CAPÍTULO 1

780 72 28
                                    



Na família de Jeremias, a religião estava presente em todos os momentos do dia.

Falavam sobre religião ao acordar...durante o almoço... durante o lanche da tarde...durante o jantar e também antes de se deitarem.

O pai, Geraldo César, exigia que os filhos sempre orassem à mesa antes das refeições. Sempre dizia o nome de um dos filhos e era responsabilidade desse orar em voz alta em agradecimento pelo alimento que iriam consumir.

Era obrigação de toda a família ir à igreja aos sábados, domingos e dias de festas religiosas. Se algum dos filhos ganhava algum dinheiro, seja ele fruto de seu trabalho, ou mesmo proveniente de algum presente recebido, tinha a obrigação de tirar dez por cento para doar à igreja da cidade.

Aos filhos  não cabia discutir, senão obedecer ao pai que não dava liberdade de ser questionado.

_Deus dá, Deus tira._dizia Geraldo César._Está na Bíblia que devemos  doar dez por cento do que recebemos para a igreja. Se não fizerem isso, se não fizerem o que é o certo, não será um dinheiro abençoado.

A esposa, Maria das Dores, concordava com todas as palavras do marido, como convinha a uma boa esposa nos moldes que ela acreditava ser do gosto de Deus.

_Agora rezemos uma Ave Maria e um Pai Nosso pedindo a misericórdia de Deus por todos aqueles que não têm na mesa um alimento como o nosso._a mãe costumava completar após a oração de agradecimento.

_De novo, mãe? A comida vai esfriar!_algum dos pequenos às vezes não se continha e reclamava.

O pai não deixava por menos: metia a mão no prato do filho e tirava dali um pedaço de carne.

_Rosquinha!_o pai chamava o cachorro da casa e lhe lançava o alimento retirado do prato do filho que retrucara._Isso é pra você aprender a controlar a sua gula, menino! E engole este choro!

À noite, antes de dormir, todos os filhos precisavam ler nem que fosse apenas um dos versículos da Bíblia diante da família, ordenava o pai. Depois era ajoelhar-se próximo à cama e rezar o Pai Nosso com a cabeça baixa e as mãos postas em agradecimento pelo dia que haviam tido...mesmo que o dia não tivesse sido tão bom assim, às vezes avaliavam os filhos em silêncio.

O quinto filho que nasceu foi Jeremias. Maria das Dores, já entrando no processo da menopausa,  apareceu novamente grávida assustando todo mundo.

_Mas já não estava ficando seca, mulher?_o marido se desesperara, pois ganhava pouco na fábrica onde trabalhava e já imaginava ter que fazer mais sacrifícios para alimentar mais uma boca.

Maria das Dores segurou o choro, sentindo-se triste pela reação do marido:

_Para Deus não há tempo de seca e tudo acontece conforme Ele quer. Se Ele mandou mais um filho pra nossa vida...abençoado seja, amém!

Ao marido só bastou também dizer amém e se conformar...fazer o quê?

Geraldo César já não queria mais filhos, pois acreditava que dois rapazes e duas moças já formavam uma família matematicamente perfeita e já fizera as contas para que fome ninguém ali passasse. O jeito agora era ele aumentar o número de horas extras na fábrica...sair mais cedo de casa...voltar mais tarde...tentar encurtar a hora do almoço...fazer sacrifícios pra ganhar um pouquinho a mais.

_Deus ajuda a criar._Geraldo finalmente falou conformado dando um sorriso forçado para Maria das Dores._E você agora trate de comer por dois, para a criança  não nascer muito miúda e ficar doente.

PERDÃO! EU PEQUEI E GOSTEI!-Armando Scoth Lee-romance gayOnde histórias criam vida. Descubra agora