriam fugido com Harry no primeiro momento que ficara claro que ele e Nevill eram o mais novos alvos de Volmort. Harry teria fugido para o outro lado do mundo se ele tivesse um filho marcado para morrer da mesma forma com que ele havia sido. Ele certamente não se manteria em meio a uma zona de guerra. Ponto final. 

Pelo bem de seu filho, ele não pensaria duas vezes.

E então, havia o tempo que passara com os trouxas. E não há justificativa no mundo que o convença de que os adultos achassem normal a forma com que os Dursley o tratavam. Porque a forma com que a família se esforçava para ser tão normal , e ainda sim tratavam Harry com tal absoluta anormalidade, só fazia com que ele se destacasse da família Dursley de forma ainda mais gritante. E ele havia falado sobre isso. Ele havia implorado a Dumbledore para que o permitisse ficar em Hogwarts, mas ele sempre o devolvia ao seu tormento pessoal.

Ele não se importa mais - ShortStoryWhere stories live. Discover now